O Governo de António Costa tem uma semana, até 3 de fevereiro, para demonstrar que a sua proposta de Orçamento do Estado para 2016 não vai fazer derrapar o esforço de consolidação orçamental. Uma equipa de técnicos da troika (a primeira desde que o PS está no Governo) já chegou a Lisboa, para passar a pente fino a documentação do Ministério das Finanças e estudar o impacto da reversão das medidas adotadas durante o resgate – umas já iniciadas e outras inscritas no Orçamento do Estado para este ano.
Esta é a terceira vez que uma delegação do Fundo Monetário Internacional (FMI), Comissão Europeia e Banco Central Europeu se desloca a Lisboa para analisar a evolução portuguesa desde a saída da troika, em 2014. A última vez que cá estiveram os técnicos foi no verão do ano passado e não foram muito brandos nas críticas.
Durante essa visita, que decorreu já em plena efeverscência pré-eleitoral, os técnicos da troika recomendaram cautelas e apontaram para vários riscos de o País se afastar do trilho da austeridade.
Já na altura, com programa do então ainda primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, tímido na reversão da austeridade, a troika foi crítica e alertou para as pressões orçamentais existentes. Desta vez, com medidas já revertidas pelo Executivo socialista, apoiado pela esquerda parlamentar, e outras anunciadas no “esboço” de orçamento do Estado enviado para Bruxelas irá, pelo menos, torcer o nariz.
A partir de 2011, os funcionários públicos com salários brutos superiores a € 1 500 viram os seis vencimentos cortados entre os 3,5% e os 10 por cento. Iniciada já no ano eleitoral de 2015 com Passos Coelho, o novo Governo quer acelerar essa devolução até outubro deste ano. Ainda na função pública, deverá entrar em vigor, a partir de julho, a semana de trabalho de 35 horas. Por outro lado, o salário mínimo também aumentou, ao passo que a famosa sobretaxa do IRS desaparecerá gradualmente até 2017. As pensões e as prestações sociais vai ser igualmente aliviadas das medidas de austeridade aplicada entre 2011 e 2014, ao passo que se prevê a reposição dos quatro feriados.
Não havendo ainda um documento final, poderá deduzir-se a partir de tudo o que foi noticiado e dos comentários pessimistas a descreverem o cenário elaborado por Mário Centeno e António Costa de excessivamente otimista, o avaliação da troika iniciada esta quarta-feira não deixar de refletir o que dizem “os mercados”.
Por exemplo, a agência de rating Fitch considerava esta segunda-feira, 25, que “as propostas orçamentais do governo português para 2016 têm por objetivo manter a consolidação orçamental, mas estão assentes em previsões que podem revelar-se irrealistas”. Ora isso agrava o risco de não se atingira a almejada redução do défice para 2,6% do PIB – um cenário que, a materializar-se, pode levar a Fitch a descer a “nota” do rating do país – que apesar de ter melhorado invertendo ligeiramente, ainda permanece aquém do “grau de investimento”, ou seja as obrigações portuguesas continuam a ser tidas como aplicações de alto risco, ou lixo.
Apertado entre promessas eleitorais, compromissos com os partidos que o apoiam no Parlamento, Bloco de Esquerda, PCP e Verdes e as exigências da troika e o ceticismo dos “mercados”, António Costa parece metido numa camisa de sete varas e vai precisar de todos os dotes de um Harry Houdini da política para se desembaraçar dela. Ninguém lhe prometeu que ia ser fácil.