Cortaram-se salários e pensões, aumentaram-se impostos, destruíram.se postos de trabalho e, mesmo assim, a dívida do Estado não parou de crescer. Seremos capazes de pagá-la, ao longo dos próximos 28 anos?
No próximo dia 17, a troika sairá de Portugal. Essa é uma boa notícia. A má notícia é que só daqui a quase três décadas, em 2042, nos veremos livres da dívida contraída junto da União Europeia (UE) e do FMI, no valor de 78 mil milhões de euros. Uma geração inteira terá de carregar o pesado fardo da dívida do Estado. Aguentará?
Três anos depois, a troika deixa para trás um País mais endividado, com mais desemprego e a crescer menos do que antes do resgate, embora as contas públicas estejam mais equilibradas, com menores défices orçamentais. Mas olhemos para os números da dívida do Estado: cresceu de 162,5 mil milhões de euros, em 2010, para 213,6 mil milhões de euros, em 2013,o que representa um salto de 94% para 129% do PIB. Só este ano é esperada – de acordo com as projeções do Governo, no Documento de Estratégia Orçamental – uma inversão da sua trajetória ascendente.
Dando argumentos aos que defendem que esta dívida não é pagável, a fatura dos juros está aí para o provar. Anualmente, o Estado “desembolsa” 7 mil milhões de euros só em juros da dívida. Quase tanto quanto gasta com a Saúde. Desde que a crise começou, em 2007, Portugal já pagou 41 mil milhões de euros em juros – um valor idêntico ao que a Alemanha poupou, com a redução dos juros da sua própria dívida, olhada como um refúgio “seguro” à medida que as taxas dos países sob pressão – Grécia, Irlanda, Portugal, Espanha, Itália… – disparavam. Desse montante, mais de 4 mil milhões voaram diretamente para os bolsos da troika.
Mas, afinal, porque cresceu a dívida, nestes três anos? É sustentável? Seremos capazes de pagá-la? Ou devemos renegociá-la? O leitor construirá as suas próprias respostas a partir da informação que a VISÃO publica nesta página.
Descodificador
Uma pequena ajuda para entender o universo da dívida pública
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Bilhete do Tesouro (BT) – Título representativo de um empréstimo de curto prazo, com valor unitário de um euro e com maturidade até um ano
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Certificado de Aforro (CA) – Instrumento de dívida criado com o objetivo de captar a poupança das famílias, com capitalização de juros
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Certificado do Tesouro (CT) – Instrumento de dívida colocado diretamente juntos dos investidores singulares, com distribuição anual dos juros
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Obrigação do Tesouro (OT) – Valor mobiliário representativo de um empréstimo de médio ou de longo prazo da República de Portugal, com valor unitário de um cêntimo de euro e com prazos para a maturidade compreendidos entre um e 50 anos. Pode ser colocado através de um sindicato bancário, leilão ou subscrição limitada
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Cupão – Juro periódico a pagar por um título de dívida
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Data de maturidade – Data em que é reembolsado o valor nominal da dívida
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Mercado Primário – Mercado onde os novos títulos de dívida da República Portuguesa são emitidos e colocados junto dos investidores
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Mercado Secundário – Mercado onde são posteriormente negociados os títulos colocados em mercado primário. Quando se diz que os juros da dívida sobem, é porque os títulos estão a ser negociados a juros cada vez maiores (e a preços cada vez menores) neste mercado
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Sindicato bancário – Modelo utilizado na colocação inicial das novas séries de OT, com base na negociação direta com os operadores de mercado (bancos), que garantem as condições de colocação de um maior número de títulos
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Leilão – Modelo utilizado na colocação inicial das novas séries de OT, com base numa oferta dos títulos ao mercado que segue normalmente um calendário previamente anunciado. É mais dificil antecipar o interesse dos investidores, mas se a procura superar a oferta, permite ao Estado pagar um juro mais baixo aos investidores do que nas operações sindicadas
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Almofada financeira – Depósitos da Administração Pública, no valor aproximado de 15 mil milhões de euros, que garantem o pagamento da dívida caso Portugal venha a enfrentar de novo dificuldades em obter financiamento nos mercados. Se fossem utilizados, o racio da dívida pública desceria dos atuais 129% do PIB para pouco mais de 116% do PIB
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Rating – Avaliação da capacidade que um país ou uma empresa demonstram para pagar as suas dívidas. As agências de notação financeira classificam as dívidas em níveis, atribuindo-lhes uma nota pelo seu desempenho.
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Risco da dívida – Mede a probabilidade de o país não pagar. Quanto maior o risco, maior a taxa de juro exigida pelos investidores
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Dívida externa – Soma da dívida pública e privada dum país, contraída junto de entidades estrangeiras
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Défice orçamental – Diferença entre despesas e receitas do Estado ao longo de um ano, medido em % do PIB
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Défice orçamental primário – Diferença entre despesas e receitas do Estado, sem juros, ao longo de um ano, medido em % do PIB