Em finais de Julho, José Fernandes frequentou uma acção de formação do grupo Visabeira, em Viseu. No mês seguinte, começou logo a trabalhar para a Viatel, empresa do grupo, com um contrato a prazo de seis meses. Quando surgiu esta oportunidade, estava desempregado há um ano, sem direito a subsídio de desemprego, uma vez que tinha trabalhado sempre a recibos verdes.
2 de Julho de 2009
Depois da sua história ter sido publicada na VISÃO (n.° 850, de 18 de Junho), José Fernandes recebeu vários telefonemas de antigos colegas seus do Instituto Português do Sangue, elogiando a sua atitude em denunciar o facto de um organismo público empregar pessoas de forma precária. Era o caso de José que, ao ser despedido depois de oito anos a recbidos verdes, não teve direito ao subsídio de desemprego. O imigrante brasileiro continua a procurar emprego. Foi a uma entrevista numa empresa que presta assistência informática em regime de outsourcing e está confiante de que pode conseguir o lugar. Enquanto espera, precisa de ganhar dinheiro e, para isso, vai aceitar um “biscate” como motorista numa firma de entregas. Os seus dias têm sido passados a fazer pequenos trabalhos para os clientes da Sysgate.pt, uma micro-empresa de informática, que fundou com um amigo português. Acabou agora a criação de um site para um restaurante. E está optimista. “A economia parece estar a melhorar e essa fase vai passar”, acredita.
18 de Junho
José Fernandes não sabe o que é ter um trabalho estável, desde que chegou a Portugal, há 14 anos. O livro dos recibos verdes regista o mesmo patrão durante quase uma década: o Estado português. O brasileiro, de 43 anos, técnico de informática, foi despedido do Instituto Português do Sangue, organismo público, em Julho de 2008. “A razão que me deram foi a de que o Governo estava a reaproveitar as pessoas que tinha colocado na mobilidade especial”, conta. Sem direito a subsídio de desemprego, José não se pode dar ao luxo de ficar parado.
De acordo com o Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP), existem quase 34 mil imigrantes inscritos nos centros. Este valor representa um aumento de 65%, face ao mesmo mês no ano passado. O número não pára de subir – eram 28 mil em Janeiro de 2009, 31 mil em Fevereiro, 32 mil em Março… – e peca por defeito: nem todos os desempregados recorrem aos centros de emprego e nada se sabe, por exemplo, da situação dos imigrantes ilegais. Também não existem dados que permitam aferir a taxa de desemprego entre os imigrantes, uma vez que os últimos números sobre a totalidade da população estrangeira a viver em Portugal reportam ao ano de 2007.
Nessa altura, a comunidade brasileira era a mais numerosa, com 66 mil pessoas, seguida de perto pela cabo-verdiana, com 64 mil (num total de 436 mil imigrantes). Assim, os brasileiros são os mais fustigados pelo desemprego, a que não será alheia também a diminuição da actividade na construção civil, e nos serviços e na hotelaria. “A nossa percepção é que há mais gente a deixar Portugal. E há menos pessoas a entrar”, diz Gustavo Behr, presidente da Casa do Brasil, para quem esta crise demonstra “que os fluxos migratórios se regulam pela economia e pelo mercado de trabalho”.
Para este dirigente associativo, “os imigrantes nunca são um fardo” para a sociedade de acolhimento. “Representam sempre um elevado contributo para a Segurança Social e aqueles que beneficiam do subsídio de desemprego descontaram para isso”, conclui.
Ver além do horizonte
José Fernandes descontou (e ainda desconta) cerca de 150 euros mensais para a Segurança Social, mas por ser precário não recebe subsídio. Desde que está desempregado tem-se dedicado a construir uma microempresa, a Sysgate.pt, de soluções informáticas a baixo custo (da reparação de computadores à criação de páginas de internet), juntamente com um amigo português.
Mas o ordenado instável que retira da Sysgate não se compara aos cerca de 1500 euros líquidos que ganhava antes. E José continua a enviar currículos. Na sala da sua casa em Odivelas, aponta para um quadro com fotografias suas e dos amigos, no estádio do Benfica, nas férias na neve, a fazer arborismo… “Aqueles momentos acabaram”. Com o desemprego vieram as poupanças: foi viver com a namorada, dividindo agora a renda de 450 euros; e acabaram-se os jantares fora de casa. Mas o que mais lhe pesa é o facto de ter de deixar o curso de Engenharia Multimedia no Instituto Superior de Tecnologias Avançadas – ia para o 2.° ano, mas as propinas custam 250 euros por mês…
Natural de Minas Gerais, José veio para Portugal a convite de uma família amiga de portugueses, emigrada no Brasil. Vinha de férias, passar um mês, mas gostou tanto que decidiu ficar. “Só voltei ao Brasil três anos depois. Fiquei encantado com tanta História viva”, conta. Legalizou-se e passou por vários locais de trabalho, da informática à restauração. Nunca sentiu qualquer tipo de discriminação… até agora. Não por ser brasileiro (entretanto também português, uma vez que tem a dupla nacionalidade), mas por ser ‘quarentão’: “As empresas já não dão oportunidades a quem tem esta idade, preferem estagiários”, afirma.
No entanto, José não desiste. Como ele diz, desde sempre teve “a tendência de enxergar para além do horizonte e ver a liberdade de ir e vir como um valor fundamental”.
NÚMEROS
>> 512 000 Número de desempregados em Portugal, em Maio, segundo os últimos dados do Eurostat
>> 9,3% da população activa portuguesa não tem emprego, segundo a mesma fonte. A taxa está uma décima acima da da zona Euro
>> 33 623 imigrantes estão inscritos nos centros de emprego em Portugal, de acordo com o IEFP
>> 9 534 brasileiros desempregados em Portugal, em Abril