O título da crónica de Pedro Guerra no jornal O Independente não era um mero trocadilho com o seu nome. Chamava-se “Guerra à vista” por ser grande a probabilidade de gerar conflito e polémica. A fama já vinha das notícias que o jornalista escrevia, nos anos 90, ainda antes de ter espaço reservado. E dos muitos títulos corrosivos que lhe saíam da cabeça diretamente para a manchete, imagem de marca da irreverência do semanário criado por Paulo Portas e Miguel Esteves Cardoso. Na política e no futebol, para onde seguiria após renunciar à carteira de jornalista – como assessor de Paulo Portas e em várias funções no Benfica –, Guerra justificou sempre o apelido. Agora está no epicentro de um alegado esquema de corrupção na arbitragem que o FC Porto lançou sobre o rival da Luz, mas já antes muitos outros episódios revelavam o gladiador que afronta tudo e todos. Desafiámo-lo a comentar seis deles e a resposta veio via SMS.
1 – “Herdade para ter juízo”
Ficou conhecido como o caso do “Monte dos Frades”. Segundo noticiava O Independente em 1992, o então ministro das Finanças Jorge Braga de Macedo teria recebido indevidamente subsídios comunitários para a sua herdade em Avis, no Alentejo. Em causa estavam verbas destinadas a jovens agricultores, o que não era o caso do ministro de 46 anos. O jornal acusou-o de recorrer ao nome de um cunhado mais jovem, que cumpria o requisito da idade, para obter os fundos para o projeto. Pedro Guerra saiu-se com o trocadilho “Herdade para ter juízo” e a primeira página seguiu assim para as bancas. Braga de Macedo processou o jornal e o caso arrastou-se nos tribunais, até O Independente ser condenado a pagar uma indemnização, em 2000.
Pedro Guerra: “O ministro das Finanças disse em tribunal que o que mais o apoucou foi o título. O truque era simples: trocadilhos com ditados populares ou filmes e séries de TV.”
2 – O roubo de Luís Filipe Vieira
Em 2001, Pedro Guerra desenterrou a sentença que tinha levado à condenação de Luís Filipe Vieira, em 1993, pelo “crime de roubo”, a 20 meses de prisão. O caso remontava a 1984, quando Vieira era apenas um “comerciante”. Um amigo pediu-lhe ajuda para cobrar uma dívida e planearam roubar um camião ao devedor. “Luís Filipe Vieira e José Gama pagaram, como acontece nos casos de cobranças difíceis, os serviços da rapaziada musculada”, escreveu o jornalista, sobre o método utilizado. Quando a notícia foi publicada, Vieira já não era um anónimo: tinha deixado a presidência do Alverca para assumir a pasta do futebol no Benfica. “A sorte dos arguidos, Luís Filipe Vieira incluído, foram duas leis da amnistia, que lhes valeram o perdão total das penas de prisão”, acrescentava o artigo.
Pedro Guerra: “Foi uma mera notícia de Justiça, sem a gravidade que maldosamente lhe atribuem. Ficou tudo em pratos limpos num jantar em que um amigo comum nos sentou à mesa. Percebi nessa noite que o Benfica iria voltar à ribalta com Luís Filipe Vieira.”
3 – Salário acima do ministro
Quando Paulo Portas assumiu o cargo de ministro de Defesa, em 2002, convidou o seu ex-jornalista para ser seu assessor. Um salário bruto de 4888 euros, publicado em Diário da República, foi notícia nos jornais. Nem o Avante! deixou escapar a oportunidade de assinalar um rendimento tão elevado, acima do auferido pelo próprio ministro. Um erro de publicação que “foi depois retificado”, explicou o próprio Guerra ao Observador, no ano passado, sem precisar quanto recebia, afinal. “Já não me lembro”, justificou.
Pedro Guerra: “Fui assessor com muito gosto enquanto o dr. Paulo Portas liderou o CDS. Com a sua saída, o partido nunca mais será o mesmo.”
4 – O agente da desinformação
À TSF, a socialista Ana Gomes denunciou, em 2011, aquilo a que chamou de “central de desinformação e calúnia de dirigentes do PS” durante o processo Casa Pia, que funcionava, segundo a eurodeputada, “junto do então ministro Paulo Portas”. E acrescentou que “Pedro Guerra era um dos principais agentes dessa central de desinformação”, acusada de ter “alimentado o tratamento na Imprensa” em relação a alguns dos seus companheiros de partido.
Pedro Guerra: “Só a psiquiatria pode explicar. Um evidente caso de falta de vergonha e de decoro de quem se julga justiceira. Uma paraquedista sobrevivente que tem amigos nos sítios certos e que vamos ter de continuar a aturar, infelizmente.”
5 – Jorge Coroado ao ataque
Num despique verbal com Jorge Coroado na CMTV, em 2014, a conversa descambou quando o ex-árbitro lhe disse que não era “aplaudómetro”. “Eu não aplaudo só porque me pagam para aplaudir”, atirou. Em resposta, Guerra contra-atacou assim: “Você já tem uma certa idade e eu respeito isso, mas fica-lhe mal.” Seguiram-se 50 segundos de troca de galhardetes, com Coroado na ofensiva. “Mentiroso é você, emprenha pelos ouvidos. Se gosta de aplaudir, parabéns, continue que é o seu modo de vida.”
Pedro Guerra: “Destila ódio ao Benfica. Frustrado por nunca ter sido presidente do Conselho de Arbitragem. E ainda bem que não foi.”
6 – Desafiado para a luta
Terminado o programa Prolongamento, da TVI 24, de 6 de outubro de 2015, Eduardo Barroso levantou-se e dirigiu-se a Pedro Guerra, desafiando-o para um duelo de punhos “lá fora”. Bruno de Carvalho tinha acabado de denunciar o que ficaria conhecido como o caso dos vouchers e os ânimos exaltaram-se. Aconselhado por Manuel Serrão a não o fazer, o cirurgião do Sporting acabou por não esperar o representante do Benfica para o confronto físico. Mas na semana seguinte, depois de Guerra o ter chamado de cobarde, abandonou de vez o programa.
Pedro Guerra: “Além da falta de chá e de educação, este conhecido sócio do Sporting, que se julga dono do clube, tem a virtude de estar com todos os presidentes. Não aguentou a minha pressão alta e fugiu.”
Artigo publicado na VISÃO 1267 de 21 de junho