Há frases feitas que há muito caíram em desuso no futebolês moderno. “A bola é redonda” ou “são onze de cada lado e no fim tudo pode acontecer” são dois exemplos de chavões que ainda fariam sentido numa competição como o Campeonato das Nações Africanas. Na prova mais importante de seleções do continente africano, à exceção da festa e do ambiente caloroso das bancadas, quase tudo é incerteza, a começar, desde logo, pela organização da prova. Raramente há um vencedor anunciado e, mesmo quando o favoritismo de um país é grande, a surpresa está sempre ao virar da esquina. Basta ver que, em 30 edições – a que se inicia no Gabão é a 31ª – já houve 15 países vencedores e a equipa que ergueu mais vezes o troféu, o Egito, com sete vitórias, nem sequer esteve presente nas últimas três fases finais. Mas num futebol cada vez mais espartilhado em rigorosos esquemas táticos, um pouco por todo o lado, é em África que ainda sobrevivem resquícios do futebol de rua, mais fantasioso, o jogar à bola em estado puro.
Desportivamente, cabe ao Gabão, a seleção anfitriã, e à Guiné-Bissau, a única equipa de língua oficial portuguesa presente, o pontapé de saída, já neste sábado (14). Mas a verdade é que o país organizador vive uma situação pouco pacífica. As eleições de agosto último reconduziram no cargo o presidente Ali Bongo, no poder desde 2009 e que sucedeu ao seu pai, Omar Bongo, que chefiou o governo entre 1967 e 2009. Os resultados foram, porém, muito contestados e no final do anúncio do vencedor houve confrontos nas ruas de Libreville de que resultaram dezenas de mortos. Demasiado dependente do petróleo, a economia do Gabão sofre os efeitos da baixa do preço do crude e o país conta com mais de 20 por cento de desempregados.
Ainda assim, o Gabão, que há cinco anos havia organizado a prova em parceria com a Guiné Equatorial, por desistência de última hora da Líbia, investiu muito na CAN 2017, não apenas na construção de novos estádios e estradas mas também na reabilitação de outras infra-estruturas e na renovação de um hospital.
A competição decorre entre 14 deste mês e 5 de fevereiro em quatro cidades: Libreville, Franceville, Port-Gentil e Oyem.
Figuras em destaque
Riyad Mahrez – Eleito o melhor jogador africano de 2016, o argelino teve um papel fundamental na conquista do título inglês da última época, ao serviço do Leicester City de Cláudio Ranieri. Apesar de não estar a ter o mesmo fulgor neste início de temporada, Mahrez é um dos jogadores que pode brilhar no ataque de uma seleção que conta ainda com Islam Slimani (ex-Sporting, e agora seu colega no Leicester) e o portista Brahimi.
Pierre Emerick-Aubameyang – É o futebolista mais famoso do Gabão, a equipa da casa, e um dos mais cobiçados na Europa. Com 16 golos é o melhor marcador dos campeonatos europeus, mesmo que o seu Borússia de Dortmund esteja atualmente na tradicional pausa de inverno. Se mantiver a boa forma é a grande arma da equipa orientada por José António Camacho (ex-treinador do Benfica).
Mohamed Salah – É a grande referência do Egito, o país com mais troféus (7) mas que falhou presença nas últimas três fases finais da prova (2012, 2013 e 2015). A velocidade e técnica do extremo que atua na Roma podem ser decisivas mas a falta de ritmo também. É que Salah lesionou-se em inícios de dezembro e só atuou num jogo particular desde então.
Sadio Mané – A falta que poderá fazer ao Liverpool durante este mês pode ser a alegria dos adeptos do Senegal, país que só por uma vez esteve presente na final, mas perdeu (em 2002, frente aos Camarões). Esta época já leva nove golos marcados ao serviço da equipa de Jurgen Klopp na Premier League, e é isso também que os senegaleses lhe pedem.
Wilfried Zaha – Apesar de ter feito dois jogos amigáveis pela seleção de Inglaterra, o extremo do Crystal Palace preferiu vestir as cores do seu país e vai fazer a estreia na CAN 2017. A Costa do Marfim, que defende o troféu conquistado em 2015 na Guiné Equatorial (venceu o Gana nos penaltis), é uma das equipas mais fortes da competição e Zaha conta ainda com a ajuda de Wilfried Bony e Serge Aurier.