Wong Kar Wai é o mais novo realizador presente na prestigiadíssima lista dos 50 melhores filmes de sempre da BFI (os tais que recentemente decidiram que afinal A Mulher que Viveu duas Vezes é ainda melhor do que O Mudo a seus Pés). É um dos raros realizadores vivos a figurar na lista e o seu filme, In the Mood for Love (2000), é o segundo mais recente, só batido por Mulholland Drive, de David Lynch. A lista da BFI (associação fundada em 1933) não faz doutrina, mas revela o porventura inesperado prestígio que o realizador nascido em Xangai, mas criado em Hong Kong, merece aos olhos da crítica internacional. Ainda antes de In the Mood for Love, o ritmo de montagem frenético de Chungking Express (1994) provocou alarido e alertou para novas formas de perceção da realidade através do cinema. Talvez Kar Wai tenha acusado o peso dessa responsabilidade e nos últimos anos hesita no caominha mais assetivo. Em 2007, fez o seu filme americano, My Blueberry Nights – O Sabor do Amor (com Norah Jones e Jude Law), como é apanágio dos realizadores de sucesso língua estrangeira. E agora faz o seu filme… chinês. Apesar de ser o mais chinês dos seus filmes, O Grande Mestre tem menos de Wong Kar Wai do que My Blueberry Nights. O Grande Mestre, que passou por Cannes sem prémios, é uma obra aparentemente ambiciosa, em que, tal como em My Blueberry Nights, o realizador se intromete num caminho que não é o seu, substituindo o pulsar da vida contemporânea, por uma epopeia histórica, cheia de kung-fu, acrobacias e lendas saltitantes. Pode passar por um exercício do género. O que é quase irónico. Kar Wai que se distinguiu dos seus pares de Hong Kong, terra de muito talento, pela forma como aplicou a ideia de velocidade e vertigem, típicas dos filmes de género, ao quotidiano; agora se imiscui declaradamente no género do qual fugiu. O Grande Mestre é uma saga familiar, de um clã, que atravessa gerações ao longo do século XX. Em fundo, as mudanças sociais que atravessadas pela China em geral, e Hong Kong em particular, ao longo do século XX. Traços de Kar Wai, de montagem e fotografia, estão presentes, mas de forma insuficientemente marcante. As coreografias, da espetacularidade das artes marciais, que se desenham como uma dança, não têm a graça (nem tentam imitar) de Ang Lee (O Tigre e o Dragão, 2000). As situações de combate, momentos chave dos filmes do género, não são mais imaginativas que Bruce Lee ou Quentin Tarantino (KIll Bill vol. 1 e 2). Dentro de toda a sua grandiosidade, o Mestre é, um filme menor de Wong Kar Wai. Um objeto híbrido, mas não suficientemente híbrido para se tornar interessante. Algo parecido se passa com Spike Lee. Ele que já tinha chegado ao poder 20 anos antes de Obama tem-se deixado arrastar numa progressiva banalização. Desta vez, com Old Boy, foi rebuscar um argumento de uma BD manga, já adaptada ao cinema pelo coreano Chan-wook Park (prática corrente da indústria americana quando lhes falha a imaginação), transpondo-o para os Estados Unidos, para fazer um mal amanhado filme de género. A única força de Old Boy está nos traços gerais do argumento que pertencem a Garon Tsuchiya (e outros), tudo o resto não é suficientemente grave ou eficaz. Enquanto filme de género é coxo, enquanto filme de autor é vazio. Parece-se com uma tentativa frustrada de entrar no mainstream. Onde é que para o Spike que fazia a coisa certa? O Grande Mestre, de Wong Kar Wai, com Tony Leung Chiu Wai, Ziyi Zhang, Jin Zhang, 130 min Old Boy, de Spike Lee, com Josh Brolin, Elizabeth Olsen e Samuel L. Jackson, 104 min