António Costa (e restantes ministros) entrou na Assembleia da República, uma semana após o novo executivo tomar posse, oito minutos depois da hora marcada, mas não perdeu tempo e, num discurso de cerca de meia-hora, defendeu as linhas mestras do novo programa do governo – e anunciou ainda mais novidades: com um pacote de medidas para “combater” os efeitos da inflação que, sublinhou, “tem uma origem externa, uma natureza tendencialmente conjuntural e causas conhecidas” (numa alusão à guerra na Ucrânia).
Dividindo esse pacote em quatro eixos, o primeiro-ministro anunciou “a contenção dos preços da energia”, com uma redução do Imposto sobre Produtos Petrolíferos (ISP) equivalente à redução do IVA para 13%, manutenção dos mecanismos de compensação dos aumentos de receita fiscal e o alargarmento da suspensão do aumentos da taxa de carbono até 31 de dezembro – que, segundo contas do governo, se vai traduzir numa redução em 52% do aumento do preço do gasóleo e 74% do preço da gasolina (tendo como referência o preço de outubro de 2021).
Quanto à eletricidade, António Costa anunciou que, na semana passada, apresentou a Bruxelas uma proposta ibérica que limita o contágio dos preços da eletricidade pelo preço do gás, que, garante, pode resultar numa poupança para famílias e empresas na ordem dos 690 milhões de euros por mês, suportados diretamente pelo setor elétrico.
Temos um governo forte, coeso e equilibrado
António Costa
A proposta seguinte visa apoiar a produção, com destaque a apoios que vão permitir suportar uma parte do aumento dos custos com gás das empresas intensivas em energia e flexibilizar os pagamentos fiscais e das contribuições para a segurança social dos setores mais vulneráveis: como agricultura, pescas, transportes, setor social e indústrias de cerâmica e vidro, siderurgia, produção de cimento e indústria química. A criação do gás profissional para abastecimento do transporte de mercadorias e dos alargamentos ao setor social o desconto de 30 cêntimos por litro nos combustíveis é outras das novidades.
Por fim, António Costa anunciou apoios para as famílias vulneráveis, alargando a todas as famílias titulares de prestações sociais mínimas as medida de apoio ao preço do cabaz alimentar e das botijas de gás.
Provocações à direita
As primeiras palavras de António Costa, dirigidas ao hemiciclo, foram para garantir “total disponibilidade para o diálogo e escrutínio da ação governativa” pela Assembleia da República, mas a intervenção inicial do primeiro-ministro não esteve isenta de provocações, dirigidas às bancadas da direita – PSD, Chega e IL.
Muitas vezes, o discurso transformou-se numa troca de argumentos entre primeiro-ministro e bancadas da oposição: desafiou Rui Rio para uma “segunda volta”das legislativas; recusou “compactuar com atitudes xenófobas ou ceder à intolerância que enfraquece as democracias” [dirigindo-se a André Ventura] e negou o liberalismo [confrontando João Cotrim Figueredo].
“Eu vou estar aqui quatro anos e meio”, lançou a Rui Rio – ironizando com o futuro do presidente social-democrata e, ao mesmo tempo, afastando a possibilidade de sair a meio deste mandato –, antes de provocar um (curioso) “diálogo” com João Cotrim Figueiredo, naquele que foi um dos momentos da tarde, gerando mais burburinho no hemiciclo. “No limite, quando tudo parece desmoronar-sevé o Estado que resta. O futuro não é liberal. O futuro é do Estado soscial, o único que garante de que somos todos – e não apenas alguns – verdadeiramente livres”, disse o primeiro-ministro, provocando reação ruidosa da bancada liberal.
Fundos para “vencer, construir e realizar”
“Temos um governo forte, coeso e articulado”, descreveu António Costa. O primeiro-ministro deixou elogios à sua equipa governativa, voltando a insistir na “ambição” de ver o País “crescer”, assegurando que essa “trajetória de convergência” com a Europa, iniciado pelo governo PS em 2016, só foi interrompida pela pandemia. Ainda assim, Costa assegura que, entre 2016 e 2019, Portugal “cresceu sete vezes mais que nos 14 anos anteriores” – e pede confiança para que sua equipa possa retomar, já este ano, esse caminho.
“O País precisa de vencer vulnerabilidades, melhorar infraestruturas, realizar reformas”, diz, afirmando que, graças aos fundos europeus, disponíveis até 2030, Portugal tem agora “uma oportunidade histórica” para “vencer, construir e realizar”.
O primeiro-ministro voltou a enumerar (quatro) prioridades para este mandato (de quatro anos e meio): responder à emergência climática; contrariar o inverno demográfico; combater desigualdades e assegurar a transição digital; e sublinhou a oportunidade em mãos para concretizar objetivos. “Depois de uma crise política indesejada não temos mais tempo a perder. O País que todos queremos e aspiramos está nas nossas mãos (…) Para a realização desse grande projeto, desse nosso futuro comum, desse Portugal que queremos, empenharemos toda a nossa energia, a nossa força e a nossa criatividade”, concluiu.