Completar uma maratona pela primeira vez tem efeitos positivos na saúde arterial – é esta a mensagem de um estudo, que envolveu mais de cem voluntários relativamente inexperientes em corrida e exercício físico em geral. O estudo verificou que completar uma maratona, e todo o processo de treinos que a antecede, tem o efeito de deixar a aorta mais flexível, saudável e biologicamente mais jovem.
As artérias são responsáveis por levar o fluxo de sangue do coração às diversas partes do corpo e, com a idade, perdem a elasticidade que lhes permite manter um fluxo de sangue constante. Quando as artérias começam a endurecer, o sangue tem mais dificuldade em fluir – o que pode causar o aumento da pressão arterial e prejudicar órgãos que, como os rins e o cérebro, requerem um fluxo de sangue constante para funcionarem.
A aorta é a principal e maior artéria do corpo humano, surgindo do ventrículo esquerdo do coração e prolongando-se até à altura da quarta vértebra lombar, ramificando-se em várias artérias – aliás, a artéria pulmonar é a única artéria do corpo humano que não deriva da aorta. A função da aorta é garantir que o sangue oxigenado, bombeado a partir do coração, chega a todas as partes do corpo, daí a sua importância para todo o organismo.
Já se sabia que as pessoas fisicamente ativas não sofrem tanto do endurecimento das artérias ligado ao envelhecimento. Mas este estudo vem agora trazer boas notícias, mesmo para as pessoas relativamente sedentárias e pouco habituadas a praticar desporto. Para essas pessoas, correr uma maratona pode ter muitas vantagens.
“Os corredores principiantes que treinaram durante seis meses e completaram a sua primeira maratona tiveram uma redução de quatro anos na idade arterial e uma queda de 4 mmHg na pressão arterial sistólica [o maior valor verificado durante a medição da pressão arterial]. Isto é comparável ao efeito da medicação, e se mantido, traduz-se num risco de AVC aproximadamente 10% mais baixo ao longo da vida”, explica Anish Bhuva, autor do estudo e membro da Fundação Britânica do Coração, da University College, em Londres.
O estudo – ilustrativamente intitulado “O treino para uma primeira maratona inverte o endurecimento da aorta relacionado com a idade” – foi publicado no Journal of the American College of Cardiology. Cientistas da University College, em Londres, contactaram cerca de 200 pessoas que iam participar pela primeira vez na Maratona de Londres. Apenas foram consideradas pessoas que, nos formulários de inscrição para a maratona, referiram que essa ia ser a sua primeira maratona e que não eram praticantes regulares de exercício físico. Os participantes tinham idades entre os 21 e os 69 anos, sendo que 49% eram homens e 51% mulheres e nenhum sofria de hipertensão ou quaisquer condições cardíacas.
Seis meses antes da data da maratona, os participantes foram submetidos a exames de saúde e de aptidão física, bem como exames ao coração que permitiram avaliar a flexibilidade da aorta. A idade dos participantes foi comparada com a rigidez dessa artéria, para calcular a “idade biológica” da aorta.
Duas semanas após a maratona, voltaram a ser avaliados, embora apenas 138 participantes tivessem completado a corrida (os restantes desistiram durante o processo de treinos). Os cientistas não monitorizaram o programa de treinos dos participantes, mas a maioria escolheu seguir o Plano de Treinos para Principiantes recomendado pelos organizadores da maratona, que incluía três corridas por semana, durante 17 semanas.
Os exames feitos duas semanas depois da maratona revelaram que as aortas dos participantes estavam mais flexíveis e a pressão arterial tinha descido. As artérias rejuvenesceram mesmo, em média, quatro anos. A artéria aorta de um participante de 60 anos, por exemplo, passou a ter o mesmo nível de elasticidade da de um participante de 56 anos antes da corrida. Coincidentemente, os benefícios foram maiores para os participantes masculinos mais velhos, e para os que tinham concluído a maratona em mais tempo – mostrando que não é preciso concluir a maratona em tempos considerados ótimos para melhorar a saúde arterial.
Os resultados do estudo foram “gratificantes” para os cientistas, uma vez que ainda não se sabia se pessoas mais velhas ou sedentárias beneficiariam dos efeitos positivos na saúde arterial da mesma forma que as pessoas ativas, diz Charlotte Manisty, cardiologista na University College de Londres e no Centro Cardiológico de Barts, que supervisionou o estudo. A boa notícia é que “quase todos os participantes tiveram benefícios, e as pessoas cujas artérias precisavam de mais ajuda beneficiaram mais”, continua, acrescentando que o estudo evidenciou que nunca é tarde demais para se começar a reverter alguns efeitos do envelhecimento, através da introdução de alguma atividade física no nosso estilo de vida.
Não é claro se será preciso completar mesmo uma maratona para rejuvenescer as artérias, ou se distâncias mais curtas podem ter o mesmo efeito. No entanto, os inúmeros benefícios da atividade física para a saúde são conhecidos, sendo possível afirmar que um estilo de vida ativo trará com certeza vantagens para a saúde arterial.
“O estudo mostra que os benefícios de saúde do exercício ao longo da vida começam a aparecer após um programa de treino relativamente breve”, afirma Bhuva. “O treino para uma maratona pode ser uma fonte de motivação para as pessoas se manterem ativas. Muitas pessoas gostam e continuam a correr, o que deverá aumentar a probabilidade de os benefícios se manterem”.
A equipa de cientistas responsável pelo estudo espera poder conduzir estudos semelhantes no futuro, que avaliem se este e outros tipos de treino terão efeitos na saúde arterial de pessoas com condições cardíacas, pressão arterial alta, entre outras condições.