Quando alguém morre, é costume escreverem-se palavras simpáticas. Pela dor e pelo respeito, os momentos menos agradáveis ficam nas entrelinhas, na memória do que com ele conviveram, na cabeça dos que, por enquanto, vão ficando por cá. Neste caso, a autora destas linhas lamenta, mas nada ficará por registar. Do Pedro, do Pedro Camacho, que foi diretor da VISÃO entre 2005 e 2015, nada ficará por dizer: o Pedro era um homem bom.
Diplomata, sereno e meigo, o Pedro tinha a extraordinária capacidade de atenuar os conflitos, mesmo quando as posições pareciam inconciliáveis e as partes só tendiam a afastar-se. Por todas as redações por onde passou (e foram muitas), o Pedro só deixou amigos. Mesmo nos momentos mais difíceis, quando todos discutiam e gritavam, ele mantinha a cabeça fria, a voz calma e, sobretudo, o coração aberto à opinião de todos. De todos, sem exceção, independentemente da idade, da importância, do cargo que ocupassem. Numa reunião, o Pedro, com a sua paciência infinita, tentava sempre que ninguém saísse dali zangado. O que, como se sabe, em matéria de relações humanas, é quase tudo o que importa.
Nasceu em 1961, numa casa onde se respirava jornalismo, no seio de uma família de ascendência madeirense. A mãe, Helena Marques, foi escritora, autora de livros como O Último Cais, que venceu o Grande Prémio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores, e diretora-adjunta do Diário de Notícias. Numa triste coincidêndia, Helena Marques também morreu recentemente, no passado dia 19 de outubro, aos 85 anos. O pai, Rui Camacho, antigo chefe de redação da ANOP, faleceu em 2014. O casal, de uma inexcedível simpatia, teve quatro filhos: além de Pedro, Paulo Camacho (jornalista da SIC durante vários anos), Francisco Camacho (que passou pelo O Independente, Grande Reportagem e, hoje, é editor do grupo Leya) e Maria João Camacho (com longo percurso na tradução).
Pedro Camacho frequentou a Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, curso que não chegou a completar por se ter iniciado no mundo do jornalismo. Começou a carreira no semanário Tempo, tendo integrado ainda as redações do Primeira Página e Semanário, além de ter posto a funcionar a informação da Rádio Paris-Lisboa. Foi responsável pela secção de Economia do Diário de Notícias e do Público, jornal onde também exerceu as funções de subdiretor. Em 2001, entrou na VISÃO como diretor-adjunto e, em agosto de 2005, sucedeu a Cáceres Monteiro como diretor. Responsável por algumas das mais importantes remodelações, foi durante a sua direção que nasceram as primeiras extensões de marca da nossa revista, como a VISÃO Verde, a VISÃO Viagens, a VISÃO Solidária e a VISÃO História, que ainda hoje são projetos bem sucedidos. Saiu da VISÃO para dirigir a Lusa e, desde 2018, era diretor de Inovação e Novos Projetos da agência.
Na Redação da VISÃO, onde esteve durante 14 anos, deixa o exemplo de um jornalista íntegro, preocupado com o rigor e com a ética deste ofício. E a memória de um amigo, um homem discreto, atento aos outros, capaz de um sorriso até nas alturas mais duras – e que, em público, preferia que não lhe tecessem grandes elogios. Lamento, Pedro, são mais do que justos e merecidos. E, além do mais, é a nossa obrigação.