Ensino à distância, telemedicina, comércio eletrónico generalizado, ferramentas de mobilização de cidadãos… O já chamado Screen New Deal concebido pelos gigantes de Silicon Valley foi amplamente experimentado durante a pandemia e pode estar para ficar. Até que ponto dele resultam ameaças à democracia? Esta é a questão levantada pela ensaísta canadiana Naomi Klein, num extenso artigo, publicado originalmente na Intercept, e que faz agora a capa da edição de agosto da Courrier Internacional.
Não enjeitando a utilidade destes instrumentos digitais, a autora encoraja-nos a olhar, de uma forma crítica, para a distopia de alta tecnologia que lhes pode estar subjacente. Ou seja: não é prudente deixarmos o campo completamente livre para os Gafam [Google, Apple, Facebook, Amazon e Microsoft]. Em vez disso, temos de repensar a internet como um serviço público ao serviço dos cidadãos, defende.
Naomi Klein insurge-se, neste ensaio, contra um “um futuro que pretende funcionar graças à Inteligência Artificial, mas que, na realidade, se mantém graças a dezenas de milhões de empregados anónimos que trabalham à porta fechada em armazéns, em centros de tratamento de dados, em plataformas de moderação de conteúdos, em fábricas de eletrónica, em minas de lítio, em explorações agrícolas gigantes, em fábricas de processamento de carne e em prisões, vulneráveis à doença e à sobre-exploração”.
Com consequências já à vista: “Um futuro em que cada gesto nosso, cada palavra nossa, cada interação nossa com os outros é geolocalizável, rastreável e analisável devido à colaboração, sem precedentes, entre o Estado e os gigantes do digital.”
“Sejamos claros: a tecnologia irá certamente desempenhar um papel importante na proteção da saúde pública nos futuros meses e anos. A questão é se esta tecnologia estará sujeita ao controlo da democracia e dos cidadãos, ou se será imposta no frenesim de um estado de exceção, sem que sejam levantadas as questões de fundo que determinarão a forma das nossas vidas nas décadas vindouras?”, questiona Naomi Klein.
Este é o artigo de capa da edição de agosto da Courrier Internacional, sempre com uma seleção do melhor que se publica na imprensa internacional. Entre os vários temas da revista merece destaque a análise à nova guerra pela água do Nilo, por causa da construção de uma nova e polémica barragem por parte da Etiópia; a possibilidade de existir um universo paralelo ao nosso (mas às avessas), desenvolvido num extenso artigo da revista New Scientist, a forma como Nova Iorque tenta recuperar da pandemia, numa análise do Financial Times, e ainda se aborda a sempre atual polémica sobre o comércio e consumo de animais selvagens na China, com base em textos publicados na imprensa de Cantão e de Taiwan.
