É uma decisão judicial com um potencial de impacto ainda por calcular. Ao início da tarde desta quarta-feira, uma juíza de Madrid deu 24 horas à Consejería de Sanidad de Madrid (o equivalente a uma Administração Regional de Saúde) para equipar os profissionais de saúde com material de proteção adequado ao combate ao novo coronavírus. A decisão é tomada depois de médicos e enfermeiros espanhóis denunciarem graves faltas de material nos hospitais e num momento em que, só naquele país, três profissionais de saúde perderam a vida vítimas de Covid-19 – uma enfermeira e dois médicos, estes já durante esta quarta-feira. Também em Portugal, vão-se somando relatos de falta de equipamentos de proteção individual nos hospitais.
O jornal El País conta que o Amyts (sindicato de médicos de Madrid, a região espanhola mais afetada pela pandemia) apresentou na terça-feira, 24, uma providência em tribunal exigindo que fossem decretadas medidas imediatas de proteção dos profissionais de saúde. A decisão foi anunciada em menos de 24 horas e determina que aquela autoridade de saúde “providencie a todos os centros da rede do serviço madrileno de saúde (…), sejam públicos ou privados, e a quaisquer instalações habilitadas para fins de saúde batas impermeáveis, máscaras FPP2, FPP3, óculos de proteção e contentores de resíduos”.
No mesmo dia, o Supremo Tribunal de Espanha recusou uma providência semelhante, mas que visava o Ministério da Saúde. Os juízes consideraram não validar a medida solicitada pela Confederação Estatal de Sindicatos Médicos – o reforço imediato dos meios disponíveis para os profissionais no terreno – por não constar “nenhuma atuação contrária a essa evidente exigência” a que médicos e enfermeiros estão sujeitos. São, diz o Supremo, citado também pelo El País, “notórias as manifestações dos responsáveis públicos, que garantem estar a alocar todos os tipos de iniciativas para satisfazer” as necessidades denunciadas por aqueles profissionais.
A decisão do sindicato de recorrer aos tribunais foi tomada depois de sucessivas queixas e denúncias que apontavam para a falta de material essencial para a proteção dos profissionais de saúde e que tinha sido detetada em muitos dos locais onde estão a ser acompanhados doentes com Covid-19. Até este momento, os dados tornados públicos indicam que 5400 dos quase 50 mil infetados com o novo coronavírus em Espanha são médicos e enfermeiros. E, depois de ser anunciada a morte de uma enfermeira do País Basco, esta quarta-feira foram anunciadas mais duas vítimas entre estes profissionais: um de Salamanca e outro de Córdoba, eram ambos médicos de família. Somam-se às mais de 3400 mortes no país provocadas pela pandemia.
A carência de equipamentos não é exclusiva de Espanha. Em Portugal, profissionais de saúde e sindicatos têm vindo a denunciar várias situações de falta de material. Esta quarta-feira, depois de ter garantido, numa entrevista à TVI que “até agora não faltou nada e não é previsível que venha a faltar” qualquer meio nos hospitais para enfrentar a pandemia do novo coronavírus.
As palavras do primeiro-ministro motivaram a reação imediata de três ordens profissionais diretamente envolvidas no combate à propagação do vírus: médicos, enfermeiros e farmacèuticos acusaram o Governo de António Costa de não ter “estado a acautelar medidas básicas e que podem comprometer todo o esforço de combate a este surto, de que é exemplo máximo a escassez de equipamentos de proteção individual”. E enumeram as “várias as falhas de segurança” que tem detetado, “faltando desde máscaras a luvas, fatos de proteção e desinfetantes alcoólicos, o que é extensível à rede de farmácias”.
Exatamente o tipo de denúncias que se vinham somando em Espanha e que terá contribuído para que, nesta fase, cerca de 12% do total de infetados com Covid-19 sejam profissionais de saúde. No país vizinho, esta terça-feira, também a Inspeção do Trabalho da Comunidade de Madrid tinha respondido a uma queixa do Sindicato Asambleario de Sanidad en Madrid, sobre este mesmo tema, requerendo à “direção geral de recursos humanos e relações laborais do Sermas [o serviço madrileno de saúde] para que, de forma imediata, se adotem medidas procedentes que possam garantir o direito à saúde de todos os profissionais que prestam serviço nos diferentes centros de atendimento primário da Comunidade de Madrid”. A implementação dessas medidas era considerada “urgente”.