É com um certo regozijo que assistimos ao nascimento de uma nova livraria independente em Lisboa. Por isso, antes de mais, é importante dar os parabéns a quem rema contra a maré e decide, na era da eletrónica e das desmoralizantes estatísticas sobre os hábitos de leitura nacionais, erguer um projeto diferenciador, cuidado e de grande envergadura. Afinal, encher dois andares de uma loja de rua com escolhas editoriais que não seguem apenas a habitual regra das novidades é obra.
A Livraria Martins fica na Avenida Guerra Junqueiro e é um sonho antigo do empresário Gonçalo Martins, que em tempos explorou a livraria do cinema King. Depois de muita procura, encontrou uma loja de rua numa artéria histórica do centro de Lisboa para montar um projeto que reúne inspirações de diferentes livrarias visitadas em todo o mundo. A ideia, conta Sara Butler, a responsável de comunicação da casa, “era que a livraria estivesse aberta não só ao bairro, mas a toda a cidade.” Para tal contribuem a bonita esplanada montada no passeio, o café no interior, com expresso a €1, bebidas espirituosas e cervejas artesanais, wi-fi e tomadas para ligar os computadores, e o facto de ser pet friendly, com malgas de água para os cães, que podem circular também dentro da loja. “Quisemos criar um conceito híbrido, clássico no exterior, com as mesas, cadeiras e lanternas antigas, mas moderno em simultâneo.”

Independente e variada, conta com cerca de 12 mil referências, mas a ideia é chegar às 20 mil, feitas de escolhas da equipa de livreiros da casa, mas também de recomendações de clientes. “Temos cerca de 300 chancelas, desde os grandes grupos editoriais às pequenas editoras, num trabalho eclético, tal como o cliente que nos visita, com muitos livros de história, de biografias, de política, de literatura infantil”, explica Sara. Fogem ao conceito de top de vendas, porque acreditam que os clientes já sabem o que procuram e, se não for esse o caso, há uma equipa de livreiros competentes para ajudar a guiar os leitores dentro do enorme catálogo. “Há ótimas livrarias independentes na cidade e esta quer ser mais um contributo para as pessoas voltarem a estar em contacto com os livros.” E fomentar o comércio de rua.
Apesar da variedade, os livros seguem uma organização mais ou menos convencional, sem prestar grande atenção aos destaques e aos critérios de novidade. Há literatura em língua portuguesa, há literatura traduzida organizada por ordem alfabética, há atualidade, uma categoria onde entram os conflitos globais, a política, o clima, há policial, fantasia, empreendedorismo e desenvolvimento pessoal, há uma zona de livros infantis bem completa e dotada de um tapete e alguns peluches, há arte, arquitetura e design, uma parede de novelas gráficas, outra dedicada a Fernando Pessoa, há religião, desporto, saúde, filosofia, viagens, comida. O trabalho é contínuo e está longe de terminar. “De futuro queremos fazer lançamentos e outros eventos, como oficinas de escrita ou a hora do conto.”

Na compra de qualquer livro, oferecem uma obra editada pela própria livraria, e que conhece mais um número da coleção todos os meses. Em setembro foi a vez de A Metamorfose de Franz Kafka e em outubro têm Citações e Pensamentos de Oscar Wilde. Mais: para se ir familiarizando com a livraria, há uma playlist da loja no Spotify – procurar Livraria Martins – que vai de Lou Reed a Best Youth, de Cat Power a Gotan Project, de Lana del Rey a Morissey. Uma seleção tão bem feita quanto a dos livros na Guerra Junqueiro.
Avenida Guerra Junqueiro, 18. Instagram: @livraria.martins