Pressente-se a mão de romancista nesta paisagem de datas, acontecimentos, árvores genealógicas e raízes literárias. Isabel Rio Novo tem obra publicada, incluindo os romances Rio do Esquecimento (2016) e A Febre das Almas Sensíveis (2018). Não é que a autora da biografia imponha floreados ou confunda a árvore com a floresta, longe disso. Mas há, aqui, um equilíbrio natural, um gesto redondo e ritmado de quem vai cultivando, pacientemente, um vasto campo a perder de vista. O Poço e a Estrada – Biografia de Agustina Bessa-Luís é um feito.
Com o título retirado do romance O Manto, inclui 80 páginas de notas e um útil índice remissivo, numa investigação alicerçada em entrevistas a amigos, conhecidos e estudiosos (a família mostrou-se indisponível, após os primeiros contactos), património epistolar da correspondência da escritora (nascida em Vila Meã, Amarante), entrevistas publicadas na imprensa, outro material documental e peregrinações às geografias da escritora e relativas à sua vasta bibliografia. A autora d’A Sibila estreou-se em 1948, com a novela Mundo Fechado, publicando, depois, mais de 50 de livros – ensaios, biografias, literatura infantil, textos dramatúrgicos… – até 2006.
Esta é uma biografia cativante, a pedir poucas interrupções de leitura e fazendo justiça a uma figura com a grandeza de Agustina Bessa-Luís, hoje com 96 anos e arredada da literatura e da arena pública por causa da doença. Contempla todas as dimensões exigidas ao género: contexto, laços familiares (por vezes conflituosos), lados negros, idiossincrasias, ecos biográficos na obra. E, claro, histórias reais que mais parecem ficção, como essa de Agustina, menina “instruída” da burguesia nortenha, que, aos 22 anos, coloca um anúncio no jornal O Primeiro de Janeiro, solicitando alguém inteligente e culto para correspondência. Conhecerá, assim, o marido e cúmplice que a ajudará a tornar-se a “Agustina”.