Itália – Práticas de Viagem não é um guia nem um roteiro turístico-cultural, avisa o autor. E, quem avisa, amigo é: a estação propicia lesa distrações e esta pérola não serve para consultas de busca pelas melhores trattorias ou como perceber tutto sobre a Sicília em dois dias. António Mega Ferreira soma quatro décadas de viajante amorosamente dedicado a Itália, e honra bem a tradição dos autores clássicos que fizeram o Grand Tour em séculos passados, e o mitificaram em termos de paisagem, filosofia e literatura, como Montaigne ou Goethe.
A sua escrita é sempre seduzida pela história e pela arte, pela curiosidade e pela capacidade de observação, pelo ethos e pelo pathos dos lugares que visita. Ainda que ele professe ser este volume uma “viagem intelectual e afetiva”, também atenta às modificações que, diz, transformaram Itália num “gigantesco parque temático cultural”. Novo aviso com o seu quê de snobismo novecentista: “(…) tendo presente que, como escreveu Péter Esterházy, ‘o turista não viaja, apenas muda de lugar’, aconselha-se o semicerrar dos olhos até que a poluição visual se dilua, uma espécie de exercício mental de ‘limpeza’ das vistas, ignorando-se as mulheres gordas, os homens barrigudos e as crianças malcriadas, concentrando o olhar apenas naquilo que vale a pena ser visto. E em Itália há tanto que vale a pena ver…”
Por exemplo, ver o céu, “cúpula de azurro”, debruçado sob Trieste, cidade amada por James Joyce e por Claudio Magris; descobrir o rasto de Tintoretto na Igreja da Madonna dell’Orto, em Cannaregio; contemplar as torres medievais de Bolonha; passear por Ravena fora e dentro das obras de Dante e de Botticelli; recordar em Pompeia… Medicis, o fidalgo de Chaves e Pasolini convivem neste relato, pontuado de fotografias de obras e monumentos – porque a beleza, há muito nos avisaram, está efetivamente no olhar de quem a contempla.
Itália – Práticas de Viagem (Sextante Editora, 280 págs., €16,60) inclui ainda atualização e acrescento de textos a um livro anterior de António Mega Ferreira, dedicado à Cidade Eterna e publicado em 2003, Roma, Exercícios de Reconhecimento