Basta a memória de um prato ou de um sabor para nos fazer voltar a determinado restaurante, talvez pela necessidade, comum ao viajante, de “ver o que não foi visto” ou simplesmente “ver outra vez o que se viu já”, como escreveu José Saramago. Neste caso, a ida ao Salsa e Coentros foi ditada pela memória das empadas (ou seria dos ovos com túberas?), do arroz de perdiz (ou seria da feijoada de lebre?) ou de outra iguaria de sabor português. Ao entrar, repara-se no ar novo das duas salas, embora mantendo os traços familiares, com linhas direitas, escasso mobiliário, mesas cómodas com as toalhas de baixo em tom castanho, a dizer com restante decoração, e as de cima brancas, como sempre. Os copos são novos (da Riedel, para os melhores vinhos). Há uma equipa coesa, centrada em José Duarte, que gere a casa e lidera o serviço de sala, com Francisco Silva a seu lado e a dupla Maria Aparecida e Alberto Gomes na cozinha.
Servem-nos, em jeito de couvert, as inevitáveis empadas de galinha, além de pão, patê e manteiga ou, sendo mais de dois à mesa, saladinhas de pimentos, de favinhas e de cogumelos com coentros, paiola de porco preto, queijo fresco (paga-se o que for consumido, como manda a lei e exigem os bons costumes), tudo agradável à vista e ainda mais ao paladar. As empadas, ninguém recusa. E não falta quem reforce com ovos com túberas (trufas alentejanas) ou com espargos, por exemplo. Há sempre um prato do dia que tem a dupla vantagem de ser servido rapidamente e de ir ao encontro do gosto generalizado dos clientes (foi assim num dia com perdiz com couve-lombarda e noutro com mãozinhas de vitela com grão). A maior parte da ementa vem do tempo do chefe Belmiro de Jesus (ex-sócio, com quem Maria Aparecida trabalhou), mas há novidades, e são boas, como os filetes de peixe-galo com arroz de grelos, em que a qualidade do peixe rivaliza com o acerto do polme e da fritura; as iscas de vitela, fritas em azeite e banha e servidas com batatas salteadas no seu molho, intensas e saborosas; as bochechas de vitela (com batatas fritas às rodelas e legumes) e o rabo de boi (com grão), dois estufados feitos com mestria, resultando macios, suculentos, tentadores. E lá estão os clássicos da casa: empada de bacalhau, bacalhau confitado com grão, polvo grelhado (vulgo: “à lagareiro”), perdiz de escabeche, arroz de perdiz (há um equilíbrio de sabores neste arroz que é de louvar a Deus), feijoada de lebre (cujo molho, engrossado com os fígados, ganha uma textura e um gosto sem equivalentes em qualquer produto gourmet alternativo), não esquecendo a empada de pato com salada verde, nem os pastéis de massa tenra com arroz de tomate, entre outras iguarias.
Para sobremesa há boas farófias de forno, pudim Abade de Priscos, tarte de requeijão, encharcada, sericaia, marmelos assados e outras gulodices deste género. Boa garrafeira, com vinho do dia branco, tinto e rosé de boa qualidade e preço acessível, a copo. Serviço eficiente e simpático.
Salsa e Coentros > R. Coronel Marques Leitão, 12, Lisboa > T. 21 841 0990 > seg-sáb 12h30-15h, 19h30-23h > €30 (preço médio)