A meta da campanha #CoNprueba é dar a conhecer aos espanhóis aquilo que podem, ou não, esperar de muitos dos tratamentos disponíveis do mercado das terapias e bem-estar e socialmente aceites, embora careçam de comprovação científica e não passem, em alguns casos, de pseudoterapias. Ou seja, prometem curar sem dispor de métodos baseados na evidência científica, levando, ainda, quem precisa de cuidados médicos e farmacológicos a não procurá-los para tratar problemas sérios. Neste cenário, as autoridades de ciência e saúde espanholas consideram imperativo sensibilizar os cidadãos para uma cultura baseada na ciência e entendam conceitos como “efeito placebo”, “grupo de controlo”, ou a diferença entre, por exemplo, “correlação” e “causalidade”.
A iniciativa teve por base as conclusões do documento da Rede Espanhola de Agências de Avaliação de Tecnologia e Prestações do Sistema Nacional de Saúde (REDETS), que avaliou 139 técnicas de medicinas não convencionais, tendo concluído que uma boa parte delas não passavam de pseudoterapias por não terem sido submetidas a ensaios clínicos randomizados ou sido alvo de revisões e meta-análises que confirmassem a sua segurança e eficácia. Entre as 73 técnicas incluídas neste grupo, podemos encontrar as pedras quentes, a hidroterapia do cólon, o coaching transformacional, a fascioterapia, a terapia bioenergética ou a análise somatoemotional. Entre as terapias que carecem de novos estudos e ainda estão na fase de avaliação, cerca de 66, destacam-se vários tipos de ioga, a acupuntura, a macrobiótica e a osteopatia.
Quem mais procura?
No ano passado, o barómetro do Centro de Investigações Sociológicas (CIS) espanhol dedicado ao tema revelou que, embora boa parte dos inquirido dissesse conhecer estas técnicas, não pareciam ter uma ideia específica do que eram e para que serviam. Quase 48% dos inquiridos que recorreram nesse ano a tratamentos e práticas não convencionais alegaram que tinham a intenção de obter por essa via ajuda para levar uma vida mais sã e equilibrada e 33% achavam que não existia um motivo concreto para confiar e acreditar que funcionavam. Na prática, pressupunham que bastava estarem diante de um profissional, que se espera capaz de tratar e curar doenças. Um erro de perceção que pode ter um preço elevado, não apenas na saúde, mas também na carteira, já que no mercado do bem-estar proliferam workshops, retiros e profissionais que praticam honorários elevados e criam expetativas irrealistas quanto aos resultados esperados sem que as técnicas terapêuticas sejam validadas pela comunidade científica. O barómetro do CIS mostrou ainda que a maioria dos consumidores destas técnicas terapêuticas sem fundamentação comprovada acederam a elas através de amigos e pessoas próximas, tinham um nível de escolaridade alto, capacidade económica acima da média e com destaque para o sexo feminino, nas faixas etárias entre os 40 e os 50 anos.
Em que ficamos?
As terapias não convencionais que a lei portuguesa reconhece (acupunctura, homeopatia, osteopatia, naturopatia, fitoterapia, quiroprática e medicina tradicional chinesa) são isentas de IVA, pressupõem formação académica superior, carteira profissional emitida pela Administração central dos Sistemas de Saúde (ACSS) e um seguro de responsabilidade civil.
Em que termos entender a sua implementação à luz da declaração conjunta assinada no primeiro mês deste ano, pelas Ordens Profissionais Médicas de Portugal e de Espanha, em que se comprometem a reprovar as pseudoterapias e a pseudociência? E a avançar com diligências junto das entidades competentes para estas serem retiradas dos serviços públicos de prestação de cuidados de saúde e dos consultórios médicos? A Comunidade Céptica Portuguesa pediu alterações à regulamentação do exercício de algumas destas terapias convencionais, por induzirem as pessoas em erro. António Vaz Carneiro, do Instituto de Saúde baseado na Evidência, afirma que “para serem aceites como intervenções válidas e com um risco calculado, deverão ter provas científica em tudo análogas às da medicina tradicional”. E conclui: “Caso não se verifique, não é legítimo reclamar a eficácia e segurança destas intervenções.”
O caso não parece problemático para quem recorre a estas técnicas e serviços e as incorpora no estilo de vida para promover bem-estar ou complemento de tratamentos médicos. Porém, na hora de ficar doente e considerá-las parte do lote das prescrições e respetivas comparticipações, o caso muda de figura. Num mundo de recursos limitados para tratar a doença, introduzir novas terapias no Serviço Nacional de Saúde que dispensam o crivo das regras a que se submetem os procedimentos e fármacos da medicina alopática é, ou pode ser, um pau de dois bicos: ter mais que um peso e uma medida e sobrecarregar o orçamento do Ministério da Saúde. Um tema a acompanhar, por ora, sem campanhas nem cenas dos próximos capítulos.