“A duração” dos telefonemas “entre o telemóvel do arguido Orlando Figueira e o escritório onde trabalho”, “por si só”, “demonstra que nada de relevante pode ter sido falado durante os poucos telefonemas que terão efetivamente ocorrido”. É esta a justificação de Proença de Carvalho para as dezenas de chamadas entre Orlando Figueira e o seu escritório – segundo os registos que a operadora telefónica cedeu ao Ministério Público durante a investigação da Operação Fizz, e que a VISÃO divulgou aqui este fim-de-semana.
O primeiro registo destas chamadas data de 27 de abril de 2015. Foi Orlando Figueira quem ligou para a Úria Menéndez-Proença de Carvalho. Até novembro de 2015 ficaram registados 35 contactos telefónicos entre o procurador suspeito de corrupção no processo Fizz e o advogado e presidente do conselho de administração da Global Media. Mas, segundo a lista da operadora telefónica, pelo menos uma dezena de vezes o contacto partiu do escritório de advogados. Nalguns casos, as chamadas caíram poucos segundos ou poucos minutos depois, tendo por isso de ser repetidas.
Maio de 2015 foi o mês em que houve mais contactos. Segundo a lista da operadora telefónica, entre 4 e 29 de maio de 2015 ficaram registados 18 contactos entre o procurador Orlando Figueira e o número fixo e um número de telemóvel do escritório de Proença de Carvalho. Só a 28 de maio foram feitos 5 contactos (seriam quatro, mas uma destas chamadas falhou e teve de ser repetida) entre as 10h e as 19h02.
Agora, em comunicado enviado à VISÃO, Proença de Carvalho alega que foi contactado por Orlando Figueira “em maio de 2015”, “ou seja, três anos depois de ele ter saído do M.P. e quando ele exercia a profissão de advogado e colaborador do BCP”. E nega qualquer envolvimento no caso. “Não participei nem tive conhecimento das circunstâncias em que esse ex-procurador saiu do M.P., nem do seu percurso profissional posterior, nem dos contratos que ele celebrou com uma empresa angolana, factos estes que, na tese da acusação, configuram os crimes que são imputados aos arguidos. Mais, durante todo o período em que o mesmo senhor esteve no M.P., nem o conheci, nem tive qualquer contacto com ele.”
Sobre o que aconteceu depois do primeiro alegado contacto de Orlando Figueira para o advogado, em maio de 2015, Proença de Carvalho promete mais explicações para o julgamento da Operação Fizz, onde prestará declarações na qualidade de testemunha: “Sobre o que se passou a partir de maio de 2015, na sequência da reunião que ele me solicitou, estive impedido de falar por dever legal de segredo profissional que impende sobre os advogados. Por isso, pedi à Ordem dos Advogados que me dispensasse do segredo para depor como testemunha em Tribunal, o que me foi autorizado para depor em juízo. Será nesse momento que esclarecerei os factos de que tomei conhecimento durante esse período, no âmbito da profissão que exerço.”
Para já, continua o advogado, “tudo quanto se diga ou se insinua a respeito dessas reuniões é mais que especulativo”. E acaba assim: “Parece-me claro a quem tem servido essa especulação a que alguns jornalistas (…) se têm dedicado. Com uma novidade que acho interessante, é a primeira vez que vejo tanto empenho nalguma Comunicação Social em promover e dar como assente a versão dos arguidos e não a versão do M.P.. Muito interessante…”
O comunicado nada diz sobre o facto de Orlando Figueira ir ser confrontado, nos próximos dias, sobre o teor de um artigo da VISÃO que noticiou a existência de um encontro entre Proença de Carvalho e Orlando Figueira no escritório de Paulo Sá e Cunha (então advogado oficial do procurador), a 14 de setembro de 2017.
Na altura, contactado pela VISÃO, Proença de Carvalho desmentiu a existência deste encontro. Paulo Sá e Cunha não o quis comentar, justificando-se com o sigilo profissional.
Depois disto, a TVI adiantou que as anotações do procurador no seu telemóvel dão conta de dez encontros com Proença de Carvalho. Terão começado a 5 de maio de 2015 e durado até à data de 14 de setembro de 2017, precisamente.
Também o jornal i e o semanário Sol já divulgaram o conteúdo de uma conversa telefónica do procurador Orlando Figueira com Proença de Carvalho, enquanto, a 23 de fevereiro de 2016, o magistrado estava a ser alvo de buscas. Nesse telefonema, Proença admite que, dadas as suas intervenções recentes no processo, seria mais útil se não fosse advogado do procurador.
Em dezembro, já depois de Paulo Sá e Cunha ter renunciado ao mandato para defender o procurador, Orlando Figueira fez uma exposição ao processo dando nota de uma outra versão dos factos: tinha sido o banqueiro Carlos Silva a oferecer-lhe trabalho para sair do DCIAP, e Proença de Carvalho tinha “comprado” o seu silêncio sobre essa matéria (com os pagamentos dos honorários do advogado e a promessa de um bom emprego no futuro).
Entretanto, os juízes que estão a conduzir o julgamento insistem que querem ouvir Carlos Silva em Lisboa. O Ministério Público já adiantou que caso surjam factos novos em julgamento será extraída uma certidão para investigar a conduta do banqueiro e de Proença de Carvalho.