Há sete anos que se mudou para a Cidade da Beira com a mulher e o filho, mas, no dia da tempestade, Luís Leal Leonor tinha ido a Maputo tratar de negócios. Quando soube que os ventos ciclónicos do Idai tinham chegado a terra, à sua terra, arrasando o que encontravam pela frente, o empresário já não teve mais sossego. “As comunicações estavam em baixo. Estive três dias sem saber da minha família”. As imagens que lhe chegavam eram de um desconsolo absoluto – e aquilo ainda não era nada, comparado com o que se seguiria, depois das chuvas torrenciais dessa noite.
Haviam de passar horas, que lhe pareceram infinitas, até algumas empresas começarem a disponibilizar as antenas-satélite. Luís já não largou o telefone. Antes de mais, para saber se a família estava bem – já que tudo o mais eram notícias sobre estradas cortadas, árvores caídas e água por todo o lado. Depois, para ajudar quem também estava como ele, à procura dos seus familiares e amigos.
“Foi por isso que criei o Rescue Beira, um grupo no Whatsapp que reúne as informações sobre os portugueses que vivem em Moçambique”. Por ali, circulam nomes de desaparecidos e gente aflita à procura de familiares e amigos, mas também as boas notícias: foi por ali que se soube que os animais da Quinta dos Crocodilos Crocossassa estavam a salvo e que as crianças do Orfanato Santos Inocentes, no Bairro da Manga, cidade da Beira, também.
“Quando finalmente cheguei à cidade, na segunda-feira, já estava tudo muito melhor”, repete Luís, mesmo que isso continue a querer dizer que, sem energia, “a Beira ainda é uma cidade cega, quando o sol se põe”. Os supermercados mantêm-se fechados e mal há alimentos ou água à venda. “Nem medicamentos”, lamenta.
“O mais que há à nossa volta são milhares de pessoas sem teto e com os pés dentro de água”. Sem comida disponível, o que se segue pode ser ainda pior. “Agora, o nosso maior receio são os assaltos e as pilhagens. Se a ajuda não chegar depressa…”
A chamada caiu e hão de passar algumas horas até a VISÃO conseguir voltar a falar com o empresário. “Pois, um dia funciona uma antena satélite, noutro dia funciona outra”, conta, antes de confirmar que já há alguma ajuda a chegar. “Já vemos alguns helicópteros, sim…”. A sua voz está muito intermitente, ouve-se com muita dificuldade, lá ao longe, até que deixa de se fazer ouvir por completo. A chamada caiu outra vez.