“Talvez as pessoas não devessem estar entusiasmadas”, explicava Matt Kelvin, guitarrista e vocalista da jovem banda inglesa Black Midi. “Primeiro deviam ouvir o nosso álbum e só depois decidir como se sentem em relação a nós e se querem ou não ver-nos ao vivo.”
Os Black Midi são uma banda relativamente recente constituída por Cameron Picton (baixo e vocais), Matt Kelvin (guitarra e vocais), que tiveram a simpatia de disponibilizar o seu tempo para ter uma conversa com a VISÃO, Geordie Greep (guitarra e vocais) e Morgan Simpson (baterista).
Os “miúdos” conheceram-se quando frequentavam a BRIT School for Performing Arts and Technology, uma escola (gratuita como os músicos fazem questão de relembrar) britânica de artes performativas e tecnologia localizada no bairro londrino de Croydon, por onde já passaram artistas famosos como Adele, Jessie J ou o mais recente ator a encarnar a personagem de Spider-Man, Tom Holland.
Matt e Geordie, mais velhos, foram os primeiros a entrarem nesta escola e as “brincadeiras” musicais que faziam nos seus tempos livres marcaram a primeira formação daquilo a que um dia se viria a transformar nos Black Midi.
“Basicamente, a banda começou comigo e com o Geordie a tocar juntos nas salas de ensaio durante as horas de almoço ou depois das aulas”, explicou Matt. “Como essas salas eram grátis tínhamos liberdade para tocar aquilo que queríamos.”
“Eu comecei por tocar teclados e o Geordie guitarra e o resultado era bastante diferente do nosso som atual. Era mais música ambient e drone. Algum tempo depois, o Morgan juntou-se a nós e, graças à influência da sua bateria, adquirimos uma onda mais energética.”
Depois de muitos ensaios juntos onde poliram o bruto dos seus talentos, começaram a surgir os primeiros convites para concertos. “A formação final da banda surgiu depois um convite para tocar no The Windmill [pub em Brixton], convidamos o Cameron para vir tocar connosco. Depois desse concerto, começamos a ter mais e mais convites para dar concertos e foi assim que chegámos onde estamos hoje.”
Muito antes da banda ter tournées agendadas ou de terem lançado singles, estes jovens dos arredores de Londres já tinham feito centenas de concertos, algo que ajudou a sua reputação a crescer.
No entanto, algo que crescia paralelamente ao seu sucesso era uma aura “misteriosa”, proporcionada pela (quase) ausência de atividade nas redes sociais e de entrevistas.
Matt considera que “talvez”, esta postura tenha ajudado a criar um “burburinho” inicial à volta do conjunto, contudo, acredita que muitos dos fãs permaneceram fiéis por razões puramente ligadas à música.
“Nunca foi intenção criar uma ‘aura misteriosa’ à nossa volta, para nós, as redes sociais só servem para dizer ‘venham aos nossos espetáculos’. Mas acho que muito do hype criado à nossa volta se deveu aos nossos concertos ao vivo. Este entusiasmo todo foi crescendo muito rapidamente e nós tivemos que aprender a lidar com ele.”
“Eu acho que as pessoas pensavam que nós eramos misteriosos porque não postávamos frequentemente nas redes sociais”, acrescentou Cameron. “Apenas postamos coisas relevantes, não gostamos de publicar conteúdo excessivo como um dos membros a fazer o pequeno almoço ou a correr num parque. Só partilhamos coisas que achamos que as pessoas vão gostar como os nossos concertos ou artigos que consideramos interessantes.”
No entanto, a banda compreende que as redes sociais desempenharam um papel importante na disseminação do seu sucesso.
Algo que foi referido na conversa foi o grupo de fãs criado no Facebook, bmbmbm posting, que, diariamente, é atualizado pelos seus quase mil fãs com artigos relacionados com a banda e com fotos e vídeos das suas atuações ao vivo.
“Achamos incrível o grupo ter sido criado sem qualquer tipo de intervenção da banda”, confessou Matt. “Foi uma comunidade que cresceu bastante sem o nosso controlo, opinião ou influencia.
Mariana Amaral é fã de Black Midi e faz parte do bmbmbm posting. Viveu até aos 18 anos em Lisboa, no entanto foi para Inglaterra estudar cinema e foi neste país que teve oportunidade de ver uma das suas mais recentes paixões musicais ao vivo.
“Quando fui visitar Londres aproveitei e inscrevi-me num concurso para ganhar bilhetes para ir a um gig semi-secreto deles”, explicou. “Foi dos melhores concertos da minha vida.”
“Eles tocaram cerca de duas horas num sítio muito pequeno e íntimo. Já conhecia algum trabalho deles através de vídeos na internet, mas ao vivo soa muito melhor, até os próprios singles. É uma experiência única.”
Mariana juntou-se ao grupo de forma a acompanhar as mais recentes novidades da banda e para poder partilhar as suas experiências com os fãs. “Acho que é muito fixe porque permite que quem os tenha visto ao vivo tenha uma amostra do que está a perder.”
A jovem ressalvou o facto de a banda ser uma “lufada de ar fresco” no panorama musical atual, no entanto acredita que talvez não seja uma banda para todos os gostos.
“Eles são muito experimentais e diferentes do resto da música que é feita atualmente, mas recomendo que se tiverem curiosidade deviam tentar ver um concerto ao vivo porque é em cima de um palco que eles são melhores.”
Afinal, quão diferentes podem ser os Black Midi? No grupo bmbmbm posting descrevem o seu estilo como um desafiante math/noise rock, no entanto, um artigo da Pitchfork coloca-os numa caixa mais convencional descrevendo-os como “um novo tipo de banda de guitarra”.
Mas será que os membros da banda acham que estas etiquetas fazem justiça ao seu som?
“Eu acho que nós somos, definitivamente, uma banda de guitarra”, explicou Cameron. “Mas não pensamos muito nisso, não há nada que nos impeça de fazer um álbum de música eletrónica ou assim.”
“[A música rock] abarca imensa coisa, mas acho que não nos sentimos restringidos quando ao que queremos fazer ou aquilo que as pessoas querem que nós façamos”, completou Matt.
“Quem sabe o próximo álbum até pode ser de folk”, disse entre risos Cameron. “Não existem regras dentro da nossa banda, se quisermos experimentar música ou instrumentos novos vamos faze-lo, não queremos tocar estritamente música rock tradicional.”
Devido à dificuldade em nomear o estilo definitivo da banda, muitos jornalistas se socorrem em comparações para ajudar a definir a banda. “Nós não nos importamos muito que nos comparem a outras bandas porque a maior parte das vezes somos introduzidos a coisas que não conhecemos e acabamos por ficar fãs. Por exemplo, nunca tinha ouvido Tortoise [banda americana de rock experimental dos anos 90] e acabei por ficar um grande fã da banda.
Quanto ao novo álbum, Schlagenheim, com data de lançamento para o dia 21 de junho, os britânicos mostraram-se bastante entusiasmados a falar do seu novo trabalho, no entanto alertaram para as diferenças entre o trabalho em estúdio e os seus concertos.
“O disco é muito teatral e barulhento e tem ritmos muito intensos. Existem melodias de guitarra e baixo bastante complexas, mas, no final, é a audiência que decide qual é a sua opinião final sobre ele”, elaborou Cameron.
“Acho que o álbum vai soar de uma forma bastante diferente do que costumamos tocar ao vivo e as pessoas tem que começar a fazer essa separação na sua cabeça”, alertou Matt.
No entanto, Cameron explica que este trabalho de estúdio abriu novas portas à banda. “Nós quisemos marcar uma separação entre os nossos concertos ao vivo e o trabalho em estúdio, por isso quisemos aproveitar ao máximo esta oportunidade. Utilizamos muitos instrumentos que dificilmente utilizaríamos num concerto, como por exemplo sintetizadores, banjos, guitarras de colo…”
Não falta muito para os portugueses descobrirem se devem ou não ficar empolgados com o burburinho à volta do quarteto inglês uma vez que estes têm dois concertos marcados em Portugal. O primeiro é no festival Paredes de Coura no dia 16 de agosto e o segundo, em nome próprio, é na Galeria Zé dos Bois em Lisboa no dia 25 de setembro.
Esta é a segunda vez que Black Midi atuam em Portugal depois de terem atuado em Guimarães.
“Tocámos em Portugal no ano passado no [festival] Mucho Flow. Foi incrível, a cidade é muito bonita e o local onde atuamos era muito acolhedor”, relembrou Matt.