O Syriza até pode não ter uma solução para a Grécia, a acreditar nas raízes ideológicas das forças que o compõem. Até pode estar a fazer um grande
bluff junto da União Europeia, para conseguir mais espaço de manobra para no futuro negociar melhores condições para o povo que espera vir a representar. Talvez não pague o que deve – a dívida pública está em 177% do Produto Interno Bruto. E é provável que a doutrina que abraçou e abandonou, a saída do euro, seja a melhor solução para uma economia que passados seis anos de quase constante recessão se encontra, agora, 25% mais pequena do que era em 2008.
A verdade é que se continuar pelo caminho que seguiu até agora, se prevê que o PIB demore 13 anos a regressar ao nível pré-crise. O desemprego situa-se nos 27% e 75% dos desempregados são-no há mais de um ano. As exportações, panaceia anunciada ali e aqui pela troika, não arrancam porque o país está preso a uma moeda forte (o euro) e o brutal ajustamento interno pelo qual o país passou não foi suficiente para as tornar competitivas. Perante este cenário, não é difícil aceitar que os eleitores helénicos escolham uma força política com propostas diferentes da Nova Democracia e do Pasok, os partidos que aceitaram as regras e os conduziram a esta situação.
Por isso, a chantagem proveniente da Alemanha (de Merkel e dos seus satélites) e de Juncker, embora não seja nova, reveste-se de uma especial gravidade. Aos líderes europeus não interessa a democracia – como aliás se nota na forma como elegemos as instituições europeias – mas teocracia da austeridade. A receita cozinhada há seis anos e reafirmada até ao presente já deixou de ser uma opção económica para se tratar de uma questão de fé. E, como sabemos, pela fé se mata e se morre.
Deixem o Syriza em paz. Deixem-no fazer a sua campanha e esgrimir perante os eleitores os seus argumentos. Se o partido de Tsipras vencer e as suas propostas forem avante, que saiba a Europa lidar com elas em vez de se refugiar numa unanimidade imposta pelo mais forte. São necessárias vozes para contrariar o proselitismo vigente que não impõe apenas um severo castigo aos gregos (e, em menor grau, aos portugueses, aos irlandeses, aos espanhóis e italianos) mas ameaça afundar a Europa do euro.
Os últimos dados mostram-no bem. As previsões apontam para um crescimento de 0,1% no último trimestre de 2014, depois de a economia da região ter crescido apenas 0,2% entre julho e setembro: ou seja, uma quase recessão. As tendências deflacionárias também se acentuam. Em vários países, da Europa do norte à do sul, partidos com os quais temos vergonha de nos identificar ganham cada vez maior suporte. Também por isso, talvez seja o Syriza a salvar-nos a todos.