O secretário-geral do PS conseguiu, neste Congresso, a sua confirmação como líder, consolidando o seu estilo de fazer política “de forma séria”. E deixa, finalmente, ao eleitorado a ideia de que há um caminho alternativo de Governo, com ideias concretas, próprias, diferentes. A “causa” do emprego voltou a ser colocada no centro das preocupações políticas, local de onde nunca devia ter saído. Desta vez, a solução não é os trabalhadores pagarem a redução da fatia da TSU que compete às empresas, mas sim serem os lucros da atividade empresarial a responderem por essa parte do financiamento da Segurança Social, aliviando os custos das empresas com maior volume de emprego.
O discurso “morno” de entrada, as intervenções no sentido da coesão e unidade feitas pelos “homens fortes” do momento, a irrelevância de quem não alinha com a nova estratégia cozinhada por Seguro, Costa e Assis, e o discurso de fecho, apoteótico, do secretário-geral socialista, tudo concorreu para o ritual das “melhores práticas” partidárias destinadas à consagração de um líder. O resultado foi conseguido. E foi mais que simples cumprimento de calendário, diga-se também em abono da verdade.
Seguro garantiu o apoio das correntes mais fortes do PS e afastou a “sombra” da ex-liderança, reduzindo o peso da “corte socrática” nos principais órgãos do partido. Tudo isto sem ceder, no seu estilo de liderança: com “este PS” não há promessas de facilidades, não há abandono do discurso de austeridade, não deixará de existir prioridade ao rigor orçamental, não se decreta o fim das dificuldades nem cai o objetivo de cumprir os acordos internacionais. Ou seja, com “este PS” não há venda de “ilusões”.
Mas parece haver, ainda assim, espaço para marcar a diferença com o atual primeiro-ministro: “neste PS”, mesmo num cenário de Governo de maioria absoluta socialista, existirá a procura ativa de consensos alargados com a oposição e os parceiros sociais, senão mesmo a procura de uma coligação que garanta um suporte político alargado para enfrentar a crise – uma espécie de “bofetada de luva branca” a Passos Coelho.
Foi, porém, com propostas concretas que Seguro passou a mensagem de que pode ser alternativa. Saindo do discurso “redondo” do crescimento e do disco riscado das exportações, o líder socialista conseguiu avançar com ideias concretas e diferentes das que temos ouvido, quer em matéria estritamente económica, quer em assuntos como a saúde e a educação, a Europa ou o emprego, que volta a ganhar estatuto de tema central.
O combate ao desemprego e o estímulo ao tecido empresarial foram, aliás, áreas em que o líder socialista conseguiu surpreender, colocando em cima da mesa propostas para conseguir financiamento para as PME, aumentar a oferta de emprego e proteger o trabalho existente. Nestas matérias, inovou com a proposta de redução da taxa de solvabilidade da banca (dos 10% para os 9%, à semelhança do que ainda acontece noutros países europeus), o que poderia injetar na economia cerca de 4,5 mil milhões de euros; com a proposta, para empresas viáveis, da transformação das suas dívidas ao fisco, à Segurança Social e à banca em capital de risco; ou com a proposta de tratamento fiscal favorável para as empresas que reinvistam lucros com efeito de criação de emprego.
Mas é em torno do financiamento da Segurança Social que Seguro promete abrir uma “caixa de Pandora”, sugerindo que o sistema tem de passar a ser pago não apenas pelo fator trabalho (pelas contribuições dos trabalhadores e das empresas em função de cada trabalhador que contratam), mas olhando também ao fator lucro. Uma medida com potencial polémico suficiente para poder ser a “TSU” de um futuro Governo socialista, mas que coloca o dedo na ferida. Se o principal drama dos nossos dias é o desemprego, impõe-se arrecadar, urgentemente, receitas fiscais alternativas que permitam desagravar o trabalho, de forma a que os trabalhadores – as pessoas – não sejam vistas pelas empresas como custos incomportáveis.
Seguro parece ter encontrado o seu caminho. Diferente q.b. para poder ser visto como uma alternativa viável, no mercado doméstico, por um eleitorado que navega na área do bloco central, decide eleições e está farto desta crise sem esperança. Mas que continua a recear grandes ruturas. E também conservador q.b. para poder ser visto como alternativa viável, no mercado externo, por parceiros e credores de quem continuamos a depender.
Seguro encaixou o puzzle socialista na sua própria personalidade e estratégia e voltou a ganhar espaço para respirar. Fica, agora, na posição confortável de quem está, calmamente, à espera do seu momento. Ganhou esse estatuto por mérito próprio, mas também com a ajuda do Presidente, que “quebrou” as aspirações das franjas mais “impacientes” do PS a eleições antecipadas ao segurar Passos Coelho na “crise” do Tribunal Constitucional e ao apoiar o Governo com o discurso do 25 de Abril.
Resta saber o que tem mais força. Se a leitura presidencial do que é melhor para o País, se a inexplicável falta de bom senso que parece minar este Governo.