Deve ter sido bem divertida, aqui no Porto, a segunda metade do século XIX, quando o romantismo já batia em cheio aí na cidade. Era o tempo dos famosos abadessados, ou outeiros, que se realizavam nos mosteiros femininos de S. Bento da Avé Maria e Santa Clara. Faziam-se para assinalar a eleição de uma nova abadessa, num daqueles conventos. Houve-os que duraram semanas. As freiras davam um mote e os poetas glosavam-no. Camilo, Junqueiro, os irmãos Lusos, Pinheiros Caldas, nunca faltavam. Um cronista da época disse que “os abadessados abundavam em gemidos e em chalaças e copiosamente se regavam a vinho do Porto”. Com efeito, nos intervalos das declamações as criadas dos conventos serviam, em bandejas de prata, vinho fino e doces conventuais aos intervenientes.
Noutro ponto da cidade, no Monte Aventino, mais prosaicamente, cantava-se ao desafio. Dizem os jornais da época que a “talentosa” Catarina, do Monte Cativo, batera a “modesta” Narcisa de Campanhã, num desafio campestre.
No teatro de S. João havia verdadeiras batalhas à bengalada entre os apoiantes de duas divas da ópera: a Belloni e a Dabedeille. Camilo estava nas hostes que apoiavam a primeira. Dedicou-lhe prosas memoráveis. Depois arrependeu-se. Achou exagerado o que acerca dela escrevera justificando-se: “Belloni era feia, enfermiça, casada e, demais a mais, honesta…”
Naqueles tempos almoçava-se, normalmente, às oito da manhã; jantava-se às duas da tarde; e ceava-se à noitinha. À noite ia-se ao teatro e os que os frequentavam tentavam estar em todos. Quem ia ao S. João queria passar, também, pelo Águia d’ Ouro; e quem ia ao Circo no Príncipe Real, hoje Sá da Bandeira; também queria ir ao Baquet, que ficava ali ao lado onde hoje está o Hotel do Teatro. E usavam, para isso, um estratagema que dava sempre resultado. Nos intervalos das sessões os espetadores podiam sair até à rua, para fumar, por exemplo. Quem o fizesse recebia uma senha com a qual voltava a ter acesso ao espetáculo. Quando, alguém, já não queria voltar à mesma sala e desejava, antes, ver o que se passava noutra, anunciava-o de uma forma singular. Se fosse espetador do Circo, por exemplo, ia até junto dos do Baquet e, mostrando a senha, perguntava “quem quer trocar pr’ó Circo” ou ao contrário: “quem quer trocar p’ró Baquet…”