Não foi há muitos anos que descobri uma banda pop americana do Texas chamada Cigarettes After Sex. Tive de consultar a Wikipedia para ficar a saber que o vocalista, que imaginei ser uma loira voluptuosa cruzada de Lana del Rey com curvas de Marilyn, afinal se chama Greg Gonzalez e tem barba. Sempre gostei de bandas com aquele tipo de musicalidade suave e difusa na qual a voz tende a diluir-se nos arranjos. Diz-me ainda a Wikipedia que este género pode definir-se como ambient pop, shoegaze e slowcore. Como sou fã dos britânicos Zero 7 que navegam em águas semelhantes embora sejam mais antiguinhos, dediquei-me a ouvir os texanos, e percebi que as músicas da banda são como o sexo quando é bem feito: todas bastante parecidas e todas bastante boas.
Desde que se escuta a primeira, a segunda e a terceira, uma pessoa é levada a crer que adivinha todas as outras. E na verdade até adivinha, mas nunca totalmente. Por outro lado, o ritmo lento das batidas do indie rock transporta-nos para uma atmosfera de languidez contagiante e viciante como é o sexo bem feito e faz-nos pairar sobre a realidade como uma ave que apanha uma corrente favorável ao sentido do seu destino. As letras andam sempre em volta do mesmo: amor, atração, romance, paixão, arrufos de namorados, momentos mágicos vividos a dois, nostalgias de casos passados, declarações de amor com metáforas mais ou menos originais. Uma delícia para quem tem o coração à flor da pele e gosta de sentir a adrenalina a disparar nas veias.
Mas afinal o que é isso de sexo bem feito? O meu querido Mário Zambujal que, tal como eu, não se coíbe de abordar o erotismo na sua vasta obra literária – embora o faça de forma mais lúdica e leve – diz no seu mais recente livro que o sexo é como o erotismo, cada um tem o seu. Muito sábio, muito realista e muito certo. Quando chega a Hora H, cada um sabe de si e do seu prazer e ninguém tem nada a ver com isso, a não ser o parceiro escolhido para formar a dupla perfeita, o duo dinâmico, a dream team, e juntos, parterns in crime, voem mais alto, cheguem mais longe e cruzem os céus sem queimar as asas nem o coração. E aquilo que dá prazer a uns, pode aborrecer ou ser indiferente a outros. Gostos não se discutem, muito menos na cama.
Cada casal ou par, estável ou incerto, oficial ou clandestino, fugaz ou duradouro, constrói a sua alquimia à sua maneira que é única, exclusiva, pessoal e intransmissível. Citando o poeta António Machado, caminante no hay camino, se hace camino al andar. E no fim deste maravilhoso poema conclui, caminante no hay camino, sino estrelas en la mar. Mesmo que o caminho acabe, ou não exista, existirão sempre estrelas no mar. É a diferença entre o que passa e o que fica, entre o que o tempo mata e o que o tempo não consegue destruir. As estrelas estão lá sempre, no céu ou no fundo dos oceanos. Pouco interessa se são ou não tangíveis, guiam-nos na realidade e nos sonhos, porque já se sabe que é melhor olhar para o céu do que lá viver.
Voltando às melodias envolventes sem serem lamechas da banda de Texas que tanto me ajudaram a escrever o meu último romance A Desordem Natural das Coisas, nas livrarias já no próximo dia 13 de novembro, vou descobrindo devagar músicas novas, com o critério de me demorar em cada nova descoberta todo o tempo que me der prazer até perceber em que difere da que escutei anteriormente. Agora que sei que a voz nem sequer é feminina, ainda fico mais intrigada, porque a suavidade da mesma é impressionante. Talvez o tal Greg tenha o Yin e o Yang tão bem calibrados que o resultado seja belo e brilhante. No sexo, o Yin e o Yang também têm muito que se lhe diga. A dualidade de tudo o que existe no Universo é composta por duas forças fundamentais opostas que se encontram em todas as coisas e pensamentos e que se complementam. Mais ainda, nenhuma pode existir sem a outra, tal como a dia não existe sem a noite.
No caso do sexo, com mais ou menos carinho, desejo, respeito, loucura, estima, consideração, admiração, amizade, paixão e obviamente amor, a sombra não existe sem luz, a fusão não existe sem ausência, o voo não existe sem a queda. E por ser uma experiência tão única e intensa, é apenas normal que sensações e sentimentos se misturem numa grande “Bimby emocional” que, em vez de separar os elementos, os mistura de forma alquímica, de modo a que o todo seja maior do que a soma das partes. Mesmo sem segredos, o sexo terá sempre mistério. A grande questão reside em perceber o que representa para cada um de nós aquela pessoa na nossa vida, na nossa cabeça e no nosso coração.
Uma coisa é certa, sexo sem amor é para as mulheres algo que não dá vontade de repetir, enquanto uma grande paixão pode ser o seu eterno motor, mentor e intensificador. É aqui que o ótimo é inimigo do bom, com ou sem uma maravilhosa banda sonora a acompanhar todos os gestos. Se procura uma que o faça voar, então a banda de Texas é uma boa recomendação. Para quem for apreciador do género, claro está, porque na música, gostos também não se discutem.