Marcelo a nadar no Tejo. Marcelo a praticar Aikido. Marcelo em tronco nu na praia do Gigi. Marcelo de boné nas bancadas do Open do Estoril. Marcelo a dar aulas. Marcelo a apertar a mão a Paulo Portas. Marcelo jovem. Marcelo grisalho. Marcelo na TVI. Este homem anda há tantos anos na vida política portuguesa que, de facto, difícil é não reter imagens dele nas mais variadas situações.
Mas a memória é seletiva e a minha fixou um dos momentos mais inesperados do ex-comentador: Marcelo Rebelo de Sousa de barba negra e em mangas de camisa, ao volante de um táxi lisboeta.
Aquele momento registado por António Cotrim para a Agência Lusa, a 28 de setembro de 1989, em plena campanha para a Câmara de Lisboa, é muito mais do que uma fotografia. É um documento. Ali está Marcelo Nuno Duarte Rebelo de Sousa, um homem do eixo Lisboa-Cascais-Celorico de Basto, misturado com o povo, a tentar dar-se a conhecer sem inibições – na altura, nada nele faria prever o fenómeno televisivo em que se transformou nos últimos 15 anos.
Se, como dizia Emídio Rangel, um canal de televisão vende tudo, até o Presidente da República – “Vende aos bocados: um bocado de Presidente da República para aqui, outro para acoli, outro para acolá, vende tudo! Vende sabonetes” -, Marcelo não precisa de repetir as proezas do passado para chegar a Belém, sob pena de perder o capital de notoriedade (muitas vezes confundido com credibilidade) que a televisão dá.
Ao fim de tantos anos, estranho é que este político versátil nunca tenha ido além da liderança do PSD. Dizem que é por causa da sua personalidade: brilhante mas impulsiva, magnética mas imprevisível, tão generosa como impiedosa, popular e eclética mas com uma grande dose de loucura e genialidade à mistura. Certamente não é pela falta de originalidade das suas ideias.
E agora, uma pergunta para ‘queijinho’: em que outro país do mundo um candidato à maior autarquia se meteria num táxi durante dez horas a aturar futuros munícipes, gente atrasada para o emprego, turistas e até grávidas em fim de gestação? A resposta é tão inédita como a ideia em si: a Noruega. Há dois anos, o ex-primeiro-ministro norueguês Jens Stoltenberg copiou Marcelo Rebelo de Sousa e conduziu um táxi pelas ruas da capital, Oslo.
Com mais de 20 anos de distância, ambos tiveram a mesma má sorte eleitoral, perdendo para os seus rivais (Jorge Sampaio, no caso português). Talvez o eleitorado não goste de misturas.