A disparidade salarial é um fenómeno global que afeta todos os países incluindo os 28 Estados Membros da União Europeia. Esta realidade é consequência de um paradigma de sociedade patriarcal baseado na divisão sexual do trabalho, em que os homens são o garante da produção de riqueza e as mulheres as principais responsáveis pela reprodução e pelo cuidado.
Este velho paradigma do séc. XIX perpetuou-se, continuando a marcar a sociedade do séc. XXI. Hoje, cerca de 80 anos depois da OIT ter decretado o princípio “para trabalho igual, salário igual”, o problema continua a persistir, atingindo uma maior subjetividade e complexidade.
Disparidade salarial não significa apenas desigualdade salarial para a mesma função laboral, introduz na equação o valor do trabalho, a forma como se calcula e forma um salário, os prémios e suplementos, assim como a segregação profissional, ou seja, a segregação de homens e mulheres em áreas profissionais específicas.
No nosso país, para além da Lei Fundamental e da Lei laboral, temos um Conselho Económico e Social com uma Comissão Permanente de Concertação Social onde, Patrões, Sindicatos e Governo concertam a política e a legislação laboral. Existe ainda, desde 1979, uma Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego, também ela tripartida, que é o braço armado da lei, no âmbito do combate à discriminação entre homens e mulheres no mercado de trabalho.
E neste país, apesar de todos estes mecanismos de proteção do mercado de trabalho, a disparidade salarial entre homens e mulheres continua a persistir, atingindo os 16,7%.
Esta realidade, estranhamente, não é central na agenda mediática, na agenda política, nas agendas das Entidades Patronais ou das Centrais Sindicais e quando há alguma iniciativa de correção esta parte do Governo ou de algum sindicato setorial, como aconteceu recentemente com o acordo do setor do calçado ou com o projeto lei sobre igualdade salarial que o Governo entregou no Parlamento.
Acresce que este problema não é apenas um problema dos setores da industria tradicional, é um problema das áreas dos serviços onde é mais difícil detetar objetivamente o problema, porque as carreiras e as classificações funcionais são muito menos tipificadas.
Dizia-se nos idos anos 80 do século XX que o problema das desigualdades salarias e da ausência de mulheres nos lugares de direção se resolveria com a universalização da educação. Contudo, chegámos ao ano de 2018, as mulheres estão em maior numero no ensino superior, têm melhores resultados académicos, mas no mercado de trabalho a diferença salarial entre homens e mulheres com mais qualificações é de 28%.
A diferença na média salarial só não é maior porque o crescimento do valor do Salário Mínimo Nacional mitiga o problema nos salários mais baixos. Conforme o Salário Mínimo vai aumentando a diferença salarial entre mulheres e homens nas profissões menos qualificadas diminui, mas a verdade é que no topo da qualificação atinge valores escandalosos.
Evidentemente que não podemos olhar para o problema de forma isolada, há que compreendê-lo numa perspetiva estrutural que se cruza com o papel dos homens e das mulheres na sociedade, é preciso que os homens ocupem mais a esfera privada, que assumam mais o seu papel reprodutor e cuidador e que as políticas públicas no âmbito da conciliação da vida familiar com a vida profissional e as licenças parentais acompanhem a mudança necessária.
Mas a mudança de paradigma não se faz por proclamação. É urgente que exista um pacto social de combate à disparidade salarial que tem repercussões gravosas ao longo do ciclo de vida, acentuando as desigualdades e que introduza na contratação coletiva a conciliação da vida familiar com a vida profissional como matéria obrigatória.
Os Parceiros Sociais têm a obrigação e o dever de tornar este assunto num tema central, não é aceitável que esta desigualdade, estas disparidades inconstitucionais continuem a ser um tema menor que não faz, verdadeiramente, parte da agenda da Concertação Social.