No dia 16 de outubro de 1945 foi fundada a FAO – a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura. Desde 1981, esta data é celebrada um pouco por todo o mundo com um tema definido. Este ano, o lema é “O clima está a mudar. O modo como comemos e a agricultura também necessitam de mudar”.
A escolha deste tema não podia ser mais atual. A produção e o consumo de alimentos é considerada atualmente a atividade mais poluente à face da terra. Em parte, porque os sistemas agro-pecuários e consequentes mecanismos de transporte, conservação e transformação, necessitam de alimentar diariamente mais de sete mil milhões de bocas, às quais se irão juntar, no final de 2016, mais 84 milhões. Isto significa que cada gesto alimentar ao longo do dia, multiplicado por muitos milhões de pessoas, pode mudar o rumo do planeta.
Por exemplo, se todos os habitantes do hemisfério norte substituíssem uma refeição diária de carne ou peixe por vegetais, nomeadamente por leguminosas (grão, feijão) e cereais, que combinados são fonte interessante de proteína, teríamos uma poupança muito significativa nas emissões de gases com efeitos de estufa. Sabemos hoje que uma pequena porção diária de carne ou peixe (125 g) são mais do que suficientes para construir um plano alimentar adequado num adulto saudável.
Outra mudança que poderia ter um significativo impacto ambiental é a escolha de produtos locais. Produzidos localmente, da época e de preferência comprados em mercados de cadeia curta, ou seja, em que o transporte e a troca entre o consumidor e o produtor é quase direta. Estima-se que uma percentagem significativa do transporte rodoviário de mercadorias na Europa seja atribuível ao transporte de alimentos, muitas das vezes refrigerados e com gastos enormes de energia e emissões de poluentes.
A embalagem e os modelos de consumo final são também grandes responsáveis pela poluição. Para se produzir um refrigerante de 1 litro gasta-se diretamente 2 litros de água e, indiretamente, muitas dezenas de litros. Porque não preferir água simples na maior parte das vezes? Ainda por cima, sem açúcar ou edulcorantes adicionados. O mesmo se passa com as embalagens de alimentos, onde o plástico está omnipresente. Para além do efeito poluidor, o plástico contém aditivos que o tornam mais maleável e mais atrativo no seu uso, mas que podem migrar para o alimento em determinadas condições, por exemplo durante o aquecimento.
Outra revolução a fazer é na preparação e compra de alimentos. Atualmente, 1 em cada 3 kg de alimentos produzidos são desperdiçados. Bastaria que não deitássemos tanta comida ao lixo e a pegada ambiental da produção alimentar (a par da nossa consciência num mundo com tanta gente a morrer à fome) seria bem melhor. Para isso, é desejável planear antecipadamente a compra de alimentos, treinar o reaproveitamento de sobras e proteger os locais que perto de nós vendem produtos frescos como fruta e hortícolas. Onde podemos comprar diariamente à medida das necessidades.
Portugal possui uma tradição alimentar baseada na produção local, nos mercados de proximidade, no aproveitamento máximo dos alimentos, em práticas culinárias saudáveis e em ingredientes de base vegetal, poupadores de energia e água. Basta reparar nos nossos estufados e cozidos tendo por base as cozeduras em água a azeite, como as ervilhas com ovos, os nossos cozidos de grão, as nossas inúmeras sopas ou o aproveitamento total do porco em diversas preparações culinárias. Uma tradição respeitadora do ambiente que é necessário preservar como legado cultural e ambiental. Para além de promotora de saúde.
O estado do planeta degrada-se e a alimentação pode fazer a diferença. Mas para tal, precisa-se de algo mais do que consumidores conscientes. Todos teremos de ser cada vez mais “co-produtores” e não simples consumidores, pois tendo informação sobre como o nosso alimento é produzido e apoiando efetivamente os produtores, modos de produção e comercialização mais justos, de proximidade e amigos do ambiente, tornamo-nos parceiros no processo de produção.
Como bem recorda a FAO, “o clima está a mudar e o modo como olhamos a alimentação também necessita de mudar”.