Em Portugal, o SNS – com o trabalho de excelência desenvolvido pela agência nacional do medicamento, o INFARMED – tem sido decisivo neste processo de inovação terapêutica, pois não só aprova a introdução no mercado, como autoriza a utilização excecional de fármacos ainda não aprovados (o caso da Matilde tem sido muito mediatizado, mas há centenas de doentes que todos os anos beneficiam dessas autorizações), como ainda financia integralmente os respetivos tratamentos, como é o caso de toda a medicação dada em exclusivo em meio hospitalar.
Em 2018, a despesa total em medicamentos, na órbita do SNS, foi superior a 3,1 mil milhões de euros, o maior valor de sempre. Representou um crescimento, face ao ano de 2015, de 6,8%. O SNS suportou toda a despesa hospitalar – 1,2 mil M€ – e 64% da despesa realizada pelas famílias nas farmácias de oficina – 1,25 mil M€ – cabendo aos utentes o valor de 711M€. O número de embalagens adquiridas foi cerca de 4% superior ao registado em 2015. Verificou-se, assim, com este governo, ainda que de forma moderada, uma maior comparticipação do Estado nos medicamentos comprados em farmácia, já que em 2015 o esforço dos utentes correspondeu a 37,5%, contra os 36% atuais. Os encargos do SNS com medicamentos consomem 25% do seu orçamento e cerca de 1,2% do PIB. As famílias gastaram, em 2017, cerca de 23,5% do seu “out of pocket”em saúde, em produtos farmacêuticos, quando em 2015 essa despesa representava cerca de 24,5%.
Mas o mercado de medicamentos não evoluiu de modo uniforme. No ambulatório caiu nos últimos 8 anos, em faturação, cerca de 23,5%, graças à significativa baixa de preços e à introdução generalizada dos genéricos, que detêm hoje cerca de 54% de quota de mercado, o equivalente a 64% do mercado aonde é possível utilizar genéricos (mercado concorrencial).
No mercado hospitalar, o consumo de medicamentos cresceu, entre 2015 e 2018 cerca de 17% (mais de 170M€) graças à utilização de medicamentos inovadores, principalmente nas áreas da oncologia, incluindo patologias raras, VIH, outras doenças autoimunes (a DII, a psoríase e a artrite reumatoide) e no consumo de imunoglobulinas. Importa referir que com o atual governo foram aprovadas 151 novas moléculas nos últimos 3 anos, mais 31 do que aprovou o anterior governo em toda a legislatura. Saliente-se o peso inexoravelmente crescente dos doentes oncológicos, com 52 mil novos casos em 2015, e a projeção de 62 mil em 2030 e 65 mil em 2035. O papel do SNS tem sido, neste âmbito, notável, pois os doentes apresentam, em média, taxas de sobrevivência a 5 anos, melhores do que muitos países que gastam mais do que nós, como é o caso da Dinamarca, do Reino Unido, da Espanha ou da Holanda.
Mas também se registaram, nas últimas décadas, alterações sensíveis no modelo de distribuição de medicamentos em meio hospitalar. De um processo de consumo maioritariamente destinado a doentes internados (cerca de 80%) passamos para um modelo de distribuição maioritariamente destinado a doentes em ambulatório (consumo em casa ou em Hospital de Dia), já na casa dos 80%. O que significa uma mudança substancial no tipo de consumo: por um lado, doentes menos controlados clinicamente porque consomem no domicílio e, por outro lado, doentes crónicos com uma posologia longa e por vezes definitiva.
Isto coloca novos desafios na gestão dos medicamentos em meio hospitalar, não só pelo seu elevado preço, mas também no controlo e ritmo das entregas, prazos de validade, riscos de fraude, efetividade terapêutica e, também, comodidade e privacidade para os doentes.
Um último tema, incontornável, quando falamos em medicamentos: o preço da inovação e as dívidas à indústria farmacêutica. Estamos na era da partilha de riscos, o que significa, como se comprovou já no caso da Hepatite C, que é possível estabelecer compromissos entre Estado e Industria Farmacêutica que favoreçam modelos de negócio em que a efetividade do medicamento é fator “sine qua non” para o seu pagamento. Isso garante ao SNS que a despesa teve um resultado positivo para os doentes, mas também desafia os laboratórios a produzirem medicamentos inovadores com elevados níveis de eficácia. A despesa na inovação terapêutica terá, assim, menos margens de desperdício e as dividas à indústria podem conformar-se a períodos de tempo aceitáveis, os encargos baixarem e todos saírem a ganhar com esta economia de recursos.
Em síntese, o anterior governo teve o mérito de baixar significativamente os preços dos medicamentos e introduzir, de forma alargada, os genéricos. O atual governo acelerou a introdução de fármacos inovadores e promoveu mais acesso aos medicamentos, com o aumento da comparticipação do Estado.
Nesta matéria, como noutras, o SNS tem sido fundamental, utilizando instrumentos de avaliação e controlo irrepreensíveis e garantindo o acesso dos utentes a novas terapias, com efetividade e segurança.