Durante muitos anos, o PS cometeu o enorme erro político de excluir qualquer possibilidade de acordo à esquerda. Se isso se compreendia logo após 1975, na sequência e como consequência de posições do PCP, foi perdendo sentido com o passar do tempo. Com a sua anunciada recusa, antes das últimas legislativas, do chamado “arco da governação”, que dela a priori excluía os representantes de cerca de 20% dos portugueses, os resultados eleitorais propiciaram, e para não continuar tudo como antes exigiram, os acordos que viabilizaram o atual Governo. Governo cuja ação e cujos resultados, em especial em áreas como as do défice e da dívida, acabaram com o medo que muitos tinham de qualquer “maioria de esquerda”, dado o diabo que traria consigo e destruiria o ótimo trabalho de Passos Coelho. Medo, principal responsável pelo bom resultado da PAF, com enorme competência orquestrado e usado pelo marqueteiro que dirigiu a sua campanha, André Gustavo (por acaso preso pouco depois de regressar ao Brasil).
A situação mudou muito, pois. Para melhor, inclusive numa perspetiva de opções eleitorais e suas possíveis consequências. A cerca de 15 meses das legislativas de 2019, atendendo ao que se passou de 2015 até hoje, o PS pode, e deve, dizer que a sua expectativa e preferência, para depois delas, é manter uma fórmula governativa semelhante à atual. Mas não pode, nem deve, dizer que nunca, em circunstância nenhuma, fará qualquer acordo com o PSD. Os acordos, as alianças, mormente de governo ou para viabilizar um governo, só podem fazer-se, ou não, no concreto: face aos resultados eleitorais e às posições de cada partido nesse momento, à possibilidade de chegar aos consensos mínimos indispensáveis, com cedências mútuas, sem violar os valores essenciais de cada um.
E o PSD, se quiser atuar com racionalidade e não em obediência àquela “lógica do diabo”, também não poderá afastar in limine a hipótese de qualquer posterior acordo com o PS. Além disso se afigurar inadmissível, em termos de interesse nacional, seria muito negativo para o partido em termos eleitorais. O que só não verão (ou verão?…) alguns primários e furiosos anti-Rui Rio, que tudo apostam na sua queda. Aliás, não podendo entrar aqui na análise de fragilidades e contradições, até agora, da sua liderança – atacada por todos os lados, com a sustentação da habitual multidão de comentadores sempre na corrente –, parecem-me bem piores as contradições e condutas dos que o combatem.
Dão uma impressiva imagem do que também está em causa e em confronto a dimensão, os currículos e os perfis, para citar duas figuras que “intervieram” na última semana, de um Silva Peneda, de um lado, e de Miguel Relvas, do outro. Num violento ataque a Rio, num artigo no Expresso significativamente intitulado “PSD optou pela má moeda e matou a boa”, o emblemático Relvas diz que “o PSD perdeu ideal” e “não consegue fazer a reafirmação dos valores de centro-direita”. Além do mais, é decerto uma singularidade mundial um partido “social-democrata” ter como ideal o “centro-direita” (já nem falo do “esquerdista” programa do PPD de Sá Carneiro, que tantos evocam…). E denota tudo menos inteligência, mas isso é o menos, querer situá-lo nesse espaço, deixando para o PS o centro e o centro-esquerda…
(Artigo publicado na VISÃO 1321, de 26 de junho de 2018)