O ano de 2017 nasceu, é bom lembrá-lo, sob o signo do pessimismo mais carregado. Pelo menos no que diz respeito à Europa. Ainda a crise do Euro estava na memória de todos e o Brexit, primeiro, e a eleição de Trump depois, já no fim de 2016, lançaram a União num estado a que Juncker haveria de apelidar, tão simplesmente, de crise existencial. Pela frente estavam ainda para vir duas eleições cruciais. Sob a França pairava a ameaça de uma vitória de Marine Le Pen. Na Alemanha temia-se por um futuro pós-Merkel e, em teoria, talvez mesmo pela integração da Alternativa para a Alemanha numa qualquer solução governativa. Sinal dos tempos sombrios que então ainda se viviam, perante um Parlamento Europeu quase vazio, foi assim que em março passado o eurodeputado espanhol Esteban Gonzáles Pons resumiu a desesperança: “A Europa está limitada ao norte pelo populismo e ao sul pelos refugiados afogados no mar. A leste, pelos tanques de Putin. A oeste pelo muro de Trump. No passado, com a guerra. No futuro, com o Brexit. A Europa está hoje mais só do que nunca, mas os seus cidadãos não o sabem.”
Façamos correr os meses. Tudo visto e revisto, 2017 acaba, convenhamos, de forma surpreendentemente positiva. O Brexit continua, é verdade, a fazer o seu caminho. Mas avança ao ritmo e nas condições de Bruxelas. Nesta frente o que mudou não foi tanto a esperança de ver a História andar para trás. O que mudou foi a certeza de que não será criado um precedente que faça da saída da União uma opção simples, uma tentação para alimentar discursos simplistas nas várias capitais europeias.
Trump também não desapareceu. Mas o populismo não chegou à Europa (ou, sendo mais rigoroso, não alastrou na Europa). Wilders foi contido na Holanda. Na Alemanha a srª Merkel procura ainda negociar a formação de um executivo, mas a sua continuidade à frente do país continua a ser o cenário central. E os franceses redescobriram as virtudes do centro (facto ainda não suficientemente sublinhado) elegendo um Macron que talvez personifique, melhor do que qualquer outro, a esperança (que não a certeza, bem entendido) de um aggiornamento da ideia europeia. Não por acaso, por todas estas razões, a discussão sobre a agenda reformista europeia ganhou, nesta reta final do ano, uma centralidade impensável há pouco tempo.
Aconteça o que acontecer, façamos o que fizermos com a oportunidade que agora se abre, 2017 será lembrado como o ano em que a esperança renasceu na Europa. Sabemos bem que a janela temporal não é infinita. Em bom rigor espera ainda o fim das negociações alemãs para escancarar-se. E sabemos também que voltará a fechar-se, ainda que temporariamente, ao ritmo diabólico das várias eleições na Europa.
Mas, isto dito, a verdade é que a esperança está aí. E a magnitude do que esperamos não é coisa pouca. Regresso – já o citei em março – ao notável discurso de Pons: “A Europa (…) é a vontade de viver juntos. (…) se não temos sonhos comuns, não temos nada. A Europa é a paz que veio depois da guerra. A Europa é o perdão entre franceses e alemães. A Europa é o regresso à liberdade da Grécia, da Espanha e de Portugal. A Europa é a queda do muro de Berlim. A Europa é o fim do comunismo. A Europa é o estado social, é a democracia. A Europa é os direitos fundamentais. Podemos viver sem tudo isto? Podemos desistir de tudo isto? (…). A União Europeia é a única primavera que o nosso continente viveu em toda a sua História.”