A ausência de carros voadores talvez seja a mais extraordinária lacuna deste presente em que vivemos que foi futuro imaginado de outros. Ninguém diria que os carros se iriam conduzir sozinhos antes de ganharem asas, fazendo com que a sugestão “passa por cima” adquirisse finalmente uma dimensão literal. O futuro é uma coisa estranha. Não havia Maga Patalógica nem guru da ficção científica que adivinhasse algo tão monstruoso e complexo com a Internet: a maior invenção da História a seguir a Gutenberg. E quando apareceram os CD, nem nos apercebemos que estavam prestes a ser extintos.
Lembro-me dos primeiros anúncios da Philips que mostravam os discos prateados a cair com estilo da janela de um prédio alto e a chegarem ao chão intactos, prontos a ser colocados na gaveta da aparelhagem. Era publicidade enganosa. Os CD partem-se e riscam-se. Têm uma durabilidade muito limitada. Na altura, era um admirável mundo novo. Repare-se que antes do CD o contacto com o digital era tido quase exclusivamente através dos relógios de pulso eletrónicos. Era fascinante a modernidade implícita de ver o tempo da faixa a passar no painel retroiluminado. Dava para escolher a faixa e não era preciso limpar nem mudar de lado. O som era límpido. Muitas pessoas trataram de vender ou deitar fora os seus velhos discos de vinil para usufruir exclusivamente do sólido engenho tecnológico, quase milagroso, cujo funcionamento mecânico nos escapava e por isso adquiria uma aura mágica.
Não demorou muito tempo até aparecerem as primeiras dúvidas. Aqueles momentos em que se fechava a gaveta do leitor e se ficava à espera se o disco era lido. Quando por capricho dava erro, não havia nada a fazer senão tentar outra vez.
A curta história dos CD teve várias fases. Desde o fascínio inicial, à criação de clones perfeitos com a vulgarização dos gravadores de CD, o que deixou a indústria de cabelos em pé, até à atual decadência. Os CD deram lugar ao download de ficheiros: o que para a indústria significou algo ainda mais penoso, pois já não era preciso sequer ter acesso a um original, bastava um computador e um programa de torrent.
Sabe-se agora que, em Inglaterra, a venda de vinis superou a de downloads. Acalmem-se os fãs dos discos velhos. A venda de vinil tem vindo a subir lentamente, mas o mais relevante desta notícia é a ideia de que os downloads já eram. O streaming é a tecnologia do momento, facilitada por plataformas como o Spotify ou o YouTube. Tal pode significar que as novas gerações estão a livrar-se da voragem do ter, basta-lhes aceder. E quem quiser realmente materializar as suas devoções musicais num objeto, o melhor é comprar um velho disco de vinil, de uma beleza e de uma acústica que as sucessivas tecnologias não conseguem superar. O futuro também mora lá atrás.JL
O Homem do Leme Vinil, vidi, vici
A ausência de carros voadores talvez seja a mais extraordinária lacuna deste presente em que vivemos que foi futuro imaginado de outros. Ninguém diria que os carros se iriam conduzir sozinhos antes de ganharem asas, fazendo com que a sugestão "passa por cima" adquirisse finalmente uma dimensão literal. O futuro é uma coisa estranha. Não havia Maga Patalógica nem guru da ficção científica que adivinhasse algo tão monstruoso e complexo com a Internet: a maior invenção da História a seguir a Gutenberg. E quando apareceram os CD, nem nos apercebemos que estavam prestes a ser extintos.
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