Sete filmes portugueses estarão presentes no Festival de Berlim, que decorre de 11 a 21 de fevereiro. Em destaque Cartas de Guerra, a partir de Lobo Antunes, o único filme português na seleção oficial de longas-metragens. Estrear-se-á em Portugal, em setembro. O JL falou com o realizador.
Adaptar as Cartas de Guerra, de António Lobo Antunes, ao cinema é um projeto bastante audacioso. Como surgiu a ideia?
Em primeiro lugar, interessa-me trabalhar sobre esse tempo histórico. Já tinha abordado o 25 de Abril, em Águas Mil, mas ainda não tinha encontrado uma forma de tratar a Guerra Colonial. Quando li as Cartas de Guerra, achei que era aquilo. Juntava uma história de amor maravilhosa, com um grande autor e um documento histórico. A partir daí foi uma questão de trabalhar, fazer entrevistas, recolher documentação e então escrever o argumento. Sendo que para mim só faria sentido filmar em Angola.
E foi difícil?
São dificuldades inerentes. Tivemos um apoio enorme do governo da província de Cuando-Cubango. Não estávamos a filmar em Luanda, mas sim em terras do fim do mundo, no tipo de paisagem onde se passou o livro. Reforçando a ideia de que a guerra chegara ao absurdo. Isto é um filme sobre o desastre destes homens atirados para um sítio sem sentido, no meio do nada. Nunca tinham visto animais senão vacas e cavalos e agora deparavam-se com elefantes. Ao contrário dos habitantes, que nunca viram sequer um carro, e agora apareciam-lhes helicópteros. É um filme sobre o agonizar de um país, do ponto de vista de alguém que, entre estes miúdos, está a formar-se enquanto escritor.
O que o fascina neste tempo que não viveu?
Quando se sente que estão a esconder alguma coisa redobra-se o interesse. Quer a Guerra Colonial quer a euforia do 25 de Abril foram abafados. Quis saber o “o quê” e o “porquê”.
Como selecionou os atores?
Foi um casting muito grande com o João Pinhão. Eram precisos atores com energias e rostos diferentes. Trabalhámos com jovens e buscámos um grupo heterogéneo, atores de telenovelas e de teatro, de norte a sul do país. O papel principal é do Miguel Nunes, um jovem ator que estava a viver em Paris. Há 46 atores no total.
O que significa esta seleção para Berlim?
Era o que tínhamos idealizado. Passou menos de um ano entre o fim das filmagens e a seleção. Sabíamos que era difícil acabar a montagem a tempo. Mas foi fantástico. Estou muito contente por mim, pelos produtores e por toda a equipa. Mas também pelo cinema português. A seleção do filme só pode encorajar cineastas e produtores, e sensibilizar as entidades responsáveis para que as coisas possam ser um bocadinho mais sólidas. O filme foi paralisado durante quatro anos, porque não pagavam os subsídios. E miraculoso que tudo termine tão bem.
Já sabe qual é o projeto seguinte?
Não podia estar parado enquanto esperava que as verbas para o filme se desbloqueassem, então avancei em simultâneo com um outro projeto, com dinheiros maioritariamente vindos de Macau. Uma longa-metragem chamada Hotel Império, cuja rodagem será feita no segundo semestre deste ano.