Uma obra feita de “começos e recomeços” ao correr de muitas décadas de trabalho marcado pelo “efémero” e pela “experiência”, justificam o título da retrospetiva de José Nuno da Câmara Pereira, Um Sísifo Feliz, que se inaugura a 21, no Centro Cultural Arquipélago, na Ribeira Grande, na Ilha de São Miguel.
O artista que nasceu em 1937, em Santa Maria, regressou aos Açores, em 1994, fixando-se em Angra do Heroísmo, depois de ter estudado e trabalhado largos anos no continente e de ter passado no final da década de 80 pelos Estados Unidos. A açorianidade marcou o seu percurso e criação, como se poderá verificar nesta exposição, comissariada por José Luís Porfírio.
“José Nuno da Câmara Pereira fez muitas obras efémeras, que já não existem, pelo que vamos ter algumas recriações e procuramos dar uma visão alargada do seu percurso, desde o final dos anos 60, com duas peças do tempo em que estudou na Escola de Belas Artes de Lisboa, até peças recentes já deste século e desta década, embora desde 2014, esteja impossibilitado de trabalhar”, adianta o comissário ao JL. E destaca desde logo um momento inicial nesse trajeto, recuperado em Um Sísifo Feliz: “O começo, em que problematiza o quadro de cavalete, Há peças em que quase não entra a mão, antes a matéria é lançada sobre uma placa de madeira. São aquelas a que chamo autopinturas, porque de certa maneira são pinturas que se pintavam a si próprias”. Obras que ocupam a primeira sala e onde “o Caos, a Ordem e a açorianidade se revelam”, como se pode ler no texto de apresentação.
No eixo central da mostra, três grandes salas em que, além da pintura dos anos 60 e 70, se apresentam as grandes instalações, realizadas entre 1979 e 1987, uma “fase fascinante do seu trabalho”, como salienta José Luís Porfírio. Com a ajuda de Urbano Resendes, um artista de São Miguel, foi feita a recriação de uma instalação, realizada na sociedade Nacional de Belas Artes, em Lisboa, em 1986, uma espécie de “paisagem de terra e lama”.
Vacas e Contentores de Paisagem, noutra sala, dá a ver obras realizadas a partir do regresso aos Açores, com uma “aposta na diversidade dos materiais e das grandes escalas notáveis nas especialmente raras pinturas autoportantes”. E nas caves do Arquipélago, com a pedra negra dos Açores, aproveita-se a “”escuridão” para apresentar duas instalações de vídeo com fragmentos de uma marcante instalação feita, em 1979, na Central Tejo, hoje Museu da Eletricidade, e de um projeto de monumento feito a seguir a “Imaginação da Matéria”, a que chamou “Toten da água e dos ventos”, nunca realizado.
Noutro percurso, apresentam-se trabalhos mais “tradicionais” e “células” em que se mostram fragmentos de obras desaparecidas. E foram muitas as que se perderam, condenadas à efemeridade, além da sua própria natureza, por um certo “esquecimento” a que o artista está sujeito sobretudo desde que voltou aos Açores. Mas José Nuno da Câmara Pereira “olhava sempre em frente”, sem olhar ao que ficava para trás, como salienta ainda o curador: “Ele sempre esteve mais interessado em continuar a fazer coisas e por isso se pode falar de um Sísifo feliz, porque há uma grande dose de inocência e de felicidade em fazê-las, ainda que muitas fossem ficando pelo caminho. E assim como ele foi esquecendo, as suas coisas também foram esquecidas e abandonadas””.
Por isso mesmo, para uma visão mais panorâmica da obra, diversificada e intensa, poderá ser vista uma exposição virtual, realizada pelo próprio José Luís Porfírio.
Retrospetiva de José Nuno da Câmara Pereira
José Nuno da Câmara Pereira inaugura dia 21 de abril, no Centro Cultural Arquipélago, na Ribeira Grande, na Ilha de São Miguel, a exposição Sísifo Feliz.
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