O encontro estava marcado para o Hub Criativo do Beato, com o qual João Vasconcelos tem uma relação especial. Atrasou-se, o que não é comum, devido a um furo no seu Mercedes de 72, que conduz pela cidade. Nada que o trave. Juntamente com os responsáveis atuais pelo espaço, conduziu a EXAME pelo empreendimento, quase não se lembrando da entrevista.
Na hora de conversar, fomos à aventura pelo bairro, até encontrar abrigo numa startup que deu o salto, a Cerveja Musa. As bebidas vieram, há que admitir, mas a conversa foi séria e sem tropeções.
O que é que o entusiasma hoje em dia?
A mesma coisa que me entusiasmava ontem. A mudança, a evolução, o surgimento de coisas novas, a transformação. E estamos a viver um desses momentos. E estar vivo e poder fazer coisas neste momento da Humanidade, tudo isto me dá muito prazer. O que está a acontecer com a globalização, com a internet, com a nanotecnologia, com a realidade virtual, com a Inteligência Artificial, com a blockchain. É uma revolução equiparável a qualquer outra grande revolução da Humanidade. Acho que no fim a Humanidade vai sair muito melhor, os negócios vão ser melhores, a qualidade das nossas vidas vai ser melhor, os produtos e os serviços serão totalmente diferentes, as indústrias, as empresas, os empregos. E eu estou muito contente por estar a viver esse momento. Sem medo do futuro, porque viver estes momentos com medo do futuro é uma coisa horrível.
Tem saudades de estar no Governo?
Não diria saudades. Eu tenho muito respeito pela minha passagem pelo Governo e por ter sido membro do Governo. Tenho muito respeito por todos aqueles que são ou que foram membros do Governo, de qualquer partido. Para mim, a política e o ser político é dos atos mais nobres que um ser humano pode atingir. Tratar dos destinos da sua comunidade, influenciar esses destinos, para mim isso é o máximo que um ser humano pode desejar. Fui membro do Governo com muito orgulho, tive também orgulho no que fiz, lancei vários programas que queria; com pouca humildade posso dizer que deixei uma marca, uma identidade, que felizmente era a do PS, que estava no programa do Governo. Tive muito orgulho. Se tenho saudades? Há muita coisa melhor por eu não estar no Governo. Vou ser pai outra vez, tenho a minha família muito mais contente. Vou levar a minha filha à escola, vou buscá-la, tenho os meus hobbies, estou finalmente a recuperar uma data de carros antigos que tinha estacionados e abandonados. Estou com os meus amigos. E, como tenho 42 anos, ainda posso preparar uma carreira profissional no privado.
Está mais feliz?
Estou mais feliz. Sim, mais feliz enquanto pessoa. Agora, é uma felicidade mais egoísta, estou a pensar mais em mim. As coisas deram as voltas que deram, a saída foi da forma que conhecemos, o que me tornou se calhar mais egoísta, mais individualista.
Da sua parte, a saída do Governo, da forma como sucedeu, está bem digerida?
Digerida não está, porque não foi a saída que eu queria, não é?
Alguma vez estará?
Não sei. Vamos ver como é que isto tudo acaba. Também…eu fui à bola, não é? A uma final do Euro, com amigos, a convite do patrocinador da Seleção. Para mim é isso, ponto final. Não há mais do que isso. Eu acho que as pessoas todas o perceberam. Aliás, vê-se o reconhecimento que têm por mim, os convites que tenho recebido para o setor privado. Mas há um processo a decorrer que dará em alguma coisa.
Saiu para não abrir uma vulnerabilidade ao Governo?
Sim, foi mais isso. Eu por mim não alteraria nada no que estava a fazer, mas acho que para o Governo foi melhor que tivéssemos saído naquela altura. E há um compromisso, apesar de não estar escrito, de que sempre que houvesse membros do Governo arguidos de algum processo, estes não deveriam continuar. Eu concordo com isso, são precisas regras dessas também para credibilizar mais a política. Infelizmente, algumas dessas regras, incluindo a que se aplicou a mim, podem ser rígidas demais, vistas a esta distância, mas se calhar nós precisamos delas. Tudo o que ajuda a credibilizar a política e os políticos, trazer mais respeito para várias gerações, eu quero fazer parte disso. É essa uma das principais razões pelas quais eu agora vou organizar o congresso do PS. E o principal objetivo é fazer um grande esforço para que várias gerações, que estão muito arredadas da vida partidária e política, se possam aproximar.
Vê-se a aprofundar a relação com o PS?
Eu aceitei este desafio porque é temporário, é um objetivo muito claro e não colide com a minha vida profissional. Eu recebi dezenas de convites quando saí do Governo. Algumas multinacionais, empresas nacionais, os maiores grupos do País convidaram-me para vários cargos, coisas muito honrosas. Aceitei o convite da Clearwater, porque era o único que não tinha nada nada que ver com o Governo, nem com dinheiros públicos nem com Orçamento de Estado nem com fundos comunitários.
Está disponível para, mais tarde, voltar a um cargo governativo?
Não estou a ver. Não penso nisso neste momento. Não é nada que passe pelos meus objetivos a curto prazo.
O que faz atualmente na Clearwater?
A Clearwater é uma empresa que está em oito países, sete europeus e depois está na China. Nasceu no Reino Unido e é uma empresa de fusões e de aquisições. Não compramos nem vendemos, fazemos a mediação de compra ou de venda de empresas ou de partes de empresas. É a única que se apresenta no mercado muito focada nas PME. Normalmente nas big four eles também fazem isto, mas para tratar de uma empresa de cinco ou de três milhões aquilo não é bem o seu core. Para nós, se calhar um negócio de cinco milhões é um senhor que montou a empresa há 30 anos à qual dedicou toda a sua vida. Ele quer falar comigo, ou com um dos donos da empresa, pois estamos a vender aquilo que lhe levou 30 anos a criar, é um filho dele. Mas já não tratamos só de PME; a Clearwater intermediou a venda da Fitness Hut, participou também do lado do comprador na aquisição de uma posição maioritária na MD Moldes, MD Plásticos, que é uma das melhores fábricas de plásticos e de moldes de Portugal.
Em termos de setores, o que os investidores estrangeiros mais procuram?
O setor automóvel, os componentes. Tudo o que é IT também gera interesse, farmacêutica também, saúde. Estão a começar a aparecer alguns negócios interessantes na agroindústria, na transformação. Mas M&A não é só comprar e vender. Grande parte do nosso tecido empresarial está agora a fazer 30 anos ou 35 anos, na sua maioria estas são empresas criadas a seguir ao 25 de Abril, e em muitas o fundador está a chegar ao fim da sua vida ativa. Há fundadores que perceberam que, apesar de toda a vida lhe dizerem que ele é rico, só é rico no dia em que vender a empresa. Muitos têm problemas de sucessão, não querem que a empresa morra com eles, querem vender. Temos casos em que querem vender tudo ou parte, casos em que querem um investidor para um plano de expansão. Há ainda quem procure know-how mais do que dinheiro, procure apoio comercial de expansão.
Na orgânica do Governo, a indústria e a inovação têm surgido sempre juntas. Como se interligam hoje estas duas realidades?
Eu sou totalmente contra coisas a que chamam inovação. Acho que é ridículo. Há especialistas em inovação que querem isso, porque dá-lhes jeito. Hoje em dia, há mais especialistas em inovação do que inovadores. Se calhar o mais importante é saber o que é inovação. Para mim, tem de ser algo que vá gerar um novo processo, um novo produto ou um novo serviço. Se no fim não gera nada disto, então não é inovação. Inovação tem de ter emprego, faturação, pagar impostos. Não se pode separar indústria da inovação ou do empreendedorismo, seria um erro.
Um dos problemas em que se tem focado é a falta de mão de obra na indústria, que será pouco sexy para os jovens. Como é que isso se resolve?
Se for a uma universidade portuguesa e se perguntar quem é que quer vir trabalhar para a indústria, não sei se encontrará alguém. Isto é gravíssimo para a indústria, e acima de tudo para o País, porque os serviços são muito importantes, e em Portugal são fulcrais, mas continuo a achar que o crescimento sustentado na indústria é diferente e melhor. O setor que mais bebe ciência, inovação e conhecimento é a indústria. Os empregos menos sazonais são na indústria. No entanto, é preciso ver que tipo de indústria, porque eu, quando me refiro à indústria, é a uma indústria do século XXI. Um exemplo é o dos moldes, ou grande parte da indústria do calçado hoje em dia. Já aquela indústria que acha que este salário mínimo não pode ser aumentado… essa indústria, eu garanto-lhe uma coisa: se uma fábrica não é viável porque tem de pagar 600 euros de ordenado, o problema não está no ordenado. Todos os setores estão com dificuldade em contratar agora. Na minha região, é sexy trabalhar nos moldes, mas foi a indústria dos moldes que conseguiu isso. Conquistou-o, abriu-se. Recebe visitas das escolas, vai às universidades. Por isso, tratar a indústria toda por igual e dizer que toda ela está impossibilitada de contratar também não é justo. Quanto à questão dos jovens, se chegarmos a uma escola e se dissermos que hoje em dia no meio de uma fábrica há realidade aumentada, Inteligência Artificial, big data, cibersegurança, robótica, tudo coisas que estão em várias empresas, se calhar isso é mais atrativo. O Indústria 4.0 é um bom momento para ela se dar a conhecer a esta geração.
Entende algumas críticas que são feitas à Web Summit e ao entusiasmo alegadamente excessivo que gera em Portugal?
Acho tão ridículo… eu nem sei o que as pessoas criticam. Aquilo é privado, o dinheiro que leva do Governo é irrisório, só da renda do espaço pagam mais do que o que recebem. Não percebo essas opiniões. Se não gostam, tudo bem, felizmente estamos num País de opinião livre.
É um preconceito contra o que vem de fora?
Eu acho que muitas vezes por cá o empreendedorismo é muito giro, desde que não ganhes dinheiro. Isto é como ser artista, é muito giro seres pintor, escultor e fotógrafo, mas se ganhas muito dinheiro há logo quem não goste. Esta é uma barreira que temos de passar. Para muitas gerações, para alguns setores da sociedade, o Web Summit representa várias coisas que eles odeiam: a iniciativa privada, o sucesso, a globalização, o desconhecido. Aquilo é uma conferência que abriu com uma intervenção do Stephen Hawking a falar da Inteligência Artificial. Garantidamente há muita gente que não percebeu nada. Nem sabem quem ele é! E isso faz-lhes confusão. Eu não percebo é o ódio.
Encontra alguma raiz comum a estes movimentos contra o excesso de turismo e que não são exclusivamente nacionais?
Sim. Encontro, mas sempre tivemos isso. Desde o início do século até 2017, o nosso crescimento económico andou abaixo de 0,3%. E há quem esteja satisfeito com isto. E há quem ache que os próximos vinte anos também podem ser assim, mas eu acho que não. Não quero arruinar a minha geração e as que aí vêm. O Web Summit foi de longe a melhor coisa que aconteceu na minha geração, para Portugal.
Graças ao Web Summit, as pessoas nem sonham a quantidade de investimento que estamos a receber, postos de trabalho, nem sonham o que isto tem feito pela imagem de Portugal. Vivemos num país livre, e haverá sempre quem ache que tudo o que vem de fora é mau. Não podemos acabar com isso de um dia para o outro. A geração que governa as empresas portuguesas e o País foi educada a temer o desconhecido, a desconfiar. Não posso querer mudar isso de um momento para o outro, mas a minha geração não é igual. Aliás, a que vem a seguir faz com que a minha pareça algo medieval. O Web Summit nem é pelo empreendedorismo, achar que é um evento de empreendedorismo é de alguém que nunca foi lá. E os principais críticos nunca lá foram. O Web Summit é onde se discute o futuro ponto, como a tecnologia vai ter impacto na nossa vida, nos governos, nas democracias, nas empresas. Para isso, dá uma grande atenção às startups, porque é delas que estão a nascer as inovações para esse futuro. É um evento com o mundo todo a discutir o futuro, na nossa casa. Isso é mau, como? Se calhar é-o para as pessoas que não querem fazer parte desse futuro, para quem o receia.
Acha que, a seguir a este ano, temos boas possibilidades de continuar a ter o Web Summit por cá?
Eu falo muitas vezes com o Paddy, sou muito amigo dele, temos uma amizade muito boa. O Paddy é um tipo único, muito especial. O futuro do próprio Web Summit é algo que está sempre em mutação, vão nascendo vários eventos do próprio Web Summit que está a dividir-se em outros, porque está a ficar muito grande. Eles adoram Lisboa, estão muito associados a ela, e a cidade também os adora. São muito responsáveis por esta nova geração citadina, a maneira como Lisboa está a ser vista pelo mundo. A Web Summit teve muita influência nisto, não é só no turismo que está a atrair; a Web Summit está a trazer empresas. Se continua em Portugal, ou não, é algo que nada tem que ver com dinheiro nem com apoios públicos, não é nada disso. Alguém que ache que o Web Summit está em Portugal por causa do dinheiro está muito errado. É fácil arranjar 50 cidades que pagariam muito mais do que Lisboa. Eles não estão aqui por causa do dinheiro. Eles querem uma cidade, cujos valores e posicionamento sejam associados aos seus. E enquanto for esse o posicionamento de Lisboa, o Web Summit continuará cá; enquanto Lisboa quiser ser genuína, for cool, a preços moderados. Não precisa de ser baratinha, também já não o é, mas que continue a ser autêntica, tolerante, em que um árabe ou um dinamarquês jantam bem no mesmo restaurante e andem bem na rua. Enquanto Lisboa for assim teremos sempre Web Summit.
No dia em que o Web Summit partir para outras paragens, o que fica?
Há uma coisa que já se vê desde o ano passado, é que há uma geração Web Summit. O facto de termos dado aqueles dez mil bilhetes a estudantes universitários, a preço simbólico, foi muito importante. Esses e outros jovens que tiveram a possibilidade de irem à Web Summit nunca mais serão os mesmos. Só vamos ver isso daqui a uma década, mas está lá. Eu, se naquela altura, com vinte anos, tivesse tido a oportunidade de ver aqueles oradores todos, aquilo tudo, eu próprio seria muito diferente do que sou hoje. Nem é o impacto de investimento, não é isso. Medir o impacto pelo Web Summit, pelo investimento é algo errado: aquilo não é um encontro de investidores. Os investidores vão lá porque querem perceber as tendências, o que está a dar, qual é a “next big thing”.
Já temos em Portugal massa crítica suficiente para podermos falar de uma verdadeira comunidade de startups?
Temos muito mais do que o que tínhamos há cinco anos, mas ainda há um longo caminho pela frente. Temos muitos empreendedores, precisamos de mais investidores do setor. Não temos falta de dinheiro, precisamos é de dinheiro nas mãos certas. Não temos ainda muitos empreendedores que tiveram muito sucesso, que ganharam dinheiro, e nós precisamos disso. Primeiras empresas de origem portuguesa que façam dinheiro, e não só em faturação, porque isso até já temos. Precisamos de pessoas que façam a saída, que façam um IPO. Precisamos de um milionário. Isso vai ser um selo. Isso é o que marca grande parte dos ecossistemas, ter vários casos desses, porque ele depois vai reinvestir no setor, vai ser mentor também.
Estamos a conseguir apanhar bem o comboio da Indústria 4.0?
Acho que o Governo fez o seu papel. Criou a discussão, os instrumentos financeiros para os empresários que queiram investir nisto. Agora cabe a estes perceber se estão interessados. Há uma coisa que eu nunca farei na vida, que é, enquanto governante, opinar sobre o que um empresário deve fazer ou não. Um político deve dizer o que está a acontecer no mundo, coisas que vão alterar as empresas, os setores, e dar os instrumentos para o empresário decidir se quer ou não fazer. Nunca um político deve opinar se o empresário está a fazer bem, mal ou se devia fazer assim ou assado. Quem montou a empresa foi ele; má ou boa, se esta existe é graças a ele. Essa arrogância de muitos políticos acharem que sabem mais do que os empresários… políticos e não só. Há muitos consultores a opinar sobre as empresas… então que montem uma! Já que sabe tanto disso. Mas não o fazem, porque montar uma empresa não tem nada que ver com fazer “power points”. Quanto à Indústria 4.0, em todos os setores há casos de empresas que estão já a aproveitar isto. É uma discussão mundial, só um empresário muito alheado do mundo não percebe o que está a acontecer. Em Davos, tem sido uma discussão fundamental. Neste ano, a discussão tem uma particularidade, uma componente muito importante que é agora aprofundada: temos de ter estes desenvolvimentos tecnológicos e crescimento económico, mas temos ao mesmo tempo de ser inclusivos.Hoje, o objetivo principal de uma empresa não é só faturar, não é só o impacto económico. Acredito que, nos próximos anos em Portugal, vamos ter de começar a ter essa conversa. Na indústria, há um foco do País nas exportações mas não necessariamente uma aposta em setores.
Isso é mau ou é assim que deve ser?
Acho que é importante dizer que as exportações são uma prioridade, mas esta ser a única é um erro. O Portugal 2020 só financia quem exporta é um erro. Tenho empresas que substituem importações que são tão importantes para o País como as de quem exporta. E para ter empresas exportadoras, eu preciso de muitos fornecedores locais, muita indústria local, que são tão importantes como quem exporta. Tratar isto de maneira diferente é um erro. Segundo ponto: acho que o Estado porque não tem nem nunca terá meios suficientes, humanos ou financeiros, para apoiar a diplomacia económica não deve apoiar todos os setores da mesma maneira em todos os mercados. A mesma coisa na atração de investimento; eu não posso achar que vou atrair determinado tipo de investimentos, porque nalguns não somos competitivos. Até parece que somos bons para fazer tudo! Ninguém é.
Como é que vê o País daqui a cinco anos?
2017 deverá ser o melhor ano em termos de crescimento económico desde que me lembre. Nunca entrei num ano com um crescimento de quase 3%, défice tão baixo, desemprego como está, a dívida pública a descer. Começamos este ano com tudo perfeito. Vai ser difícil estragar; isso pode acontecer, mas vai dar trabalho estragar. É óbvio que a seguir a isto haverá um momento pior, são os ciclos económicos normais. Acho que é agora que devíamos estar a lançar os alicerces para que o nosso crescimento económico nos próximos 20 anos não seja 0,27% como foi nos últimos 20. É por isso que discutir a inovação, a ciência, a Indústria 4.0 são questões fundamentais. Parece que estamos a falar de coisas que só vão ter impacto daqui a dez anos sim, mas esse é o objetivo. Alguém tem de estar a pensar no que vai acontecer daqui a dez anos. Mas há outra coisa que é importante referir. Este é de longe o momento da Humanidade em que há mais inovação e tecnologia a ser assimilada, mas ao mesmo tempo estamos a viver uma valorização de tudo o que não é tecnológico. Estamos a falar simultaneamente de comércio eletrónico e de digitalização, estamos a ver modelos de negócio que não eram viáveis antigamente e agora são. Um caso é o turismo, provavelmente o setor em que o digital mais mudou o negócio. Antigamente não era viável teres uma unidade de turismo rural com sete quartos. Agora, com o digital, passou a ser. A mesma coisa na costumização. Tudo o que é luxo, tudo o que é vendido caro, é feito à mão. Quando se fala de Indústria 4.0, há uma coisa que é garantida: um ser humano fará coisas dignas de um ser humano. E tudo o que a máquina fizer melhor, que assim seja.
Continua otimista para o País…
Por várias razões. É impossível estragar as melhores coisas que nós temos. A nossa qualidade de vida, a nossa maneira de ser, a nossa comida, a nossa geografia, a nossa abertura. Em termos económicos, isso já é futurologia. Acho que se nos focarmos em dois ou três setores nos quais sabemos que somos muito bons, o futuro só pode ser bom. E um desses setores é claramente o digital. No digital, nós já somos um dos melhores locais para instalar uma empresa, mas ainda podemos fazer mais. O digital pode ser também importante para o nosso problema da interioridade, que é grande e que temos de resolver urgentemente.A Altran tem 200 ou 300 engenheiros no Fundão. Isto nunca foi possível, na história da economia e antes do digital, ter empresas com esta qualidade de emprego em zonas rurais, no interior do País. O digital até prefere isso. E devia ser uma prioridade em Portugal, mas tem de ser o País todo a acreditar que o caminho é esse, mesmo para os setores mais tradicionais.
O empresário desde sempre viciado no futuro
Formação
A gestão está-lhe no sangue, até por razões familiares, mas o curso que escolheu foi o de Relações Internacionais. No entanto, a vida chamava-o fora dos muros da escola, e cedo começou a administrar empresas e a criar negócios.
Carreira
Aos 18 anos, quando muitos estavam a desfrutar da experiência académica, já Vasconcelos dava os primeiros passos na administração de empresas, na sua região de origem, Leiria. A paixão pelo empreendedorismo começou muito antes de o movimento se tornar moda em Portugal, e o empresário esteve ligado ao lançamento da incubadora industrial Open, da Marinha Grande. Passou por várias empresas, seguindo de certa forma os passos familiares, com raízes nessa atividade. Ganhou visibilidade com a vice-presidência da Anje e, sobretudo, com o lançamento da Startup Lisboa, por onde passaram algumas das maiores coqueluches do segmento. Seguiu-se a experiência no Governo (já antes tinha colaborado nos tempos de José Sócrates), como secretário de Estado da Indústria e da Inovação. Apesar de um mandato aplaudido, saiu do cargo no ano passado, devido ao escândalo das viagens de membros do Governo ao Euro de Futebol, a convite da Galp. Tem negócios próprios e trabalha como consultor da Clearwater Internacional, consultora especializada em fusões e aquisições de PME. E voltou a ter tempo para tratar dos seus carros clássicos.