Quando decidiu trocar a consultoria pelas vinhas não sentiu que estivesse a abdicar de nada. Bem pelo contrário. Artur Meleiro integrou a PriceWaterHouseCoopers ainda antes da fusão com a Lybrand e lá se manteve até 2002, quando integrou os quadros da IBM. Mas o vinho e a quinta onde crescera não lhe saíam da cabeça. O pai sempre produzira para consumo doméstico, mas nunca tinham arriscado mais do que isso. Em 2004 fez um ano sabático em que decidiu dedicar-se à enologia mais a sério e fez todos os cursos que encontrou. Entre 2005 e 2012 esteve ligado à área comercial e começou a passar mais tempo em Melgaço. Em 2013 faz-se a primeira colheita de Valados de Melgaço, o que marcou a entrada da nova assinatura no mercado: 2.500 garrafas de vinho verde, 100% alvarinho.
“Nesse ano perdi uns 6 mil euros”, diz Artur Meleiro à EXAME durante um almoço em jeito de entrevista. Entretanto percebeu que se queria fazer de Valados de Melgaço um nome forte, precisava de investir. Tempo e dinheiro. “Não se produzem 50 mil garrafas estando lá só a meio tempo”, atira confirmando que foi esse o patamar a que conseguiu chegar em 2017. Uma quantidade que pretende consolidar nos próximos anos, agora que já chegou ao break even em termos de produção. Entretanto o projeto já recebeu meio milhão de euros de investimento – partilhado entre Artur e um primo, em partes iguais. E, desde 2013, Artur dedicou-se totalmente à gestão da companhia, que no ano passado faturou 75 mil euros – “o objetivo eram 90 mil” – e que tem como intenção chegar aos 225 mil euros em 2018. Para 2019, a meta é a exportação representar metade das suas vendas. Se tudo correr bem, o projeto continuará a crescer. Se não, “não vou investir mais”, garante Artur. “Cheguei ao limites das minhas possibilidades”.
O gestor mostra-se, no entanto, otimista e acredita que tem feito um caminho que lhe permitirá não só afirmar a marca no mercado interno, mas lançá-la a sério no mercado internacional. “Para já as exportações são residuais, mas espero que em 2019 elas representem metade da faturação”. Está em contacto com distribuidores e clientes, e acredita que não é impossível. Até porque o mercado nacional, sozinho, nunca lhe permitirá a dimensão que prentende. É preciso “subir o preço do vinho”, justifica. Fazendo coro com vários produtores, Artur critica os valores a que se vendem muitos vinhos portugueses, pedindo que façamos uma conta simples: “se só a garrafa custa 0,50 euros, como é que um vinho pode ser vendido a 2 euros? Com rótulo, com rolha, com distribuição, com o próprio vinho….?”E sublinha ainda o preço a que é pago cada quilo de uva, muito abaixo do que devia (“há quem pague menos de um euro por quilo. Como é que se pode?”) recordando também que muitas vezes os agricultores só recebemos pagamentos no final do ano. Por isso mesmo, atira, “é preciso que as pessoas percebam que o vinho tem que ser mais caro”. E aproveita para criticar os intermediários que tentam esmagar os preços, mesmo que seja para vender os vinhos em restaurantes. “Se o consumidor está disposto a pagar 20 ou 25 euros por garrafa, por que é que temos que tentar baixar tanto no produtor?”, lamenta. Daí também a opção pela exportação, uma vez que os mercados estrangeiros são mais maduros e estão dispostos a pagar preços justos por vinho de qualidade.
Os dados mais recentes mostram que a região do vinho verde exportou, em 2017, 26,1 milhões de litros no valor de quase 61,6 milhões de euros, sendo assim uma das regiões nacionais que mais vinho põe fora do País. O crescimento foi de 2% em volume e de 3% em valor, em termos homólogos, o que permitiu também uma subida do preço médio para o exterior – que se fixa agora nos 2,35 euros o litro.
Alvarinho é rei
Atualmente, a Valados de Melgaço tem cinco referências no mercado, que incluem vinhos tinto, brancos e espumantes. Um deles, o Valados de Melgaço – Vinificação Natural, é produzido com recurso às técnicas utilizadas pelos antepassados da família. Ou seja, é o mais ‘tradicional’, em que a fermentação é garantida sem utilização de sulfitos e apenas com recurso a primaflora. “Não é um vinho biológico”, apressa-se a esclarecer o gestor. “Mas é um vinho ecologicamente sustentável que usa técnicas de vinificação naturais”. As mesmas que o avô e o pai usavam quando era sua a responsabilidade de explorar as terras da família.
A este juntam-se o Quinta de Golães Colheita Selecionada (Alvarinho, Trajadura e Loureiro), o Valados de Melgaço espumante (Alvarinho), o Valados de Melgaço Reserva (Alvarinho) e o Valados de Melgaço tinto (blend de castas regionais). O nosso favorito foi o de Vinificação Natural, que pelas características únicas – acidez, frescura, aromas – pode ser bebido sozinho, mas aguenta lindamente um prato de carne que fizemos questão de pedir. Aliás, mais do que aguentar, foi o escolhido para continuar a acompanhar a refeição. O Valados de Melgaço Reserva foi também uma boa surpresa.
Atualmente, Artur compra cerca de 70% das uvas que utiliza – as suas parcelas somam apenas quatro hectares – mas acompanha todo o crescimento e produção. Une-se a produtores que já conhece e que o deixam ser parte do processo, de forma a garantir que no final, o vinho tem a qualidade pretendida. Os enólogos responsáveis pelo projeto – José António Lourenço e Fernando Moura – ultimam depois o produto final numa adega cujo espaço a Valados de Melgaço aluga. As cubas e afins pertencem-lhes, mas ter uma prensa e um espaço alocado à adega “era um investimento que não tínhamos condições de fazer”. Nem necessidade, explica.
Nos próximos tempos, é possível ainda que a empresa alugue algumas vinhas, para diminuir a quota de compra de uva, mas para já o que importa é mesmo consolidar o patamar a que chegaram. E garantir que as marcas não desaparecem em 2019, ano limite para Artur e o seu empenho neste projeto de família.