Se existe expressão que sempre me deixou mergulhada em perplexidade é a de separar as águas. O azeite separa-se da água se nela for mergulhado, já com os vinhos não é assim; as misturas resultam numa poção estragada, estranha, por vezes intragável. Podemos separar o trigo do joio, o urgente do importante, o rápido do fácil, podemos separar a gema do ovo, mais fácil se está cozido e mais difícil se está cru – embora eu consiga tal habilidade apenas com uma mão, aprendi com o filme Gigi quando era miúda, e acreditem que o faço com elegância e mestria – mas há coisas impossíveis de separar, como o apego do afeto, o carinho dos abraços, o sorriso da cumplicidade, o calor da pele quando o sol lhe bate. As mulheres gostam e precisam de sexo com amor, de sentir o coração a bater mais depressa quando a campainha toca. Se não bater, é porque não é amor.
Com quantas mais mulheres troco histórias e ideias, mais confirmo que sexo sem envolvimento emocional redunda quase sempre em experiências gratuitas, com sabor agridoce e sem margem útil, utilizando uma expressão tão do agrado da malta da economia.
Daquilo que se possa passar com os cavalheiros no geral, não irei formular ideias definitivas e taxativas, porque, como nunca fui um homem, por mais que tente, não consigo perceber ao certo como funcionam. Acredito que o facto de terem duas cabeças os faça agir de forma diversa. Sei que uma mulher é continuamente erótica e um homem intermitentemente sexual. Sei também que os homens distinguem o tesão do amor, embora muitas vezes não saibam bem onde encaixar a paixão nessa dicotomia forçada e nem sempre clara. Repito: da rapaziada e daquilo que os move não sei assim tanto, mas de mulheres entendo eu, portanto vamos lá a arrumar ideias, para que os homens percebam de uma vez por todas como é que as mulheres gostariam que as coisas fossem.
1 . Nenhuma mulher gosta de ir para a cama com um tipo por ir. Isso não existe. Na situação ideal, vão quando se apaixonam ou se envolvem de alguma forma. Raramente o fazem por pena ou por carência. E quando isso acontece, o balanço, embora possa ser positivo do ponto de vista técnico – soube bem, o sexo oral foi bom, ele era meigo e dormiu agarrado o resto da noite – do ponto de vista emocional, fica aquele vazio que se explica com a clássica frase, não houve clic. Ou seja, num mundo em que o sexo está cada vez mais à mão e é cada vez mais simples despachar o assunto, também há quem prefira optar pela abstenção, caso o pleno não seja possível. O pleno é o sexo com amor, para quê algodão se pode ter seda? Tenho amigas que adoram sexo e passam meses sem que nada aconteça por isso mesmo; não estão para aproximações torpes daquilo que desejam. É como querer comprar uma Chanel e contentar-se com uma imitação. Existem imitações espetaculares, mas o Grande Bazar de Istambul não é a o número 51 da Avenue Montaigne em Paris. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa.
2. Aquela noção muito masculina de que o sexo é diversão não encaixa na cabeça de uma mulher. Podemos achar o sexo bom, interessante, estimulante, desafiante, mas divertido? Amiguinhos, nós divertimo-nos a ir jantar fora com as amigas, a ver comédias românticas debaixo de uma manta em casa à lareira com um amigo gay, a comprar tops na Zara, a passear à beira-rio ou em viagens de Verão, mas o sexo para nós não é diversão. O sexo é como cozinhar: toda a gente consegue, mas só alguns fazem pratos deliciosos. Ou seja, voltamos ao mesmo, sem emoção fica tudo muito sensaborão, desinteressante, insonso.
3. Se um caso durar muito tempo, das duas uma: ou um dos interessados está muito apaixonado e finge que não para não chatear o outro e vai aguentando o barco a custo porque sabe que está a remar sozinho, ou estão os dois muito mais envolvidos do que querem acreditar e ambos navegam sem rumo no pântano da negação. Um caso nunca é só uma história de cama, porque se for, rapidamente perde o interesse. Não é o sexo em si que nos dá prazer, é com quem o fazemos. Sem laços de outra natureza, nomeadamente afetivos e cognitivos – carinho, respeito, consideração e admiração – o interesse esgota-se rapidamente e passa para outra pessoa, ou até para nenhuma, desfazendo-se naturalmente na espuma dos dias.
4. Talvez por terem duas cabeças em apenas um corpo, é provável que o sangue não chegue às duas ao mesmo tempo, pois é do mais elementar bom senso que uma desliga a outra. Daí que os homens tendam a separar o amor familiar e confortável daquele que lhe provoca um desejo apaixonado, transgressor e tantas vezes incontrolável. Seria útil à sociedade e traria certamente mais paz ao mundo se a rapaziada conseguisse ter uma visão integradora e inclusiva da realidade. Se percebesse que a mesma mulher pode ser tudo: boa mãe e ótima amante, dona de casa extremosa e excelente artista de circo na cama.
Eu gosto de ir jantar fora a um restaurante que tenha um bar para ficar a beber um copo a seguir, já agora com um bom DJ caso me apeteça dar um pé de dança, tudo sem sair do mesmo lugar, em vez de andar a saltar de bar em bar, não sei se me faço entender com esta analogia. As mulheres gostam de consistência, apreciam o foco e valorizam a continuidade. Se um homem não se concentra, nós não o levamos a sério. E acreditem, mesmo que o sexo nem sempre seja levado a sério, é amor é.
Gostamos de nos apaixonar, mas é por quem valer mesmo a pena. Senão, preferimos ir jantar fora com as amigas ou ver séries. O algodão serve para usar com o desmaquilhante e deitar no lixo, a seda é para dormir a noite toda em conchinha. Entre o pleno e a imitação, vai uma distância maior que de Paris à capital da Turquia. Muito maior. Palavra de mulher.