Depois da ginasta Simone Biles, da basquetebolista Elena Delle Donne e das irmãs tenistas Venus e Serena Williams, todas americanas, o grupo de hackers Fancy Bears divulgou esta quinta-feira dados sobre o consumo de substâncias proibidas de mais 25 atletas olímpicos, incluindo mais dez americanos e os ciclistas britânicos Chris Froome e Bradley Wiggins, ambos vencedores da Volta a França, a mais prestigiada corrida da modalidade.
A revelação destes documentos clínicos confidenciais acontece na sequência de um ataque cibernético à base de dados da Agência Mundial Antidoping (AMA), que liderou a investigação que levou à suspensão da equipa russa de atletismo dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro. Na base dessa decisão esteve um alegado esquema de recurso sistemático a substâncias proibidas, de iniciativa e supervisão governamental, por parte da Rússia. Que está agora contra-atacar, segundo Olivier Niggli, diretor-geral da agência que regula o combate ao doping a nível planetário.
“A AMA foi informada pelas autoridades que estes ataques têm a sua origem na Rússia. Que fique a saber-se que estes atos criminosos comprometem em grande medida o esforço da comunidade antidoping global para restituir a confiança na Rússia”, assumiu aquele responsável após os primeiros documentos virem a público, na terça-feira, para hoje reforçar a ideia sem rodeios: “A AMA não tem dúvida de que estes ataques são uma retaliação contra a agência e o sistema antidoping global, por causa das nossas investigações que expuserem o doping patrocinado pelo Estado na Rússia.”
Através de um porta-voz, o governo russo desmentiu “sem hesitar” qualquer envolvimento direto ou através dos serviços secretos nas ações dos Fancy Bears, que é como quem diz os ursos sofisticados. Mas o caldo está entornado: além de ter visto a sua segurança informática posta em causa, a AMA tem noção de que a reputação dos atletas pode sair manchada.
Não que esteja em causa qualquer prática ilícita por parte dos 29 nomes visados até ao momento – haverá mais, prometem os hackers. De facto, todos eles apresentam nas suas fichas clínicas o uso de determinadas substâncias que fazem parte da lista de proibições, mas sempre ao abrigo de autorizações especiais previstas nas regras antidoping, aprovadas pelas respetivas federações internacionais caso a caso.
Em causa estão problemas de saúde que, quando devidamente comprovados, permitem abrir exceções na lista de produtos proibidos. A tetracampeã olímpica Simone Biles, por exemplo, assumiu no Twitter que sofre de Transtorno de Défice de Atenção e Hiperatividade (TDAH) e está autorizada a tomar um medicamento para o efeito que em condições normais não poderia. A asma de Chris Froome e as alergias de Bradley Wiggins também dão direito a autorizações especiais. E o mesmo se pode dizer dos outros nomes que vieram a lume, confirma a AMA: “Fizeram tudo dentro das regras.”
Não é o que dizem os Fancy Bears, que acusam os Estados Unidos de usarem “métodos sujos para ganharem”. Segundo pode ler-se no site oficial do grupo de hackers, a equipa americana “esteve bem” ao liderar o quadro de medalhas, mas “não jogou limpo” no Rio de Janeiro. É o regresso da guerra fria, em versão olímpica.