São os números, estúpido…
Ao mesmo tempo que António Costa e Rui Rio se confrontavam no seu segundo e último frente-a-frente, agora nas rádios (Antena 1, Renascença e TSF), saíam, como sopa no mel, os novos números do INE, com correções relativamente ao exercício de 2018. O Instituto reviu em alta o crescimento do PIB, de 2,1 para 2,4%, e reviu em baixa o défice, de 0,5 para 0,4% (depois da previsão governamental de 0,6 por cento). À saída do debate, Costa não se esqueceu de comentar profusamente os resultados, ao mesmo tempo que, no Porto, de forma concertada, o ministro das Finanças, Mário Centeno, reagia com entusiasmo à boa notícia do dia. Na verdade, a campanha do PS estava precisada desta vitamina, numa altura em que as sondagens já viram melhores dias. E o primeiro-ministro não se esqueceu de misturar tudo com a referência a uma curiosa reportagem da revista alemã Der Spiegel, que trata Herr Costa como “o socialista confiável” e recorda como o inicialmente desconfiado Wolfgang Schäuble, ex-ministro das Finanças alemão, crismou Centeno como “Ronaldo das finanças”. E tudo isto ao segundo dia de campanha. Costa deve estar a perguntar se o jogo não pode acabar já…
O debate: marcação à zona… e mulheres a homem
Num debate que alternou a marcação à zona entre os quatro homens presentes, foram as duas mulheres que fizeram marcação homem a homem ao primeiro ministro. O debate a seis, na RTP, revelou-se uma peça muito interessante de abertura de campanha, com toda a gente a lançar o mote para as próximas duas semanas. Temas: carga fiscal para Rui Rio. Crescimento económico e contas certas para António Costa. Impostos e serrviços públicos para Assunção Cristas. Mundo do trabalho para Jerónimo de Sousa. André Silva representa o novo partido da cassete. E Catarina Martins vende a imagem de quem está em estágio para co-governar. A bloquista é a que melhor passa nas câmaras, revelando uma maturidade cénica em que muito a ajuda a formação dramática. Assunção Cristas, embora eficaz e repentista – “Olhe que também há trabalhadores do setor privado, António Costa…” – atinge limites próximos do irritante: será a nova picareta falante? Já Catarina (com a sua chazada a Costa) e o líder do PS desabafaram tudo o que tinham entalado nas garganta, perante o constrangimento dos adversários de debate – e o divertimento de Rui Rio, que assistiu ao espetáculo “sem pagar bilhete”. No final, isto mudou alguma coisa, no espírtito do eleitorado? No espírito dos indecisos, talvez. E talvez Bloco e PSD tenham, nesse aspeto, lucrado mais.
Praticantes de ética
Num dia morno, em termos de estrada, para os líderes políticos, a jornada de campanha fica, assim, marcada pelos debates: o da manhã, já citado, e o da noite, na RTP, juntando os líderes dos partidos com assento parlamentar. Com agendas leves, todos terão preferido preparar-se para o encontro noturno “num estúdio de televisão perto de si”. Mas, voltando ao da manhã, a coisa aqueceu, entre Rio e Costa, quando, a propósito dos casos de family gate, o líder do PSD afirmou que o PS, no poder, se comporta como o “dono disto tudo”. Costa disse que não aceita lições de ética de ninguém, nem sequer de Rui Rio, por quem tem “estima”, enquanto Rio retorquia que também não dá lições de ética, porque não é “professor”, mas sim “praticante”. Não se sabe se pelo efeito de a campanha oficial já ter começado, mas o certo é que este debate foi mais rasgadinho do que aquele que, há uma semana, tinha oposto os mesmos líderes perante as câmaras das três televisões generalistas… Já agora, Costa também aproveitou para voltar a bater no Bloco de Esquerda enquanto Rio afirmava que também dispõe de “um Mário Centeno” [o prof. Joaquim Sarmento professor auxiliar de Finanças do ISEG e porta-voz do PSD para a área]. Infelizmente para o líder do PSD, pode dizer-se que se terá, assim, descaído com um involuntário elogio ao ministro das Finanças…
O passe único não fica órfão
Jerónimo de Sousa tem, entretanto, a sua explicação para números tão animadores como aqueles que o INE agora revelou, apontando o dedo, por exemplo, à degradação dos transportes públicos. Numa das ações de campanha do dia, disse que “as cativações falaram mais alto”, coisa a que raramente se referira quando a “geringonça” funcionava oleada, sem os grãos de areia próprios dos períodos eleitorais, em que cada um “pedala a sua bicicleta”. A propósito, a campanha começou no “dia sem carros” e Rui Rio deu o exemplo, pedalando a sua, num passeio a partir da Casa da Música, no Porto. Ou seja, desta vez, Rio não se fechou a preparar-se para o debate (radiofónico). Já tem experiência… Voltando a Jerónimo, o PCP, disse ele, defende o passe único desde 1997 e mesmo em 2016, PS, PSD e CDS (com abstenção do BE, não se esqueceu de referir…) reprovaram a ideia, no Parlamento. “Só que agora”, diz Jerónimo de Sousa, “todos querem assumir a sua paternidade”. Uma questão de direitos autorais, portanto.
Bloco e CDS partidos do Estado social…
Somos todos sociais-democratas. Por isso, Assunção cristas dedicou o dia à Saúde – ou à falta dela – com um ramalhete de críticas à degradação do SNS, invocando exemplos concretos. E Catarina Martins visitou bairros sociais, visitando moradores com “rendas injustas” em atraso.. Já tínhamos dito que somos todos sociais-democratas?…
E Jardim quer mais “porrada”
Depois de Miguel Albuquerque ter dito que, agora, concluídas as eleições regionais, o PSD Madeira vai dedicar-se a trabalhar para eleger deputados para a “Assembleia Nacional” – um lapsos linguae embaraçoso… – Alberto João Jardim, pouco convencido com a perda da maioria absoluta do PSD na Madeira, veio neste segundo dia de campanha afirmar à TSF que há infiltrados não sociais-democratas no PSD Madeira e que é preciso “fazer uma limpeza”. Depois de Jardim ter voltado a ser Jardim, no comício de encerramento da campanha regional, parece ter-lhe tomado o gosto e, agora, “é porrada de cima a baixo”…