Alex Mullen é estudante de medicina na Universidade Mississippi e foi, no ano passado, campeão do mundo de memória cerebral, no World Memory Championship que decorreu em Singapura – consegue decorar a ordem de um baralho de cartas (baralhado) em 17 segundos.
Os “atletas da memória” como Alex Mullen conseguem recordar centenas e até milhares de palavras, imagens ou números aleatórios. Pode parecer um talento especial mas, de acordo com um estudo hoje divulgado, esta capacidade pode ser treinada e todos podemos ser mestres da memória, se usarmos os mesmos truques que usam os campeões e que passam por alterar as redes cerebrais envolvidas naquele processo.
O estudo recorreu a 23 dos melhores atletas da memória para comparar os seus cérebros aos de pessoas que nunca tinham praticado qualquer técnica de memória. Depois de entendidas as diferenças através das TAC realizadas, os investigaram puseram os participantes a fazer os mesmos exercícios de memória que fazem os atletas. Resultado: Em apenas seis semanas, os seus cérebros começaram a assemelhar-se aos dos atletas.
Martin Dresler, o neurocientista da Universidade de Radboud, na Holanda, e autor responsável pelo estudo garante: “estas proezas de memória incríveis… não são um talento com o qual nascemos. É mesmo só treinar.”
Depois de treinar “conseguimos fazer coisas que nunca imaginámos conseguir”, corrobora o atleta Alex Mullen que antes de treinar, sentia que a sua memória “não era assim tão boa”.
Boris Nikolai Konrad é investigador no Laboratório de pesquisa de Martin Dresler e é também um atleta da memória (o 24º melhor do mundo) e mostrou-se surpreendido por não se verificarem diferenças no cérebro – o hipocampo, o centro de memória cerebral, não era maior nos atletas da memória do que nos amadores.
Esta é uma descoberta inovadora porque tira a capacidade de memória invulgar do campo do biológico, ao contrário de outros estudos, como o que foi feito em 2011 a taxistas londrinos e que provou que tinham um hipocampo maior, dada a capacidade de recordar centenas de caminhos e ruas. Aqui isto não aconteceu e o que se verificou de diferente foram apenas as conexões cerebrais que criam. Os seus centros de memória comunicavam mais ativamente com os seus centros de visuais e espaciais.
O “Palácio da Memória”
Isto acontece por via da forma como os atletas se treinam: pensam em lugares familiares e enchem-nos de objetos imaginários. Um bom exemplo é uma vaca (cow) a comer musgo (moss) para representar a cidade de Moscovo (Moscow).
Ao imaginar estas imagens num sitio familiar, como a porta do seu quarto, os investigadores sugerem que se podem guardar com mais facilidade porque estamos a estimular duas capacidades em que o nosso cérebro é muito bom: a aprendizagem visual e a navegação. A este método, os atletas chamam “Palácio da Memória”.
Alex Mullen começou a desenvolver técnicas de memória para estudar para os exames e decorar as matérias de medicina. A dada altura, confessa “tornou-se viciante. Como no Candy Crush, quando queremos continuar a aumentar os nossos tempos e os nossos resultados”.
Segundo este método, sobretudo visual, Mullen consegue decorar tudo, desde a anatomia do corpo humano a uma lista de compras. E o grande segredo é não perder o ritmo. Quando não está a treinar para as competições, Alex Mullen dedica cerca de 30 minutos do seu dia a praticar esta técnica – que foi o tempo que os participantes deste estudo também passaram a treinar.
O estudo em causa incluiu, além da comparação entre amadores e profissionais da memória visual, um terceiro grupo treinado para um outro tipo de truque de memória, baseado na repetição. Este grupo teve resultados muito menos satisfatórios a decorar palavras aleatoriamente do que os seus pares treinados para a memória visual e as TAC aos seus cérebros não mostraram as mesmas alterações.
Além disso, quatro meses depois já não tinham quaisquer capacidades, enquanto os que treinaram como os profissionais ainda mantinham as mesmas alterações cerebrais ao fim dos mesmos quatro meses. Isto tudo vem provar que o nosso cérebro é flexível e que facilmente se adapta.
A má notícia
Não há nenhuma evidência de que este tipo de treino, que envolve um grande investimento de tempo, ajude nas tarefas mais corriqueiras, o que significa que pode decorar centenas de dados aleatórios… e ainda assim esquecer onde deixou as chaves.