Enquanto foi aluno de doutoramento na Universidade de Cambridge, na década de 80 do século passado, José Sande Lemos, presidente do Centro Multidisciplinar de Astrofísica (CENTRA) e professor no Instituto Superior Técnico, teve várias conversas inspiradoras com o professor visitante, James Peebles, já na altura uma referência na Cosmologia. A gratidão pela orientação científica ficou expressa na sua tese de doutoramento, em particular na resolução de um problema relacionado com as perturbações num universo não homogéneo em expansão.
De que forma é que James Peebles influenciou o seu trabalho?
Apesar de ser ainda jovem, quando passou por Cambridge, em 1986, Peebles já era uma referência na cosmologia e trabalhava com Robert Henry Dicke (um físico que também deveria ter recebido o Nobel), que foi o primeiro a perceber que era preciso melhorar os testes à Teoria da Relatividade Geral [de Einstein]. Quando ele lá chegou para passar uns meses, vindo da Universidade de Princeton, fiquei muito contente por ter alguém com quem conversar sobre o meu trabalho. Eu estava a começar o meu doutoramento e esta colaboração acabou por ser muito importante. Tanto que o seu nome está nos meus agradecimentos.
Qual a particularidade do trabalho de Peebles?
Ele combinava a teoria com a componente observacional. E foi dos primeiros a prever em modelos teóricos e depois a determinar em termos experimentais as características da radição cósmica de fundo [um resquício do Big Bang]. Detetou, por exemplo, flutuações na radiação, determinando pequeníssimas variações na sua temperatura, em função da matéria que lhe deu origem no momento do Big Bang. A radiação produzida em zonas mais densas de matéria chega com temperatura mais elevada, a que vem de partes menos densas tem temperatura mais baixa. São diferenças muito, muito pequenas e extremamente difíceis de medir. Mas ele conseguiu fazê-lo.
Também foi distinguido o seu trabalho em matéria escura. Qual foi o contributo?
Conseguiu perceber os efeitos gravitacionais da matéria escura – que hoje sabe-se o que faz, mas continua sem se saber o que é. E ainda coordenou grandes levantamentos astronómicos, feitos com recurso a telescópios dedicados a fotografar todo o céu. Este trabalho deu origem às primeiras previsões para a estrutura do Universo em larga escala.
Na verdade, o prémio acaba por distinguir vários aspetos da sua carreira.
Este é um prémio de vida. Peebles é o mais importante cosmólogo do planeta. Há casos em que o laureado fica prestigiado com a atribuição do prémio. Outros, como Einstein ou Dirac, físicos maiores do que o próprio prémio, em que é a Academia que sai prestigiada. Neste caso, é 50/50.
Ficou contente?
Claro! Muito contente. Mas não tanto como quando há dois anos o prémio foi atribuído às ondas gravitacionais. Aí abri três garrafas de champanhe para comemorar com os meus colegas do CENTRA.