Joana define a experiência como traumatizante e, acima de tudo, das mais caras a que teve de ser sujeita. As primeiras picadas surgiram sem que soubesse do que se tratava, longe de imaginar que estaria perante a praga que se tem manifestado cada vez mais nos últimos tempos. Depois de ter visto o primeiro inseto, decidiu começar a investigar o que poderia ser, até que se apercebeu de que a sua casa, ou pelo menos o seu quarto, tinha sido invadida por percevejos. De imediato contactou uma empresa de desinfestação para dar conta do problema, sem saber que aquele que define como um episódio “horrível” estaria longe do fim.
Ainda hoje Joana (e o nome fictício que nos pediu para lhe dar mostra bem como a presença deste bicho está carregado de estigmas) não consegue entender como a praga chegou a sua casa, no centro de Lisboa, dado que a maior probabilidade de serem transmitidos ocorre durante viagens, e não tinha saído do País recentemente. Nesse caso, é possível que tenham sido transmitidos através da roupa, chapéus ou até mesmo da mala de outra pessoa.
Os percevejos são insetos de forma oval, achatada e de cor acastanhada, que se alimentam exclusivamente de seres humanos ou animais domésticos, e, enquanto parasitas extremamente pequenos, têm facilidade em esconder-se em qualquer local, sendo o mais comum os colchões, estrados das camas e tudo o que possa rodear a área.
Daniel Oliveira, diretor técnico da empresa de desinfestação Rentokil Initial, explica que é visível o aumento exponencial das infestações de percevejos de cama nos últimos quatro anos, nas grandes cidades, e este ano o cenário não foge à regra: há ainda mais casos do que os registados em 2018, essencialmente em Lisboa, Porto, Algarve e Madeira. Se, eventualmente, se pensa que esta praga é característica de estabelecimentos de baixa qualidade ou até que se trata de uma questão de falta de higiene, Daniel Oliveira esclarece que a infestação está antes relacionada com a globalização. “O número de casos está concentrado em cidades com maior população flutuante, e o boom turístico que Portugal tem vindo a presenciar aumenta também a probabilidade de estas pragas entrarem cá.” Consequentemente, é no verão que se ouve falar mais destes insetos, exatamente por haver um maior número de pessoas a viajar, aliado ao facto de ser esta a sua altura reprodutiva.
Há perigo para a saúde?
Joana não perdeu tempo em livrar-se dos percevejos no quarto, mas, ao perceber que também havia sinais do inseto no sofá, acabou por desinfestar a casa toda, para garantir que os insetos não se tinham alastrado. É sempre feita uma inspeção muito minuciosa a todos os locais, mas preferiu não arriscar e abriu a carteira para acabar de vez com a praga (pensava ela).
Para desinfestar os locais, sendo os quartos os mais afetados, o diretor técnico diz que é necessário que sejam desmontados na sua totalidade, bem como todas as peças de roupa lavadas a mais de 60 graus ou a seco, alternativamente, e, por norma, os colchões devem ser deitados para o lixo. Há, no entanto, uma outra técnica que é cada vez mais utilizada, mas embora o tratamento à zona infestada seja praticamente o mesmo, não se recorre a inseticidas próprios, utilizando antes sondas que removem os percevejos e os ovos sem recurso a produtos tóxicos. “Fiquei num hotel por não suportar o cheiro que tinha em casa, era muito forte. Tudo o que pudesse lavar, lavei. E o que não pude, mandei para a lavandaria”, conta Joana, que regressou ao conforto do lar depois de duas ou três noites alojada num hotel. Parecia estar tudo livre de percevejos, mesmo depois da obrigatória vistoria, 15 dias mais tarde – que garante a eficácia da desinfestação –, mas ao fim de um mês as picadas voltaram a aparecer.
As suspeitas de que lhe possam estar associadas doenças, quando o inseto pica diferentes pessoas, acabam por não ser confirmadas pela Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT): “Ao contrário do que por vezes é veiculado, os percevejos não são conhecidos por disseminarem doenças e, como tal, não representam perigo para a saúde pública”, informa. No entanto, não deixa de advertir para as possíveis reações à picada, que variam de pessoa para pessoa. “Pode ir de uma total ausência de sintomas a reações alérgicas e comichão ao nível dérmico, passando pelo aparecimento de pequenas marcas, o mais comum”, esclarece. O tratamento, realça a autoridade de saúde, passa pela administração de cremes com corticosteroides ou anti-histamínicos, que têm como principal objetivo o de aliviar a comichão.
Além de se tratar de um inseto extremamente resistente, que obrigou Joana a mudar de casa ao fim de mais duas desinfestações – a última para prevenir que não a perseguisse para a nova habitação –, é durante a noite que sai para se alimentar, passando os dias escondido. Quando se instala no hospedeiro, liberta um anestésico para que a picada não seja sentida, daí ser tão comum que só se dê conta nos dias seguintes. Chega a libertar também um anticoagulante que origina manchas castanhas – a hemoglobina que não consegue digerir –, comuns quando se está perante uma infestação maior.
A ARSLVT explica que não há nenhum plano específico para controlar estas manifestações, uma vez que não representam qualquer perigo para a saúde pública. No entanto, para quem é sujeito a este tipo de pragas, são deixados alguns conselhos. À Joana pediram para que, depois de qualquer viagem, colocasse a mala sobre um lençol branco e que só aí a abrisse e inspecionasse para garantir que não havia sinal de percevejos. O diretor técnico da Rentokil Initial deixa ainda a indicação de que se lave de imediato todas as peças que estejam lá dentro e que se deixe a bagagem ao sol, para que sejam evitados gastos que podem ser muito elevados. “Se estivermos a falar do tratamento de um quarto, só a desinfestação, sem que se tenha em consideração os gastos adicionais, pode ficar pelos 300 euros. Mas pode ultrapassar os mil euros à vontade, dependendo do número de divisões infestadas, bem como do nível de infestação”, afirma Daniel Oliveira.
Na memória de Joana, ficaram a experiência que ainda hoje a deixa arrepiada e os cerca de três mil euros que gastou para se ver livre, de vez, da praga.
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