Quem já frequentou reuniões de condomínio sabe que, frequentemente, são palcos de discussões prolongadas e de ânimos exaltados. Os três proprietários representados em Imóvel conseguem exorbitar esse quadro. Solitários e desequilibrados, dão corpo a uma geração “urbana, individualista e letárgica”, próxima dos 40 anos. Nesta espécie de arena onde todos se digladiam, há um nevoeiro metafórico que se instala e os aprisiona num registo com qualquer coisa de onírico.
O ponto de encontro é o Teatro Carlos Alberto, sendo o público (50 espectadores, no máximo) encaminhado depois para um edifício na Rua Mártires da Liberdade. No piso térreo, reconstitui-se a sala de reuniões de um condomínio a braços com infiltrações de água no telhado. A discussão imagina-se longa e, como a fome pode apertar, a escolha da pizza a encomendar sobrepõe-se à ordem de trabalhos, mas também aí o consenso é difícil. “Estão aquém de uma solução; há uma espécie de imobilidade promovida pela linguagem”, sublinha Regina Guimarães, a autora do texto. O único parêntesis de normalidade surge quando entra em cena o entregador de pizzas, o indivíduo mais profundamente resolvido e feliz, a lançar luz sobre o que agita aqueles vizinhos. “As personagens refletem as promessas e as aspirações da nossa geração; não nos agradava estar sempre a apontar o dedo aos outros”, refere Hugo Cruz, responsável pela conceção e pela encenação desta coprodução da Nómada com o Teatro Nacional São João. Um processo criativo coletivo e relacionado, afinal, com as preocupações, urgências e contradições apontadas pelo espetáculo. “Não queríamos cair num modelo vertical, pouco participativo, com funções estanques”, explica o encenador, promovendo uma discussão mais transparente e verdadeira.
Teatro Carlos Alberto > R. das Oliveiras, 43, Porto > T. 22 340 1910 > 20-23 set, qui-sex 21h, sáb 19h, dom 16h > €10