O filipino Brillante Mendoza tem vindo a construir uma filmografia sempre inquietante e surpreendente, afastada dos grandes núcleos de produção e de reflexão sobre o cinema (da América, da Europa e mesmo da Ásia). Soube fazer da periferia geográfica uma mais valia universal, sem nunca cair no lado exótico ou estereotipado, conseguindo que as suas histórias locais ganhassem aquele poder transmutativo, que as tornam em grande obras globais. Mãe Rosa, a sua mais recente longa de ficção, é disso exemplo. De uma só assentada, Brillante aborda dois dos principais problemas que assolam a sociedade filipina: o tráfico de droga e a corrupção. Mas o filme acaba também por falar da família como alicerce, num conceito estreito e alargado, bem como da hierarquia de valores perante o desespero.
Com o uso da câmara ao ombro, a imagem tosca, Mendoza explora um certo naturalismo documental, que faz com que nos sintamos mais próximo das personagens, como se o filme não fosse apenas um ficção, mas um pedaço de realidade devidamente editado. Os próprios diálogos foram sendo construídos pelos atores à medida que iam encarnado aquelas personagens, semelhantes a outras dos bairros pobres de Manila.
Ao realizador interessa sobretudo esse lado humano, desconcertando as expectativas. O traficante de droga não é propriamente um gangster mal encarado que não conhece outra linguagem senão a da violência. Antes pelo contrário, é uma pacata mãe de família que faz pela vida, carinhosamente tratada no bairro por Mãe Rosa, porque é mãe de três filhos e, aparentemente, é mãe emprestada de outras crianças do bairro. Ela vende metanfetamina, uma droga conhecida por cristais, na sua roulotte de merceeiro.
Um dia é atraiçoada, denunciada e detida. Só que a polícia filipina está pouco interessada em avançar com o processo legal. A única coisa que interessa ao gangue policial é extorquir o máximo de dinheiro a Mãe Rosa e a outros pequenos ou médios traficantes que ela denuncie. Há assim uma total aniquilação do estado de direito segundo os nossos cânones. A sociedade é amoral. Todos são fora da lei. Aqueles que deviam defender os cidadãos funcionam como a mais poderosa e organizada quadrilha.
Mãe Rosa > De Brillante Mendoza , com Jaclyn Jose, Julio Diaz, Felix Roco, Jomari Angeles, Andi Eigenmann > 110 minutos