Impressionamo-nos ao ver Alain Passard, inspirado pela elegância de um bailado, transformar metade de uma galinha e metade de um pato num só animal. E comovemo-nos de verdade ao perceber que uma tarte de maçã pode dar um bonito bouquet de rosas. Filho de um músico e de uma costureira, neto de uma cozinheira e de um escultor, Passard cedo percebeu que também seria com as mãos que ia trabalhar. “Aos 14 anos escolhi ser cozinheiro e não mudei de ideias”, confessa, no primeiro episódio de Chef’s Table: France, a estreia da série de documentários originais da Netflix pelas cozinhas francesas.
A vida deste Bretão passa pela Rue de Varenne, em Paris. Ali trabalhou, no L’Archestrate, com o chefe Alain Senderens, que lhe disse que aquele sítio haveria de ser seu e também ele teria três Estrelas Michelin. A profecia cumpriu-se em 1986, quando Passard comprou o restaurante onde aprendeu a cozinhar. Há 20 anos que o Arpège (19º melhor do mundo, segundo a revista britânica Restaurant) tem o trio de Estrelas, embora já tenha estado à beira de o perder. Num período de rutura, em 1998, deixou de servir carne vermelha, o que para os clientes foi um choque – Passard pôs os seus conhecimentos do fogo ao serviço dos legumes e frutas e assim nasceram pratos como tornedó de repolho com malaguetas ou beringela e pera fumadas.
Depois de ver este documentário, filmado como se de cinema se tratasse, nunca mais se comem beterrabas, abóboras, flores de courgete, tomates ou cenouras da mesma maneira. Os outros três episódios vão ao encontro de Adeline Grattard (yam’Tcha), Alexandre Couillon (La Marine) e Michel Troisgros (Maison Troisgros). Para contar a história da gastronomia mundial, ficam a faltar os chefes espanhóis e, dada a proximidade geográfica, quem sabe se não incluem também os portugueses e fazem uma série dedicada à Península Ibérica.