Estamos a viver uma era de ouro de contratenores? Andreas Scholl, Carlos Mena, David Daniels e Max Cencic são alguns dos nomes que se podem invocar para justificar tal afirmação. Não menos destacado é o de Philippe Jaroussky, cantor francês cujo aspeto jovem desmente os seus quase 40 anos de idade. Com voz “ligeira e flexível”, na descrição apta de um crítico, é um veterano com ampla experiência em ópera e música religiosa do Barroco. Os seus dois álbuns anteriores foram dedicados a Monteverdi e a cantatas de Bach e Telemann. Agora sai este álbum de Händel (1685-1759), contemporâneo de Bach e ainda hoje o mais popular compositor de ópera barroca. Händel é um excelente exemplo de cosmopolitismo artístico. Nascido na Prússia, assimilou a profundidade do contraponto alemão antes de passar alguns anos em Itália, onde escreveu cantatas e ópera na língua local. Depois mudou-se para Londres, onde ficou até ao fim da vida. Ao longo de três décadas, até se virar para o oratório inglês (género que, essencialmente, criou), produziu dezenas de óperas italianas. Algumas (Rinaldo, Giulio Cesare, Serse) permanecem centrais no reportório; outras menos, ou não de todo.
O autoplágio era típico da época, e Händel não foge à regra. A ária que abre este álbum, por exemplo, proveniente da ópera Imeneo, já tinha sido usada num oratório. Se aí era um harpista que procurava acalmar a fúria de um rei bíblico, aqui é um jovem ateniense a lamentar o destino trágico da sua amada. A calma, o ritmo ondulante, a beleza melódica e harmónica, as texturas delicadas, essas são as mesmas, demonstrando como é arbitrário tentar reduzir peças musicais a um (único) programa ou cena. Imeneo utiliza um tema mitológico, como outras óperas presentes neste CD. São onze no total, geralmente com títulos pouco familiares. Desde a suavidade melancólica de Se Potessero i Sospir’ Miei até às acrobacias vocais de Rompo i Lacci ou Agitato da Fiere Tempeste, é todo um programa de humanidade, esplendor e versatilidade que Jaroussky apresenta.