No Porto, “cruzes canhoto” deixou de ser apenas uma expressão popular para exprimir rejeição e tornou-se nome de galeria na Rua Miguel Bombarda. Sendo este um quarteirão marcado pela respiração das artes, haverá ainda lugar para novos projetos? Sem dúvida, pois José Carlos Soares, Nuno Marques e Joana Soares – o coletivo Cruzes Canhoto – tem outros argumentos, marginais à atual oferta na rua. Depois do UpArt, site de venda online “de objetos raros, de culto e de coleção”, e da loja Mundimundo, em Vila do Conde, era o momento para fazer chegar ao Porto a arte bruta, primitiva e popular (e, muito em breve, a Barcelona). “O propósito é desvendar esse universo fantástico, de forma apaixonada, indiferente às questões de artes maiores ou menores”, sublinham. Para cumprir essa premissa, o coletivo avança com a organização de mostras de cada área em simultâneo.
À entrada da Cruzes Canhoto, por estes dias, exibem-se peças de arte popular, criadas por autodidatas. Trata-se de um conjunto de obras ligadas ao imaginário popular, de confronto permanente entre sagrado e profano de artistas como Júlia Ramalho, Júlia Côta e António Ramalho. Ao lado, encontram-se criações de “loucos, inadaptados, visionários e alienados, em geral”, ou seja, peças de arte bruta, como lhes chamou Jean Dubuffet, de que é exemplo o Adão e Eva, de Joaquim Paiva. “É uma arte que vem das entranhas, que equilibra quem vive à margem”, observa José Carlos Soares. Do universo de magia, mito e fantasia da galeria faz ainda parte a arte primitiva, com peças de expressão artística genuínas, usadas por tribos em rituais religiosos, de magia e vodu, dos povos Ewe (estatuetas) e Songye (máscaras).
À coleção mais ou menos permanente, uma vez que grande parte das peças está à venda, junta-se a exposição temporária na sala negra. Em O Senhor Cerqueira & The Artbreakers, uma parceria entre a galeria e a Cooperativa para a Educação e Reabilitação de Cidadãos Inadaptados de Cascais (Cercica), está reunida uma seleção de pinturas realizadas em ambiente de ateliê. Cada uma exibe uma linha singular de expressão plástica a ligar outros mundos. Além da aventura de desvendar este universo à margem, em breve, o coletivo também vai editar textos e produzir audiovisuais.
Cruzes Canhoto > R. Miguel Bombarda, 452, Porto > T. 22 319 7406 > seg-dom 10h-19h