Abrimos este texto como abrimos a refeição, a fazer tchim-tchim com um copo de espumante Quinta do Boição, Arinto 2010, da região de Lisboa – “o melhor do País”, na opinião, nada leiga, do carismático sommelier Nuno Pires. Não podemos atestar se é o melhor do País, mas podemos assegurar que foi perfeito para início de conversa. A mudança de chefe e, como consequência natural, um novo menu deu-nos alento para os 300 quilómetros que separam a redação do elegante Vistas, um dos restaurantes do Monte Rei, resort direcionado para o golfe e frequentado por uma certa elite internacional.
No verão soubemos que o chefe Albano Lourenço regressara ao Centro do País e que Rui Silvestre iria substituí-lo, depois de uma fugaz passagem por Lisboa. Recorde-se que este profissional conseguiu, em 2015, uma Estrela Michelin para o Bon Bon, no Carvoeiro, de onde saiu no início deste ano para abrir um restaurante na capital. Quando aceitou largar tudo para chefiar a cozinha do Vistas, e voltar ao Algarve, aceitou também o desafio assumido de estrear este restaurante no universo das estrelas. Enquanto o reconhecimento vem e não vem, aproveitemos para degustar as maravilhas que o chefe tem andado a preparar por aqui.
Por enquanto, o Vistas tem dois menus de degustação, um mais curto e outro mais extenso, que pode chegar aos 10 momentos. Para breve, anunciou Rui Silvestre, passará a haver um Passeio Marítimo que, como o nome deixa adivinhar, se baseará apenas em produtos do mar.
Ainda estávamos a brindar com o tal “melhor espumante do País” e já o amuse bouche brilhava, culpa de uma sopa de água do mar que apetece sorver sem vergonhas. Calma, sabemo-nos comportar e ouvir as explicações antes de comer seja o que for – e assim ficamos a saber que neste caldo há percebes, amêijoas, navalhas e uma esferificação de coentros. Entretanto, trouxeram-nos também um taco de gamba violeta com puré de abacate ligeiramente picante e um cromesqui (não googlem: em traços largos, trata-se de um croquete) de berbigão com salsa e lima – é por aqui que devemos começar, avisam. Cumprimos, mas destapamos o recipiente onde estavam estes snacks e percebemos que há mais qualquer coisa para desvendar. Por entre pedras e algas, e fumo frio que sai assim que tiramos a tampa, apresentam-nos uma bola de sashimi de peixe-galo e sapateira. Tudo perfeito ou não fôssemos fãs da maresia à mesa.
Continuamos no Tejo, tragando um Ninfa branco, com toques de salinidade. Pensámos que Nuno Brito estava a ser preciosista ao falar de sal, mas quando provamos o carpaccio de ostra com atum e caviar, em molho de ostras, couve-flor, alface do mar desidratada e maçã Granny Smith embebida em sumo de beterraba, percebemos do que se tratava. Esta entrada, de diferentes texturas e sabores que se conjugam como uma orquestra, saboreada com este vinho, traz-nos o mar para dentro da boca – ele que está a uma dezena de quilómetros. Ainda faltam os pratos de peixe e de carne, mas ficávamos já por aqui, com esta sensação de frescura algarvia gravada na memória degustativa. É um salmonete com lagostim, pronto a ser mergulhado num molho harissa tunisino, que nos retira deste torpor feliz. Também encontramos um ravioli de lula, e diz que é uma explosão de sabores começar por ele. Ups!, a sofreguidão não nos deixou cumprir com os requisitos que também mandam terminar com o salmonete.
Quando chega o último prato, já o nosso estômago pede ajuda para digerir o que aí vem. Mais um esforço e prova-se esta reinterpretação da carne de porco à alentejana. Está tudo aqui, mas o que sobressai são as batatas sauté, superfinas e cheias de ar. Pedimos desculpa por não conseguirmos discorrer sobre a sobremesa, mas estamos sujeitos à tirania do caractere e preferimos dar destaque à oferta salgada. Os gulosos que nos perdoem.
Estão previstas algumas mudanças no Vistas. “Vamos readaptar a estrutura, criando uma cozinha exclusiva para este restaurante. Como fazemos tudo aqui – à exceção do pão –, precisamos de melhores condições. Também teremos uma nova garrafeira, com uma mesa no meio para jantares privados. Além disso, irá existir um bar para se tomar um copo antes do jantar, por exemplo”, revela Rui Silvestre.
Vistas > Monte Rei Golf & Country Club > Sesmarias, Vila Nova de Cacela > T. 281 950 950 > ter-sáb 19h30-22h (até final nov) > menu degustação desde €83 (pairing €50)