O tweet é de 30 de maio e, desde então, a polémica tem engrossado mais do que a própria sopa de beterraba. “Um clássico intemporal, #Borsch é um dos mais famosos e amados #pratos da Rússia & um símbolo de cozinha tradicional. Há uma teoria segundo a qual o nome ‘borsch’ é proveniente da palavra russa borschevik, [uma planta] que na Rússia antiga era usada para fazer sopas. #Deliciosa”, lê-se na conta oficial do Ministério dos Negócios Estrangeiros da Federação Russa (@Russia). E, debaixo destas linhas, ainda há um vídeo que ensina a fazer a “borsch russa”.
A tweetosfera ucraniana reagiu imediatamente, com cólera e humor, fazendo comentários do género: “Como se roubar a Crimeia não fosse suficiente, também tinham de nos roubar a borsch?”
À distância de quatro mil quilómetros, esta pode parecer uma reação exagerada, mas basta pensar no atual contexto para perceber que um tweet daquele teor tinha de incomodar os ucranianos. Não podemos esquecer a anexação da Crimeia por parte da Federação Russa e o conflito territorial por causa do Leste da Ucrânia, desde 2014.
Nesta conjuntura, dizer que a sopa de beterraba é russa não passa, por isso, de “mais uma tentativa de apropriação cultural por parte de Moscovo”, acredita Alex Kokcharov, um analista de risco político e económico de descendência bielorrussa que mora em Londres, entrevistado pela BBC.
Carne, couve branca, batatas, beterraba, polpa de tomate, cenoura, pastinaga, cebola, bacon, manteiga, vinagre e alho, e guarnição de nata azeda e salsa picada. Não é por acaso que a receita ucraniana continua a ser a versão mais conhecida da sopa de beterraba no resto do mundo – faz parte da cozinha da Ucrânia há vários séculos. Mas acrescente-se que ela foi entretanto adotada e adaptada pelos russos, que hoje também a veem como sua.
A borsch terá entrado na União Soviética no tempo de Estaline, numa ação concertada pelo Kremlin. Foi Anastas Mikoyan, então comissário do povo com o pelouro da comida, que ficou com a tarefa de definir uma cozinha nacional soviética que satisfizesse toda a população da URSS.
O que poucos sabem é que Mikoyan, com o objetivo de estudar a produção de comida em massa, viajou até aos Estados Unidos, onde se apaixonou por hambúrgueres, cachorros-quentes e gelado. No regresso, lançou gelados produzidos em fábricas, tornou populares pratos fáceis de cozinhar como as kotleti, uma espécie de almôndegas de carne, e publicou um livro de receitas propagandístico, o Livro da Comida Saborosa e Saudável.
Estávamos em 1939 e no seu capítulo 6, o das sopas, lá aparece uma primeira Borsch, a Borsch de Verão (com abóbora, aipo e rama de beterraba) e a Borsch Ucraniana. A versão russa é a mais simples: apenas leva carne, beterraba, couve branca, cenoura, batatas, cebola, polpa de tomate, alho, vinagre e açúcar. Um ponto a seu favor?