Não interessa quantos anos se tem: a morte de um membro da família pode trazer uma série de emoções difíceis de gerir: choque, tristeza profunda, confusão, ansiedade e raiva – só para citar alguns.
Para uma criança, ter de lidar com a perda de uma figura importante, como é o caso de um pai, esses sentimentos intensos podem ser particularmente dificeis de processar. As crianças precisam dos pais para um desenvolvimento saudável, são os primeiros cuidadores, além de outros adultos confiáveis, que os ajudam a navegar pelas águas obscuras da tristeza. Ora, quando a razão dessa tristeza é o desaparecimento de um deles, tudo se complica.
Antes de tudo, como falar sobre morte, sim, morte, essa palavra de que tanto fugimos, apesar de sobre ela se dizer que é a única certeza que temos na vida. A morte é um assunto desafiador para discutir com alguém, sobretudo com uma criança. Mas adocicar o assunto ou evitar abordá-lo, como forma de proteger um filho, pode acabar por fazer mais mossa do que imaginamos.
Por melhor que seja a intenção, evite usar eufemismos para explicar a morte. Até podemos pensar que dizer “Perdemos a nossa mãe” ou “O pai agora vai ficar a dormir” vai suavizar o golpe, mas essa abordagem pode acabar por revelar-se confusa para a criança, que tende a levar o que lhe dizemos à letra.
“Uma adolescente chegou a contar-me que, depois de uma morte importante na família, tinha medo de se deitar porque uma parte dela temia não voltar a acordar”, conta Kate Zera Kray, assistente social e psicoterapeuta especializada em luto ao Huffington Post.
Em vez disso, procure usar uma linguagem simples e direta. Não tenha medo de usar palavras como “morte” e “morto”, mesmo que pareçam duras. Com as crianças mais novas, pode optar por algo como “o coração do pai/mãe deixou de bater” e enfatizar que precisamos que os nossos corações funcionem para permanecermos vivos, acrescenta Judy Schiffman, assistente social clínica licenciada e diretora do Barr-Harris Children’s, um centro de luto.
Depois, seja honesto sobre a natureza da morte – tenha apenas em conta a idade da criança. Ou seja, dar demasiados detalhes pode ser difícil de gerir, daí que deve dar explicações verdadeiras, mas breves.
“Esconder a verdade pode gerar desconfiança mais tarde, quando os mais novos aprendem mais sobre a morte”, acrescenta ainda Ellen Roese, assistente social especializada em luto.
Note-se que as crianças mais novas, aquelas com idades entre os 3 e os 5 anos, podem ter alguma dificuldade em compreender o estado permanente da morte. “Dizer-lhes apenas que o pai foi embora pode levá-los a esperar por eles à janela, mais tarde”, nota ainda Schiffman.
Por volta dessa idade, os mais novos desenvolvem ainda aquilo que chamamos de “pensamento mágico”, levando-os a acreditar que são responsáveis por aquela morte, por causa de algo que disseram, pensaram ou fizeram – e que o parente desaparecido pode voltar à vida. “É muito importante tranquilizá-los de que não foram eles que causaram aquela morte e que não é uma forma de punição”, sublinha Roese.
Permita também que lhe façam perguntas, se houver dúvidas sobre o que realmente aconteceu. Assim garante que a morte não se torna um assunto tabu na sua casa. E aquilo que o seu filho pergunta dá-lhe sempre uma ideia da forma como está a lidar com o assunto.
“Os adultos presumem muitas vezes que sabem o que os filhos estão a pensar e às vezes acabam por ser surpreendidos”, acrescentou aquela especialista.
O que precisa (mesmo!) saber
Orientar um filho a ultrapassar um momento assim pode ser mais difícil do que possa parecer. Saiba como estar melhor preparado para lidar com os desafios que surgem no seu caminho
Permita que seus filhos participem do funeral, se quiserem
Nunca se deve forçar uma criança a ir ao velório, funeral ou enterro de um dos pais. Dito isto, se eles querem ir, deixe-os, considera a assistente social e diretora de um centro de luto Judy Schiffman. Dar ao seu filho essa opção, se ele quiser, pode ser muito valioso para todo o processo. Mas certifique-se que eles estão preparados para o que podem ver ou ouvir se decidirem participar, como uma visão de caixão aberto, por exemplo. Pode ainda providenciar para que uma pessoa com quem se sinta à vontade os acompanhe à cerimónia – dado que pode estar demasiado ocupado para lhes dar a atenção de que precisam. E se a criança disser que se quer ir embora, ou fazer uma pausa a qualquer momento, permita que ela faça isso. Além disso espere perguntas como “como é que o pai está aqui se foi para o céu?”.
Saiba que as crianças sofrem de maneira diferente dos adultos
Portanto, tente não tirar conclusões precipitadas sobre o que o seu filho está ou não a sentir. Os momentos de fúria, por exemplo, alternados com brincadeira são perfeitamente normais para as crianças, mesmo que isso pareça estranho aos pais. “As crianças têm uma tolerância limitada à dor”, disse Roese. “Eles vão fazer pausas e vão rir e brincar. Os adultos geralmente não fazem isso e, muitas vezes, não o aceitam nas crianças. “Além disso, o luto é um processo muito individual: crianças da mesma família podem ser afetadas pela morte de maneiras diferentes”.
Faça perguntas abertas sobre como eles se sentem…
…e realmente ouça as suas respostas. Por exemplo, “Como foi voltar à escola depois do funeral?” ou “O que achaste daquele comentário do teu amigo de agora já não teres pai?”. E se a criança lhe responder que não quer falar sobre isso, tente também entendê-la. “Trata-se de respeitar limites”, insiste a outra assistente social Kate Kray. “Estar atento, mas não forçar situações.”
É normal que o seu filho o veja triste às vezes
Não se sinta pressionado a disfarçar seus sentimentos e “ser forte” para seus filhos o tempo todo. “Não, não esconda as suas lágrimas. Chorar é perfeitamente normal e saudável até numa situação destas”, reforça a assistente Ellen Roese.
Tente o mais possível manter a rotina do seu filho
“Saber o que vão fazer dá segurança aos mais novos durante qualquer período das suas vidas que possa ser assustador. E após a morte de um pai ou mãe é um desses momentos”. Isso significa também manter as regras lá de casa. “A previsibilidade das consequências ajudará a criança a se sentir segura”, acrescentou Roese. Além disso, e antes do regresso à escola, assegure-se de que professores, auxiliares e responsáveis da escola sabem o que aconteceu. “Assim, podem dar o apoio de que possa precisar.”
E se ele ficar mais dependente de si?
Deixe. É perfeitamente normal que uma criança que perdeu um pai/mãe desenvolva um medo intenso de perder o outro. Isso pode traduzir-se numa preocupação com a saúde e a segurança do pai vivo. “Podem até querer dormir na cama a seu lado.” O que deve fazer é reforçar que está bem de saúde e ele não tem com que se preocupar.
E ainda: não se esqueça de se cuidar
Ou seja, pode estar tão focado nos seus filhos que às tantas está a negligenciar a sua própria dor. Daí que a recomendação final é “mime-se” – seja fazer exercício físico, terapia ou aderir a um grupo de apoio ao luto. É mais uma ferramenta para o ajudar a lidar com a perda.