No Brasil, país que já teve uma presidenta – Dilma Roussef – não houve dúvidas: a nova protagonista da Marvel chama-se Capitã Marvel e ninguém questionou. Mas por cá, onde Lurdes Pintassilgo foi a primeira mulher a ocupar o cargo de “primeiro-ministro” e Assunção Esteves foi a primeira “presidente” da Assembleia da República, a nova heroína da Marvel também nos é apresentada como “Capitão”. Confuso?
O filme de que falamos é o primeiro da Marvel com uma protagonista feminina, estreou-se em todo o mundo esta semana e arrisca-se a ser o primeiro “blockbuster” do ano. Capitão Marvel, dos estúdios Disney e da Marvel Studios, é protagonizado por Brie Larson – atriz de 29 anos que já ganhou um Oscar – e espera-se que bata os 103 milhões do êxito que foi Mulher-Maravilha, lançado pela concorrente DC há dois anos. Muito ao género de 2019, Capitão Marvel é, não só mulher, como uma mulher feminista.
Essa foi a primeira questão do filme a fazer correr alguma tinta. Antes de mais porque, em dez anos, a companhia não precisou propriamente de protagonistas femininas – e isso já fez com que fosse acusada de estar a ser politicamente correta. “Por que razão o Capitão Marvel é uma rapariga?”, perguntava um fã na página Marvel Fans Only, no Facebook, insinuando que a opção pretendia atrair uma audiência que se sabe ser sobretudo masculina. A resposta veio de imediato do site feminista Fembot: “A nova personagem é feminina porque a companhia tem um enorme manancial de personagens femininas e já não tem medo de lançar um filme com uma protagonista mulher”.
Trata-se de Carol Danvers, personagem que apareceu pela primeira vez numa história publicada em 1968 – e que se torna das mais poderosas do universo quando a Terra é capturada no meio de uma guerra galáctica. Elemento da Força Aérea americana, a sua vida muda quando se cruza com Kree Mar-Vell, que assumiu a identidade do recém-falecido Dr.Walter Lawson ao chegar à Terra, para se certificar se o planeta representava alguma ameaça ao império Kree, de onde vinha. No final dos anos 1970, Danvers volta a dar sinal de vida, porém já como Miss Marvel, personagem criada à medida dos tempos: a companhia decidira que precisava de uma personagem feminina para entrar nas discussões dos movimentos de libertação das mulheres.
Mas, depois, a mesma Carol Danvers ainda foi editora-chefe da revista feminina Daily’s Bugle e mais uma série de outras coisas, tornando-se assim uma espécie de Barbie da Marvel, pelo facto de ter tido mais de 20 trabalhos, roupas e penteados diferentes. É verdade que os anos 1980 não foram muito simpáticos com ela e talvez por isso se tenha ido agora recuperar esse seu lado de ex-piloto da Força Aérea americana. E é aí que está o busílis da – outra – questão: ser ou não ser capitã.
“Há nomes uniformes na Língua Portuguesa que são definidos pelo artigo, como é o caso de presidente. Mas do ponto de vista linguístico, a forma capitã é legitima. Pode é haver fatores extralinguísticos a explicar esta decisão dos distribuidores”, avança Sandra Duarte Tavares, mestre em Língua Portuguesa pela Faculdade de Letras de Lisboa e responsável sobre o tema linguística portuguesa na Bolsa de Especialistas VISÃO.
E assim é: segundo explica Sílvia Gomes, da comunicação da Marvel, a razão para esta Captain Marvel, nome original do filme, ter sido traduzida para Capitão Marvel tem a ver com a designação oficial da patente: “O que está registado oficialmente para esse cargo é capitão. E como Carol Denvers é uma ex-piloto da Força Aérea…” Do gabinete de Relações Públicas da FAP confirmam: “Não existe capitã nem aqui nem em nenhum ramo das Forças Armadas.”