A caravela que serve de símbolo a Lisboa, o éme de Metro de Barcelona, os monumentos da berlinense Alexander Platz. Ou ainda um pedaço do florão que encontramos a cada passo nas ruas de Budapeste, a interseção de carris de elétrico no Porto, a estrelinha de Atenas.
Podemos escrever que tudo serve de inspiração a Emma France Raff – ou melhor, que muito lhe apetece “roubar” do chão de algumas cidades, com a ajuda de tinta (sempre orgânica), um rolo e t-shirts ou sacos de pano (100% algodão). E que o resultado é invariavelmente belo e serve de recordação para levar para casa.
“Nós não fazemos nada, só copiamos o que já existe”, nota a artista alemã, que criou o coletivo de arte Raubdruckerin (já são meia dúzia de artistas, além dela), numa lógica de guerrilha urbana, e hoje aproveita todas as viagens que faz para imprimir mais uns quantos artigos.
Raubdruckerin significa qualquer coisa como “impressora pirata” e tinha de ser feminino “porque tinha de ser feminino”, simplifica Emma, cansada de ver tantas palavras masculinas no léxico alemão. Mas são piratas bonzinhos, que trabalham à luz do dia e chamam a atenção de quem passa, como numa performance.
O primeiro passo é limpar a tampa ou objeto a carimbar; depois, cobre-se com tinta orgânica e sobrepõem-se as peças; no final, deixa-se tudo novamente limpo, sem qualquer rasto de tinta. No final, só falta levantarem o rolo bem alto em sinal de triunfo.
Este processo já aconteceu dezenas de vezes em Berlim, onde o coletivo está sediado, mas também em Lisboa, Porto, Madrid, Oslo, Amesterdão, Bruxelas, Viena, Budapeste, Paris, Atenas, Barcelona, Stavanger e Atenas. No futuro, que espera próximo, Emma quer “roubar” motivos das ruas de Roma, Londres e Moscovo. Ainda sem data, mas na calha, está também o Japão – e basta espreitar estas imagens para perceber porquê.
A estreia foi em Sines
2006. Emma tinha 24 anos e acabara de se licenciar em Design Têxtil na Modatex, no Porto, quando usou pela primeira vez a tampa de um bueiro como carimbo. A tampa era igual a tantas outras que surgem aqui e ali nas estradas alentejanas; neste caso, pertencia aos esgotos de Sines e pareceu-lhe graficamente interessante para ser estampada em t-shirts.
Ou pareceu-lhes, melhor dizendo, porque tudo aconteceu a meias com o pai, o pintor alemão Johannes Kohlrusch. Foi com ele que Emma criou a marca Estampatampa, apresentada pela primeira vez no Festival de Músicas do Mundo, em Sines.
O pai ainda hoje mora no concelho de Odemira, onde tem um ateliê e dá cursos de pintura. Emma mudou-se para Berlim em 2009, e dois anos depois regressou à estampagem. Produziu sempre pequenas edições, a não ser dos artigos fabricados na capital alemã, que vende no seu ateliê (na Boddinstrasse, 9, aberto ao público todas as quintas e sextas, entre as 4 e as 7 da tarde) e na loja online do coletivo.
É lá que encontramos t-shirts desde 49 euros, sacos de pano desde 20 euros e sweatshirts desde 79 euros – ou apenas os namoramos porque a maioria dos artigos está esgotada (por estes dias só existem motivos de Berlim e Atenas). E será sempre assim porque os Raubdruckerin são contra a produção em massa.
A “estampagem de guerrilha” é o trabalho mais público de Emma France Raff, mas passa a melhor parte dos seus dias a trabalhar para a Nelly Rodi, uma agência de tendências, e a empresa portuguesa Adalberto Estampados, líder europeia na estampagem de tecidos. Também cria chapéus e acessórios, sempre recorrendo a técnicas manuais e de olho na reciclagem.